Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

sábado, 25 de abril de 2015

NEIL SEDAKA – UMA HOMENAGEM BRASILEIRA

Esta postagem faz o papel de um interlúdio nas minhas atuais publicações sobre as civilizações antigas, no presente tratando do Egito, para quebrar um pouco o ritmo do humor dos meus leitores.  E gostaria de dedicá-la a um grande amigo de infância, adolescência e adultidade, vizinho de rua e companheiro de muitas aventuras, João Carlos Landell de Moura, o popular "Joãozinho", cujo gosto pelo Neil Sedaka ainda lembro muito bem, na figura da sua composição "Oh Carol".
Com esta postagem quero prestar a minha homenagem pessoal a Neil Sedaka, para a maioria dos brasileiros que já ouviram falar nele, apenas um cantor e compositor (se tanto) das décadas de 1950 e 60, época áurea do “Rock’n’Roll” ou “Rock and Roll”, sem considerar os muitos milhões de brasileiros de hoje que nunca ouviram qualquer referência ao seu nome. Por isso o título da postagem, visto que fora do Brasil, principalmente Estados Unidos e Inglaterra, ele é muito conhecido por toda a sua imensa obra – cujos trabalhos prosseguem até hoje – e pelo seu valor como músico e ser humano. Tenho certeza que mesmo os brasileiros adolescentes e fãs dessas duas décadas, muito pouco conhecem de Neil Sedaka, imaginando que ele tenha sido apenas aquele cantor que conquistou os nossos corações com suas melodias simples que falavam de amor e da alegria de viver daquela época. Esta a ideia dessa postagem: prestar uma homenagem ao profissional e homem Neil Sedaka, trazendo, principalmente ao público brasileiro, alguma informação sobre sua vida pessoal, sua carreira profissional e sua grande obra musical.
No ano de 1960, eu estava em plena adolescência, no auge dos meus 16 anos, cursando o então 2º ano do Científico, no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, em Porto Alegre, correspondente ao penúltimo ano do ensino médio. Era a minha famosa época do “no regrets”, tempo em que os jovens, sem quaisquer exageros, viviam com muito alegria, sem compromissos outros que o de estudar, mas também sem arrependimentos, lamentações ou deplorações, pelo menos graves, a menos que por alguma mágoa de amor... Era a época dos bailes, reuniões dançantes, namoros etc..., poucos etc...
Na verdade, essa nossa maravilhosa fase começara uns poucos anos antes, por 1956 ou 1957. As reuniões dançantes, mais frequentes, em geral nas casas dos amigos e amigas, eram embaladas por discos 78, 45 ou 33 rpm, em geral gravados por cantores americanos porque, afinal, era a época do “rock and roll”. Daquele tempo, Bill Haley & His Comets e Neil Sedaka, foram os que mais me marcaram, sem dúvida. O primeiro como símbolo do “rock” e o outro como, na minha opinião, autêntico representante da nossa fase de adolescentes, porque cantava a alegre e romântica adolescência. É preciso lembrar que, naquela época, tudo que era produzido fora, demorava muito mais tempo para chegar ao Brasil do que hoje; isso acontecia muito com os filmes e as músicas. Por exemplo, “Rock Around the Clock” foi lançado nos EUA em 1954, mas a primeira visita de Bill Haley ao Brasil foi em 1958 e creio que a partir daí foi que ele realmente “deslanchou” por aqui. Havia outros cantores que fizeram muito sucesso nessa época, como The Platters (Only You, 1955), Elvis Presley (Heart Break Hotel, 1956), Paul Anka (Diana, 1957), Brenda Lee (Dynamite, 1957), Little Richard (Tutti Frutti, 1957), Connie Francis (Who’s Sorry Now, 1957) e muitos outros nomes. Entretanto, sem querer ser injusto com ninguém, incluindo os maravilhosos cantores e cantoras italianos e franceses daquela época, o assunto aqui é Neil Sedaka.
Neil Sedaka em 1959, ano da famosa "Oh Carol"
