Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

sábado, 21 de outubro de 2017

A HISTÓRIA DO IMPÉRIO PERSA (IRÃ) - Parte 2

III – ANTIGUIDADE CLÁSSICA


III.1 – IMPÉRIOS MEDO E AQUEMÊNIDA (650-330 AC)

Os medos fixaram-se no norte do Planalto Iraniano, em Ecbátana (atual Hamadã, a 400 km a sudoeste de Teerã), e os persas, até então nômades, estabeleceram-se ao sul, em Parsa (atual província iraniana de Fars), na cidade de Anshan, onde Teispes (que reinou entre cerca de 675-640 AC), filho de Aquêmenes (semi-lendário, com reinado entre 700-675 AC), teria fundado um novo reino, intitulando-se “rei da cidade de Anshan”, primeiro passo do Império Aquemênida. Sucederam a Teispes, Ciro I e Cambises I. Este último casou-se com a neta do líder medo Ciáxares e foi pai de Ciro II, conhecido como o Grande. O reino de Anshan, tributário dos medos, continuou a usar o elamita como idioma oficial por algum tempo, embora a dinastia governante falasse persa, uma língua indo-européia. A posterior expansão do reino da cidade de Anshan resultaria na criação do Império Persa.
Império Neo-Assírio e suas expansões
Em 646 AC, o rei assírio Assurbanipal saqueou Susa (essa e as cidades que seguem podem ser vistas no mapa do Império Neo-Assírio), acabando com a supremacia elamita na região. Por mais de 150 anos os reis assírios do norte da Mesopotâmia estavam procurando conquistar as tribos medas do Irã ocidental, com tal pressão apenas causando a união dos pequenos reinos dessa região em estados cada vez maiores e mais centralizados. Na segunda metade do século VII AC, os medos ganharam sua independência e foram unidos por Deioces.
Império Meda (Região da Média), 678 a 549 AC
Durante anos dominadas pelos citas e pelos assírios, as tribos medas, unificadas por Ciáxares (neto de Deioces) e apoiados por Nabopolassar, rei da Babilônia, invadiram a Assíria e conquistaram Nínive, capital da Assíria, destruindo-a em 612 AC, levando à queda do Império Neo-Assírio. Urartu foi também, posteriormente, conquistado e dissolvido pelos medos. Após a derrota definitiva dos assírios em 610 AC, os medos ocuparam território no que é hoje o Irã, bem como na Ásia Menor, na Anatólia e na Lídia.
Ciro II, o Grande, rei da Pérsia,
da dinastia Aquemênida
Aos medos é creditada a fundação do Irã como nação e império, bem como o estabelecimento do primeiro Império Iraniano, o maior de seu tempo, até que Ciro II, o Grande, de origem persa, em 550 AC derrotou os medos e tomou o trono, estabelecendo um império unificado dos Medos e Persas, que conduziu ao Império Aquemênida (550 a 330 AC), ou Primeiro Império Persa, com sua capital em Pasárgada. Na verdade, medos e persas pertenciam à mesma raça iraniana e suas línguas eram quase idênticas, de forma que a ascensão de Ciro pode ser vista como uma revolução interna que não afetou o Império. Senhor dos territórios anteriormente sujeitos ao Império Medo, Ciro II tomou a antiga capital elamita de Susa, para onde foi transferida a capital persa. Em seguida, os persas conquistam a Lídia (contra quem os medos lutavam há décadas), a Jônia, a Cária, a Lícia e a Babilônia, após derrotar o Rei Nabonido em 538 AC. Sucedendo seu pai Ciro II, Cambises II conquistou, em vinte anos, por meio de força militar e de uma política liberal para com os povos submetidos, um Império que se estendia do Mediterrâneo ao Indo e que incluía o Egito (causando o colapso da 26ª Dinastia do Egito), muito maior que o da Assíria. Cambises II adoeceu e morreu antes ou quando deixava o Egito e conforme relata Heródoto, ele foi abatido por sua forte irreverência contra as deidades egípcias.
Cambises II, o rei persa liberal
Durante o período aquemênida, o Zoroastrismo, fundado por Zoroastro (Zaratustra), tornou-se a religião dos governantes e da maior parte dos povos da Pérsia. O Zoroastrismo enfatizava uma luta dualista entre o bem e o mal, e uma batalha final vindoura. O zoroastrismo e seus líderes místicos, os magi (singular mago), viriam a ser um elemento definidor da cultura persa.
Dario I, o rei persa do auge do
Império Aquemênida
Dario I reivindicou a sucessão por uma linha colateral do Império Aquemênida. A primeira capital de Dario I foi em Susa e seu programa de construção foi iniciado em Persépolis. Ele reconstruiu um canal entre o rio Nilo e o Mar Vermelho, um precursor do moderno Canal de Suez. Melhorou o extenso sistema de estradas e durante o seu reinado foi pela primeira vez mencionada a Estrada Real, uma grande estrada para ligar o seu extenso império, estendendo-se de Susa a Sardes (Turquia, às margens do Mediterrâneo), com estações de correio a intervalos regulares. As estradas também se destinavam ao comércio do Egito e da Europa com a Índia e a China, do qual a Pérsia se beneficiou grandemente. A cunhagem, na forma do Daric (moeda de ouro) e o Shekel (moeda de prata) foi padronizada, já que a cunhagem havia sido inventada mais de um século antes, na Lídia; a eficiência administrativa foi aumentada. Sob Dario I, o Império Persa Aquemênida acabou por tornar-se o maior e mais poderoso Estado que o mundo havia visto até então, quando reinou e administrou a maior parte do mundo então conhecido, além de estender-se pelos três continentes, Europa, Ásia e África. Dario dividiu o reino em cerca de vinte satrapias (províncias), supervisionadas por governadores (sátrapas). Também instituiu um sistema tributário para cobrar impostos de cada província, ampliou o sistema postal dos assírios e adotou o uso de agentes secretos (conhecidos como os Olhos e Ouvidos do Rei). A antiga língua persa aparece em inscrições reais, numa versão especialmente adaptada da escrita cuneiforme[1]. Sua maior realização foi o próprio império, que representou a primeira superpotência mundial baseada num modelo de tolerância e respeito por outras culturas e religiões. 
Império Persa cerca de 490 AC
Ao final do século VI AC, Dario I lançou sua campanha europeia, durante a qual derrotou os peonianos[2], conquistou a Trácia[3] e subjugou todas as cidades gregas costeiras, derrotando a Cítia Europeia[4] em torno do rio Danúbio. Em 512/511 AC, a Macedônia, sob Felipe I, tornou-se um reino vassalo da Pérsia.
Em 499 AC, Atenas cedeu apoio a uma revolta em Mileto[5] que resultou no saque de Sardes, conduzindo a uma campanha Aquemênida contra a Grécia continental, que ficou conhecida como as Guerras Grego-Persas (ou Guerras Médicas) e durou até a primeira metade do século V AC, uma das guerras mais importantes da história da Europa. Na primeira invasão persa, o general persa Mardonius reconquistou a Trácia e tornou a Macedônia totalmente integrada à Pérsia, embora ao final a guerra tenha se transformado em derrota. 
Relevo em rocha de Xerxes I
em sua tumba
O sucessor de Dario I foi Xerxes I e, como seu antecessor, governou o Império no seu auge territorial, de 486 AC até o seu assassinato em 465 AC, pelas mãos de Artabano, o comandante da sua guarda pessoal. Lançou a segunda invasão persa da Grécia, em 480 AC e em dado momento cerca de metade da Grécia continental havia sido conquistada pelos persas, incluindo todos os territórios ao norte do Istmo de Corinto (que liga o Peloponeso, extensa península ao sul da Grécia, à Grécia continental); contudo tal situação logo foi revertida para uma vitória grega, após as batalhas de Plataea e Salamis, quando a Pérsia perdeu sua base de operações na Europa, acabando por retirar-se dela. Pertence a esta invasão o famoso episódio histórico da Batalha das Termópilas, quando uma pequena força de espartanos comandada por um rei de Esparta, Leônidas, resistiu por três dias a um grande exército persa, embora fosse ao final derrotada. Durante as Guerras Grego-Persas, a Pérsia teve grandes vantagens territoriais e destruiu Atenas, em 480 AC. Contudo, após uma sequência de vitórias gregas, os persas foram forçados a retirar, assim perdendo o controle da Macedônia, Trácia e Jônia (região da costa sudoeste da Anatólia, hoje na Turquia, banhada pelo Mar Egeu). A luta continuou por várias décadas após os gregos terem repelido com sucesso a Segunda Invasão, com numerosas cidades-estados gregas sob a recém-formada Liga de Delos (com sua sede na cidade de Delos) e que finalmente terminou com a paz de Callias em 449 AC e término das Guerras Grego-Persas. Xerxes também esmagou revoltas no Egito e na Babilônia logo após assumir o império.
Ruínas do Palácio de Artaxerxes I, em Persépolis
Artaxerxes I, terceiro filho de Xerxes I, sucedeu a seu pai como o quinto Rei da Pérsia, reinando entre 465AC e 424 AC e durante o seu reinado foi assinada a paz de Callias, em 449AC. Seu sucessor foi seu filho Xerxes II que, após um reinado de quarenta e cinco dias, foi assassinado em 424 AC por seu irmão ilegítimo Sogdianus, figura histórica obscura que foi, por seu turno, assassinado por outro irmão ilegítimo, Dario II.