Cantor, compositor, pianista e autor são alguns dos títulos que podem ser usados para descrever Neil Sedaka. Uma carreira de seis décadas anos o marcou como uma das primeiras sensações populares dos adolescentes da década de 1950, um compositor importante para si próprio e outros artistas da década de 1960, uma superestrela da década de 1970 e uma força constante na composição e performance atuais.
Sedaka nasceu em 13 de março de 1939 e seu interesse pela música começou à idade de 8 anos, mas não foi o Rock and Roll que o moldou no músico que ele é hoje, mas sim a música Clássica. Com a idade de nove anos ele já havia iniciado seu intensivo treinamento em piano clássico, na prestigiosa “Julliard School”, opção Música, hoje localizada no “Lincoln Center for the Performing Arts”, no alto West Side de Manhattan, New York City, fundada em 1905. Quando tinha 16 anos, o famoso pianista Arthur Rubinstein elegeu Sedaka como um dos melhores pianistas da New York High School. Embora tenha considerado a obtenção de um Doutorado em música, a próxima escolha de Sedaka tornou-se a sua vocação escolhida.
Ansioso por ganhar aprovação de seus colegas da Abraham Lincoln High School, Sedaka começou a tocar “rock and roll” além do seu treinamento clássico, quando formaria o grupo de Doo-Wop (estilo de música vocal baseado no rhythm and blues – R&B), “The Tokens”, em que gravariam dois simples que se tornariam sucessos regionais. Mas foi a apresentação ao seu jovem vizinho, Howard Greenfield, que daria início à mais prolífica parceria do último meio século, que vendeu quarenta milhões de gravações entre 1959 e 1963.
Sedaka e Greenfield tornaram-se um dos criadores originais do “Brill Building Sound”, ao final dos anos 1950 e início dos anos 1960, quando foram os primeiros a assinar com Don Kirshner e Al Nevins na “Aldon Music”, que assinaria também com Neil Diamond, Carole King e Paul Simon entre muitos outros, que se tornaram o centro do mundo pop. O Brill Building (Brill era um comerciante de roupas que operava uma loja no térreo e posteriormente comprou o prédio) é um edifício de escritórios construído em 1931, com projeto de Victor Bark Jr, localizado na Broadway 1619 com a rua 49ª, no distrito dos teatros, Manhattan, New York, ao norte de Times Square. Ele é famoso por abrigar escritórios e estúdios da indústria da música onde algumas das mais populares melodias da música popular americana foram escritas. O prédio tem 11 andares e aproximadamente 16.260 metros quadrados de área de aluguel. Ainda antes da Segunda Grande Guerra o prédio tornou-se um centro de atividade da indústria da música popular, especialmente composição e edição. O nome Brill Building tem sido amplamente adotado como um termo símbolo para uma ampla e influente corrente de tendências da música popular americana, fortemente influenciada pela música latina, o gospel tradicional e o R&B, que desfrutaram de grande sucesso comercial ao final dos anos 1950 e durante toda a década de 60. O termo “Brill Building Sound” é impreciso, contudo, dado que muita da música assim categorizada também veio de outros locais. Muitos dos compositores dessa área se projetaram enquanto mantinham contrato com a “Aldon Music”, uma editora de música fundada em 1958 pelo empreendedor musical Don Kirshner e o veterano da indústria Al Nevins.
O disco que lançou "The Diary", 1958
Sedaka foi “catapultado” ao estrelato com a gravação de seu “Stupid Cupid” por Connie Francis e logo em seguida com a gravação do seu “Where the Boys Are”, para o filme de mesmo nome da MGM, de 1960, seu maior sucesso. As estrelas de R&B Clyde McPhatter e LaVern Baker também obtiveram sucessos com suas canções. Como resultado desses sucessos, Sedaka pode assinar um contrato com a RCA como autor e intérprete de seu próprio material. Logo surgiram nas paradas de sucesso “The Diary” (1958), “Oh! Carol” (1959), “Stairway to Heaven” (1960), “Calendar Girl” (1961), “Little Devil” (1961), “Happy Birthday, Sweet Sixteen” (1961), “Next Door to an Angel” (1962) and “Breaking Up Is Hard To Do” (1962), músicas que se tornaram parte das nossas vidas e instantaneamente nos conduzem, hoje, a momentos muito especiais dos nossos passados.