Os historiadores pouco sabem do reinado de Dario II. Enfrentou uma rebelião dos medos em 409 AC e parece ter sido muito dependente de sua esposa Parysatis. Enquanto o poder de Atenas permaneceu intacto, ele não se envolveu nos negócios gregos. Em 413 AC Atenas apoiou o rebelde Amorges, na Caria (região no sudoeste da Anatólia), e Dario II não teria interferido se, no mesmo ano, o poder ateniense não tivesse sido rompido em Siracusa (cidade histórica na região sudeste da ilha da Sicília, Itália). Como resultado do evento, Dario II deu ordem a seus sátrapas na Ásia Menor, para iniciar uma guerra contra Atenas, o que os persas efetivaram através de uma aliança com Esparta. Para maior efetividade, em 408 Dario II enviou para a Ásia menor seu filho Ciro. Dario II morreu em 404 AC, no nono ano do seu reinado, sendo sucedido como rei da Pérsia por Artaxerxes II, seu filho.
Dario II morreu logo antes da vitória final do general egípcio Amirteu, sobre os persas, em revolta do Egito. Os faraós seguintes resistiram às tentativas persas, até 343 AC, quando foi finalmente reconquistado por Artaxerxes III.
O filho mais velho de Dario II, Arsames, foi coroado como Artaxerxes II e ainda antes da coroação enfrentava oposição de seu irmão mais jovem Ciro. Este havia conseguido pacificar as rebeliões locais na Ásia Menor, tornando-se líder popular entre iranianos e gregos. Sabedor da doença de seu pai, Ciro reuniu apoio dos gregos locais e mercenários e marchou para a Babilônia, inicialmente declarando sua intenção de esmagar os exércitos revoltosos na Síria. Ao saber da morte de Dario II, Ciro declarou sua reivindicação ao trono, baseado no argumento de que ele era nascido de Dario e Parysatis, após Dario ter ascendido ao trono, ao passo que Artaxerxes nascera antes de Dario II assumir o trono. Artaxerxes II defendeu sua posição contra Ciro que, com ajuda de imenso exército tentava usurpar o seu direito. Embora Ciro tenha obtido uma vitória tática na Batalha de Cunaxa, na Babilônia (401 AC), foi morto durante a batalha, tornando a vitória irrelevante.
Artaxerxes III, de seu túmulo em Persépolis
Artaxerxes III, filho e sucessor de Artaxerxes II, reinou entre 358 e 338 AC como o Grande Rei (Xá) da Pérsia e o 11º do Império Aquemênida, bem como o 1º Faraó da 31ª dinastia do Egito. Logo após tornar-se rei, Artaxerxes III assassinou toda a família real para garantir seu lugar como rei. Iniciou duas campanhas contra o Egito. Falhou na primeira delas que foi seguida por rebeliões em todo o oeste do Império. Em 343 AC, Artaxerxes III derrotou Nectanebo II, o Faraó do Egito. Nos últimos anos de Artaxerxes, o poder de Felipe II da Macedônia, pai de Alexandre Magno, crescia na Grécia, onde ele tentava convencer os gregos a se revoltarem contra a Pérsia Aquemênida. A isso se opôs Artaxerxes III e com sua ajuda a cidade de Perinthus (ao lado da moderna Istambul) resistiu a um cerco macedônio. Há evidências de uma renovada política de construção em Persépolis, ao final de sua vida, onde Artaxerxes III erigiu um novo palácio e sua tumba, iniciando projetos de longo prazo, tais como o Portão Inacabado. Segundo uma placa cuneiforme, hoje no Museu Britânico, Artaxerxes teria morrido de causas naturais.
Felipe II da Macedônia
Artaxerxes IV, o filho mais jovem de Artaxerxes III, foi rei da Pérsia entre 338 e 336 AC. Foi um rei marionete de Bagoas, um poderoso vizir da Pérsia que poderia ter assassinado seu pai e que, de fato, exercia o poder atrás do trono. Bagoas acabou por envenenar Artaxerxes IV, levando ao trono um seu primo, como Dario III da Pérsia. Uma grande preocupação da Pérsia durante o seu curto reinado foram as hostilidades das fronteiras ocidentais com a Macedônia, sob os reis Felipe II, inicialmente, e Alexandre o Grande, posteriormente. Tais eventos se transformaram na guerra de conquista de Alexandre durante o reinado do sucessor de Artaxerxes III, Dario III.
Dario III, último rei do Império Aquemênida
Após as tentativas frustradas para conquistar a Grécia, o império aquemênida começou a declinar. Décadas de golpes, revoltas e assassinatos enfraqueceram o poder dos aquemênidas. Dario III, originalmente chamado Artashata, foi o último rei do Império Aquemênida da Pérsia, de 336 a 330 AC. Seu reinado foi instável, com grandes áreas governadas por sátrapas ciumentos e não confiáveis, habitado por súditos sem afeto e revoltosos. Em 334 AC, Alexandre, o Grande, iniciou sua invasão do Império Persa. Em 333 AC, os persas já não tinham mais força para suportar a avalanche de ataques de Alexandre, o Grande, que derrotou os persas em várias batalhas antes de saquear e destruir a capital Persépolis, incendiada em 331 AC. Com o Império Persa agora efetivamente sob o seu controle, Alexandre decidiu perseguir Dario III. Em 330 AC, antes de Alexandre captura-lo, Dario III, o último rei Aquemênida foi assassinado pelo sátrapa Bessus (que era também seu primo), com o primeiro Império Persa caindo em mãos dos gregos e macedônios. 


[1] A escrita cuneiforme foi um dos primeiros sistemas de escrita, inventado pelos sumérios. Distinguiu-se por suas marcas em forma de cunha em tabletes de argila, feitas por meio de um bambú rombudo a funcionar como estilete.
[2] A Peônia, terra e reino dos peonianos, tem localização obscura, mas tudo indica que corresponderia à atual República da Macedônia e a uma estreita faixa do norte da Macedônia Grega, nos limites com a República da Macedônia e uma pequena parte do sudoeste da Bulgária.
[3] A Trácia é uma área geográfica e histórica no sudeste da Europa, agora dividida entre a Bulgária, Grécia e Turquia, limitada pelos Balcãs ao norte, o mar Egeu ao sul e o mar Negro ao leste. Compreende o sudeste da Bulgária, o nordeste da Grécia e a parte europeia da Turquia.
[4] A Cítia era uma região da Eurásia Central na antiguidade clássica que incluía partes da Europa Oriental, a leste do rio Vístula, e Ásia Central, com as margens orientais vagamente definidas pelos gregos, que davam este nome a todas as terras do nordeste da Europa e a costa norte do Mar Negro.
[5] Mileto era uma antiga cidade grega na costa oeste da Anatólia (atual Turquia), próxima da foz do rio Maeander na antiga região da Cária. Antes da invasão persa, Mileto era considerada a maior e mais rica das cidades gregas. Suas ruínas estão localizadas próximas da moderna vila de Balat, na província de Aydin, Turquia.