O sucesso "Oh Carol", disco 48 RPM
Em 1964, a direção da música norte-americana mudou drasticamente com o surgimento dos Beatles e muitos artistas solo homens não conseguiram manter sua carreira na música. Sedaka foi um dos que sobreviveu, por seus muitos talentos como compositor, escrevendo canções para artistas como Frank Sinatra (The Hungry Years), Elvis Presley (Solitaire), Tom Jones (Puppet Man), The Monkeys (When Love Comes Knocking at Your Door) and The Fifth Dimension (Workin’ on a Groovy Thing).
Neil Sedaka reinventou sua carreira solo, em 1972, com o lançamento do álbum “Emergence”, na Inglaterra, quando Elton John resolveu adicioná-lo à sua marca Rocket Records, assim reintroduzindo-o à audiência americana através dos álbuns “Sedaka’s Back”, em 1974, e “The Hungry Years”, em 1975, campeões de venda em todo o mundo.
Seu retorno foi ainda incrementado através de duas de suas canções compartilhadas com Phil Cody, “Bad Blood” e a quintessência “Laughter in the Rain”, ambas atingindo a primeira posição nos quadros de músicas. A canção “Breaking Up Is Hard To Do” foi relançada como balada em 1975 e fez história quando se tornou a primeira canção gravada em duas versões diferentes, pelo mesmo artista, a atingir o número 1 nos quadros.
As honras vertidas sobre Neil Sedaka foram várias, entre as quais citamos a sua introdução ao “Hall of Fame” de compositores, uma estrela na “Calçada da Fama” de Hollywood e nome de rua no Brooklin, seu berço.
No ano de 1997, numa de minhas periódicas visitas a Porto Alegre, minha terra natal, entrei numa casa de discos e perguntei ao rapaz que me atendeu se ele tinha alguma coisa de Neil Sedaka, tendo como certo que ele me responderia nunca ter ouvido falar de tal intérprete. Mas, para minha surpresa ele respondeu que tinha um disco muito interessante, com Neil Sedaka cantando música clássica. Imaginando que ele se tivesse equivocado com relação ao intérprete, pedi-lhe que me mostrasse o disco. E era verdade! Em 1995, Neil Sedaka lançara um CD com 14 clássicos incluindo composições de Chopin, Rachmaninov, Tchaikowsky, Schumann, Puccini e outros, todos letrados e interpretados por ele, que assim realizava, segundo suas próprias palavras, um sonho que o levava de volta às suas raízes de pianista clássico. Um disco que eu recomendo a todos!
Neil Sedaka, ao vivo, em 2005
 Com tão longa carreira, Sedaka nunca deixou de surpreender e tampouco dá sinais de decadência. Em junho de 2004 ele recebeu o prêmio “Sammy Cahn Lifetime Achievement”, da “Academia Nacional de Música Popular/Hall da Fama dos Compositores” em sua 35ª organização anual de entrega de prêmios, em Nova York, como reconhecimento por seus relevantes feitos na promoção dos sucessos dos compositores.
Em 2006 Sedaka concluiu uma turnê de 10 dias no Reino Unido, onde filmou um concerto ao vivo no Royal Albert Hall de Londres, lançado como “Neil Sedaka: The Show Goes On”. Durante este histórico acontecimento, Sedaka foi agraciado com o “Guinness Award” por sua canção “(Is this the way to) Amarillo”, como o simples de maior venda do século XXI no Reino Unido, uma canção originalmente interpretada por Tony Christie, há mais de 35 anos atrás.
Em 24 de abril de 2007 Sedaka lançou “The Definitive Collection”, uma retrospectiva em honra do seu 50º aniversário no “show business”, que debutou em 22º lugar no Billboard Chart, marcando o seu reaparecimento no quadro desde 1980. Em 26 de outubro do mesmo ano Sedaka foi honrado com um tributo no Avery Fisher Hall, do Lincoln Center de New York: “Neil Sedaka: 50 Anos de Sucessos”, em benefício à Fundação Elton John da AIDS, que apresentou suas canções interpretadas por Connie Francis, Dion, Paul Shaffer, Natalie Cole, Clay Aiken, Renee Olstead e Captain & Tenille. O acontecimento foi apresentado por Cousin Brucie Morrow e David Foster; Elton John e Barry Manilow enviaram seus vídeos de tributo por suas ausências.