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

A HISTÓRIA DO IMPÉRIO PERSA (IRÃ) - Parte 1

I -INTRODUÇÃO

A história do Irã que nos propomos apresentar, registra os acontecimentos históricos no território correspondente aos atuais Irã, Afeganistão, Tadjiquistão, Uzbequistão, Azerbaijão e outras áreas vizinhas, ao longo de um período de tempo que começa com as primeiras civilizações pré-arianas, passa pelo Império Persa em todas as suas fases, prossegue com o período helenístico, domínio pelos muçulmanos, até o início da idade moderna. Em suas várias formas, trata-se de uma das mais antigas grandes civilizações de existência contínua. 
Localização de Anshan dentro do Império Elamita
A Pérsia é, oficialmente, admitida como um sinônimo para Irã, embora este último tenha se tornado mais usual, no Ocidente, após 1935. O país sempre foi chamado "Irã" (Terra dos Arianos, derivado de Aryanam, forma encontrada em textos persas antigos.) pelo seu povo, para se referir ao seu próprio país, pelo menos desde 600 AC, embora durante séculos tenha sido referido pelos europeus como Pérsia (Persis pelos gregos). Este termo provém do persa Pars ou Parsa ou ainda Fars, o nome do clã principal de Ciro (a ser visto com detalhe) e que também deu o nome à região onde habitavam os persas (hoje, a moderna província de Fars ao sul do Irã) principalmente devido aos escritos dos historiadores gregos. Em 1935 o governo especificou que o país deveria ser chamado Irã; entretanto, em 1959 ambos os nomes passaram a ser admitidos. No uso corrente, o termo Pérsia costuma ser reservado para referir-se ao Império Persa durante suas diversas fases históricas, uma sucessão de Estados que controlaram o Planalto Iraniano e os territórios adjacentes ao longo do tempo, a começar pela dinastia aquemênida, fundada por Ciro, o Grande, no século VI AC, fundado originalmente por um grupo étnico (os persas) a partir da cidade de Anshan (veremos adiante), no que é hoje a província iraniana de Fars, e governado por dinastias sucessivas (persas ou estrangeiras). 
Mapa topográfico do "Platô Iraniano"
O latim apanhou o termo do grego, transformando-o em Persia, forma adotada pelas diversas línguas européias. Em 1935, o Xá Reza Pahlavi solicitou, formalmente, que a comunidade internacional passasse a empregar o nome nativo do país, Iran (Irã ou Irão, em português). Em 1959, o mesmo governante anunciou que tanto Pérsia como Irã eram formas corretas de referir-se ao seu país.
O Planalto Iraniano ou Persa é uma grande formação geológica no Oriente Médio e na Ásia Ocidental e Central, parte da Placa Euroasiática meridional. Cobre a maior parte do Irã (aproximadamente 2/3 do país, da Cordilheira de Zagros para o leste), o Afeganistão (principalmente as porções meridional e oriental do país), o oeste do Paquistão (o Baluchistão e a Província da Fronteira Noroeste) e a parte sul do Turcomenistão, bem como uma pequena área do sul do Azerbaijão. Estende-se desde a Cordilheira Elburz (ou Alborz) na direção sul, até o mar. Seus extremos são marcados pela Cordilheira de Zagros, a oeste, pela Cordilheira de Hindu Kush, a leste, Mar Cáspio e a cadeia montanhosa Kopet Dag, ao norte, o Estreito de Ormuz e o Golfo Pérsico, ao sul. 
Localização geral do Irã moderno
A figura ao mostra o mapa do Irã, oficialmente República Islâmica do Irã, um estado soberano da Ásia Ocidental, nos dias de hoje. Palco de inúmeras guerras, personagens controvertidos e uma das culturas mais antigas do mundo, uma área cheia de conflitos históricos que ainda permanecem, desde milhares de anos antes da Era Cristã. Uma das razões de sua conturbada história, reside exatamente em sua posição geográfica: o país em foco faz fronteiras com, nada mais, nada menos, Turquemenistão, Azerbaijão, Armênia e Mar Cáspio, ao norte, Turquia e Iraque a oeste, Afeganistão e Paquistão a leste, e Golfo Pérsico e Golfo de Omã ao sul. É a história deste país que nos propomos contar nesta postagem.
A história da Pérsia no mundo ocidental, está entrelaçada com a história de uma região mais ampla, até certo ponto conhecido como “Irã Maior” ou “Grande Irã”, compreendendo a área que vai da Anatólia[1], Estreito de Bósforo e Egito, no oeste, às fronteiras da antiga Índia e o Syr Darya (rio da Ásia Central[2]), no leste, e do Cáucaso (região na fronteira entre a Europa e Ásia, situada entre os mares Negro e Cáspio) e a Estepe Eurasiática (a Grande Estepe da Eurásia), no norte, ao Golfo Pérsico e o Golfo de Omã, no sul.
O Irã é o lar de uma das mais velhas civilizações contínuas do mundo, com povoações históricas e urbanas que datam de 7.000 AC. As áreas sudoeste e oeste do Platô Iraniano, participaram do tradicional Antigo Oriente Próximo com o Elam (sudoeste do Irã moderno), do início da Idade do Bronze e, mais tarde, com vários outros povos, como os Cassitas, Manneanos (noroeste do atual Irã) e Gutianos. 
Localização das ruínas de Persépolis
Georg Wilhelm Friedrich Hegel diz que os persas foram o primeiro Povo Histórico. Os Medas (ou Medos) unificaram o Irã como nação e império em 625 AC. O Império Aquemênida (550-330 AC), fundado por Ciro II, o Grande, foi o primeiro dos impérios persas a reinar dos Balcãs à África Norte e também na Ásia Central, cobrindo três continentes a partir do seu trono de poder em Persis (Persépolis, cidade dos persas), capital cerimonial do Império Aquemênida, situada a 60 km da cidade de Shiraz, na província de Fars, Irã. Os mais antigos vestígios de Persépolis datam de 515 AC, exemplificando o estilo de arquitetura Aquemênida, tendo sido declarado pela UNESCO, em 1979, Sítio de Herança Mundial. A palavra portuguesa Persépolis é a própria palavra grega, composta de Perses e Polis e significando a “Cidade dos Persas”. Para os persas antigos, a cidade era conhecida como Parsa, palavra usada para “Persia” ou, mais precisamente, a região de Persis. Foi o maior império jamais visto e o primeiro império mundial. O Primeiro Império Persa foi a única civilização em toda a história a conectar mais de 40% da população global, avaliada em 49,4 milhões da população mundial de 112,4 milhões de pessoas, cerca de 480 AC. Eles foram sucedidos pelos Impérios Selêucida, Parta e Sassânida, que sucessivamente governaram o Irã por quase 1.000 anos e o fizeram novamente uma importante potência mundial. Seu arquirrival foi o Império Romano e seu sucessor, o Império Bizantino. O Império Persa, propriamente dito, iniciou na Idade do Ferro, seguindo o influxo dos povos iranianos, que deram origem aos impérios que o sucederam na antiguidade clássica.
Como um império de tais proporções, o Irã também resistiu a várias invasões, pelos gregos, árabes, turcos e mongóis. Ao longo dos séculos, o Irã continuamente reafirmou sua identidade nacional, desenvolvendo uma entidade política e cultural distintas.
A conquista muçulmana da Pérsia (633-656) encerrou o Império Sassânida, definindo um ponto de inflexão na história iraniana. A “islamização” do Irã teve lugar entre os séculos VIII e X, conduzindo ao declínio do Zoroastrismo[3] bem como de várias de suas crenças. Contudo, as conquistas das civilizações persas anteriores não foram perdidas, mas foram, numa grande extensão, absorvidas pelo novo sistema político e civilização.
O Irã, com sua longa história de culturas e impérios originais, havia sofrido muito, particularmente com o final da Idade Média e início do Período Moderno. Muitas invasões de tribos nômades, cujos líderes tornaram-se governantes deste país, afetaram-no negativamente.
O Irã foi mais uma vez reunido, como estado independente, em 1501, pela Dinastia Safávida (falaremos dela adiante), que converteu o Irã ao Islamismo Xiita (que também veremos em detalhe, oportunamente), como religião oficial do seu império, no ponto crítico da história do Islamismo. Novamente atuando como uma potência líder, desta feita na vizinhança do Império Otomano, seu arquirrival por séculos, o Irã havia sido uma monarquia comandada por um imperador, quase sem interrupção, de 1501 até a revolução iraniana de 1979, quando oficialmente tornou-se uma república islâmica em abril de 1979.
Ao longo da primeira metade do século XIX o Irã perdeu muitos dos seus territórios no Cáucaso (que ele havia governado intermitentemente por milênios), compreendendo hoje a Geórgia Oriental, Dagestão, Azerbaijão e Armênia (todos ao noroeste do Irã), para o seu rival vizinho, rapidamente emergente e em expansão, o Império Russo, após as guerras Russo-Persa, entre 1804-1813 e 1826-1828.

II – PRÉ-HISTÓRIA

II.1 – PALEOLÍTICO (2,5 milhões de anos a 10.000 AC)
Divisão da História
em Eras

Apenas para simplificar a vida dos nossos leitores que não estejam muito acostumados com o assunto, apresentamos ao lado uma tabela simplificada com as divisões da História em eras.
Os mais antigos artefatos arqueológicos no Irã foram encontrados nos sítios de Kashafrud e Ganj Par, que datam do ano 100.000, no Paleolítico Médio. As ferramentas de pedra Musteriana (ou Musteriense, nome dado por arqueólogos a um estilo de ferramentas ou indústria predominantemente de pederneira) feitas por homens de Neandertal[4], também foram encontradas. Há mais resíduos culturais dos homens de Neandertal datando do período do Médio Paleolítico que foram principalmente encontrados na região das montanhas Zagros e alguns poucos no Irã Central, em vários sítios arqueológicos. Em 1949 um rádio (osso do braço) Neanderthal foi descoberto por Carleton S. Coon, na caverna de Bisitun. Há também evidências dos períodos Paleolítico Superior e Epipaleolítico (final do Paleolítico Superior, já mergulhando no Mesolítico), principalmente nas Montanhas Zagros, nas cavernas de Kermanshah e Khorramabad e alguns sítios no Alborz e Irã Central.

II.2 – NEOLÍTICO AO CALCOLÍTICO

O Calcolítico é a transição entre o Neolítico e a Idade do Bronze, também chamada de Idade do Cobre, porque aí surgiram o cobre e os monumentos megalíticos.
As mais antigas comunidades agrícolas começaram a florescer cerca de 10.000 AC na região das montanhas Zagros e entorno, no Irã ocidental. Pela mesma época, os mais antigos vasos de argila e figuras humanas e de animais, de terracota começaram a ser produzidas, também no oeste do Irã. O sudoeste do Irã era parte do “Fértil Crescente”[5], onde a maioria das primeiras culturas importantes foram realizadas, em vilas como Susa, um dos mais velhos povoamentos do Irã e do mundo, fundado, possivelmente cerca de 4.400 AC (próximo de Anshan) e povoamentos como Chogha Mish, datando de 6.800 AC; há jarras de vinho escavadas nas montanhas Zagros, com cerca de 7.000 anos de idade e ruínas de povoamentos da mesma idade. As duas povoações principais do Iraniano neolítico são a Cultura do rio Zayandeh e Ganj Dareh.

II.3 – IDADE DO BRONZE

O Elam foi uma das primeiras civilizações de que se tem registro no extremo oeste e sudoeste do que é hoje o Irã, sendo tradicionalmente considerada o ponto inicial da história do Império Persa (e, em decorrência, do Irã). Existiu cerca de 2700 AC até cerca de 539 AC, em seguida ao chamado Período Proto-Elamita, que teve início em cerca de 3200 AC (a cidade capital era Anshan), quando Susa, que viria a ser a capital dos elamitas, começou a ser influenciada por culturas do Planalto Iraniano. Baseado na busca de idade com o C14 (Carbono 14 ou radio carbono, é um isótopo radioativo do carbono, cuja presença em materiais orgânicos é a base do método para determinação de idades de amostras arqueológicas, geológicas e hidrogeológicas), a época de fundação de Susa é cerca de 4.400 AC, além da época de civilização da Mesopotâmia. A percepção geral entre os arqueólogos é que Susa foi uma extensão da cidade sumeriana de Uruk. Há também dúzias de sítios pré-históricos no platô iraniano indicando a existência de culturas antigas e povoações urbanas no quarto milênio. 
Área do Império Elamita, em vermelho, e áreas vizinhas
O Elam situava-se a leste da Suméria e da Acádia (atualmente, o Iraque). No período Elamita Antigo, constituía-se de reinos no Planalto Iraniano, cujo centro era Anshan, e, a partir do II milênio AC, Susa. Sua cultura desempenhou um papel fundamental no Império Persa, em especial durante a dinastia Aquemênida (que veio a suceder a civilização elamita na região), quando a língua elamita continuou a ser empregada oficialmente. O período elamita costuma ser considerado o ponto inicial da história do Irã (embora tenha havido culturas mais antigas no Planalto Iraniano). Os elamitas foram rivais dos sumérios e acádios e, posteriormente, dos babilônios, na disputa pela hegemonia no Oriente Próximo, até que finalmente foram dominados definitivamente por Nabucodonosor II da Babilônia, no século VII AC. Posteriormente, quando a Babilônia caiu ante os persas de Ciro, o Grande, os elamitas passaram a ser gradativamente absorvidos por outras populações iranianas e semitas.
A língua elamita não tem parentesco com as línguas iranianas (nem com as línguas indo-europeias ou as semíticas), embora alguns estudiosos enxerguem uma relação com as línguas dravídicas. O Elam conviveu com o Reino Jiroft, uma das mais antigas civilizações do platô iraniano, estabelecido no que são hoje as províncias orientais do Irã, enquanto que os elamitas controlavam a porção ocidental, na região da Cordilheira de Zagros; posteriormente sucedeu-o, estendendo-se por todo o platô iraniano. 
Taça de prata de Marvdasht
do terceiro milênio AC
Suas escavações arqueológicas conduziram à descoberta de vários objetos pertencentes ao quarto milênio AC. Há uma grande quantidade de objetos decorados com inconfundíveis gravações de animais, figuras mitológicas e motivos arquitetônicos. Os objetos e sua iconografia diferem de qualquer outra coisa já vista por arqueólogos. Muitos são feitos de clorita, pedra macia verde-cinza; outros são de cobre, bronze, terracota e até lápis-lazúli. Escavações recentes no local produziram a inscrição mais antiga do mundo, que antecede as inscrições da Mesopotâmia.
Há registros de numerosas outras civilizações antigas no platô iraniano antes da emergência dos povos iranianos durante a primitiva Idade do Ferro. O início da Idade do Bronze viu a ascensão da urbanização em cidades-estados organizadas e na invenção da escrita (Período Uruk) no Oriente Próximo. Enquanto o Elam da Idade do Bronze usou a escrita em tempos antigos, a escrita Proto-Elamita permanece indecifrada e registros da Suméria pertencentes ao Elam são escassos.
Há uma corrente teológica que afirma terem sido os elamitas descendentes de Elam, um dos filhos de Sem e neto de Noé nascido após o dilúvio bíblico.

II.4 – INÍCIO DA IDADE DO FERRO

O princípio do primeiro milênio AC testemunhou a segunda grande invasão do Planalto Iraniano por tribos indo-arianas provenientes da Transoxiana[6] e do Cáucaso, entre as quais os medos e os persas. O primeiro registro a respeito dos persas vem de uma inscrição assíria de cerca de 844 AC, que se refere aos parsu (Parsuash, Parsumash), localizando-os na área do Lago Urmia (noroeste do Irã), juntamente com outro grupo, os madai (medos).
Os registros tornam-se mais tangíveis com a ascensão do Império Neo-Assírio (911-612 AC), na Mesopotâmia, e seus registros de incursões do Platô Iraniano. A partir do século XX AC, tribos emigraram da estepe Ponto-Caspiana (hoje territórios da Ucrânia, Rússia e Cazaquistão) para o Platô Iraniano. A chegada no Platô Iraniano forçou os elamitas a renunciarem às suas áreas, buscando refúgio no Elam, Khuzistão ou Khuzestão (uma das províncias do Irã) e áreas vizinhas que só então se tornaram limítrofes com o Elam. Pelo meio do primeiro milênio AC, medas, persas e partas povoavam o Platô Iraniano. Até a ascensão dos medas, todos permaneceram sob dominação assíria, como o resto do Oriente Próximo.

[1] Anatólia, também conhecida como Ásia Menor, denota a protrusão ocidental da Ásia, que compõe a maior parte da Turquia. A região é banhada pelo mar Negro ao norte, o mar Mediterrâneo ao sul e o mar Egeu, a oeste. O mar de Mármara forma uma ligação entre os mares Negro e Egeu através dos estreitos de Bósforo e Dardanelos e separa a Anatólia da Trácia, no continente europeu. Aproximadamente corresponde a dois terços ocidentais da parte asiática da Turquia.
[2] A Ásia Central espalha-se do Mar Cáspio, no oeste, à China, no leste e do Afeganistão, no sul, à Rússia, no norte, mas nunca houve uma demarcação oficial da área. Coloquialmente, ela se refere também aos “stãos”, já que os países geralmente considerados dentro da região, possuem todos o sufixo persa “stão”, que significa “terra de”.
[3] O zoroastrismo, masdaísmo, masdeísmo ou parsismo é uma religião fundada na antiga Pérsia pelo profeta Zaratustra, a quem os gregos chamavam de Zoroastro. É considerada como a primeira manifestação de um monoteísmo ético. De acordo com historiadores da religião, algumas das suas concepções religiosas, como a crença no paraíso, na ressurreição, no juízo final e na vinda de um messias, viriam a influenciar o judaísmo, o cristianismo e o islamismo. Tem seus fundamentos fixados no Avesta (parte das escrituras sagradas do Zoroastrismo) e admite a existência de duas divindades (dualismo), as quais representam o Bem (Aúra-Masda) e o Mal (Arimã). Da luta entre essas divindades, sairia vencedora a divindade do Bem.
[4] O Neandertal (algumas vezes chamado de "Vale do Neander") é um pequeno vale do rio Düssel, no estado alemão do North Rhine-Westphalia, localizado cerca de 12 km a leste de Düsseldorf, a capital do estado. Em agosto de 1856 a área tornou-se famosa com a descoberta do Neanderthal 1, o primeiro espécime do Homo neanderthalensis a ser encontrado.
[5] Também conhecido como “Berço da Civilização”, o “Fértil Crescente” é uma região em forma de quarto crescente que contém a terra comparativamente úmida e fértil das terras áridas e semiáridas da Ásia Ocidental, o vale do Nilo e o Delta do Nilo. O conceito originou-se no estudo da história antiga e logo desenvolveu-se, retendo hoje significados nas relações geopolíticas e diplomáticas internacionais. No uso corrente, todas as definições do Fértil Crescente incluem a Mesopotâmia, as áreas dos vales dos rios Tigre e Eufrates e o Levante, a costa oriental do Mar Mediterrâneo. Os países atuais, com território significativo no Fértil Crescente, são Iraque, Síria, Líbano, Chipre, Jordânia, Israel, Estado da Palestina, Egito, bem como a borda sudeste da Turquia e as bordas do Irã ocidental. A região viu o desenvolvimento de algumas das mais antigas civilizações que floresceram graças às fontes hídricas e recursos agrícolas existentes no Fértil Crescente. Avanços tecnológicos da região incluem o desenvolvimento da escrita, o vidro, a roda, a agricultura e a irrigação.
[6] A Transoxiana é uma denominação obsoleta para uma região da Ásia Central correspondente aos atuais Uzbequistão, Tadjiquistão e sudoeste do Cazaquistão. Geograficamente, localiza-se entre os rios Amu Dária e Sir Dária. No período Aquemênida, a região chamava-se Sogdiana.