Neil Sedaka é casado há 50 anos com a mesma esposa Leba e têm dois filhos: Dara, uma artista e vocalista de TV e comerciais de rádios, e Marc, um roteirista de sucesso em Los Angeles; os netos já são três: as gêmeas Amanda e Charlotte e o neto Michael.
Em 2010, inspirado por seus netos, Sedaka lançou “Waking Up Is Hard To Do”, uma coleção de sucessos reinventados como canções de crianças, como uma colaboração em família em que Marc adaptou quatro canções clássicas de seu pai e as gêmeas de cinco anos fizeram sua estreia como vocalistas de fundo. Desde o lançamento do CD, a “Imagine Publishing” começou a liberação de uma séria de livros baseados nessas canções. Em setembro de 2010 foi lançado “Waking Up Is Hard To Do”; “Dinosaur Pet”, com a nova letra de Marc para “Calendar Girl”, foi lançada em maio de 2012, alcançando o terceiro posto na lista de best-sellers do New York Times.
Em maio de 2010 Sedaka foi premiado com o “Special International Award From The Ivors” em honra de sua excelência na composição de canções. Em 8 de outubro recebeu do “Variety Club” a “Silver Heart Award”, por seu relevante serviço à indústria da música e seu trabalho de caridade.
Sedaka retornou às suas raízes clássicas compondo sua primeira peça sinfônica, “Joie de Vivre”, e seu primeiro concerto para piano, “Manhattan Intermezzo”, gravadas em outubro de 2010, com a Orquestra Filarmônica de Londres, no famoso “Air Studios”, em Londres.
O mito Neil Sedaka em 2013
Além dessa extensa programação mundial, Sedaka lançou em 2013 “The Real Neil”, um CD de material original seu, incluindo poucos de seus clássicos. Há nesse CD canções admiráveis, como é o caso de “Beginning to Breath Again”, “New York City Blues” (orquestrado) e “You”, apenas para citar algumas. É o primeiro álbum acústico de Sedaka, “apenas piano e voz, a pura forma de canção, da forma como as escrevo”, segundo suas próprias palavras. O CD marca o lançamento oficial de “Manhattan Intermezzo”, uma joia da música clássica.
São todas essas venturas mencionadas que transformam Neil Sedaka, este músico consumado, extraordinário vocalista e eterno talento da composição, numa verdadeira lenda viva. Pessoalmente, eu já me contentaria com o papel que Neil Sedaka representou em nossa juventude, com as horas de prazer que nos proporcionou através da criação e interpretação das maravilhosas canções que embalaram os sonhos da nossa longínqua adolescência.

sexta-feira, 17 de abril de 2015

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: EGITO (PARTE 05)

III.10 – DINASTIA PTOLOMAICA (332 – 30 AC)

Em 332 AC, Alexandre, o Grande, rei da Macedônia, invadiu a satrapia persa aquemênida do Egito, com pouquíssima resistência e foi aclamado pelos egípcios como libertador. Conciliou os egípcios pelo respeito que mostrou por sua religião, mas indicou macedônios para virtualmente todos os postos seniores do país e fundou a nova cidade grega de Alexandria, como a capital do reino. Em 331 AC Alexandre estava pronto para partir à conquista do resto do Império Persa e conduziu suas forças para a Fenícia. Deixou Cleomenes como monarca do Egito em sua ausência, mas morreu sem nunca ter retornado ao Egito.
A administração estabelecida pelos sucessores de Alexandre, a Dinastia Macedônica Ptolomaica, um reino helenístico sediado no Egito, foi baseada num modelo egípcio e situada na nova cidade capital Alexandria. Foi administrada por uma dinastia Ptolomaica que começou com a ascensão de Ptolomeu I Soter, após a morte de Alexandre, o Grande, em 323 AC, e encerrou com a morte de Cleópatra VII e a conquista romana. Os reis ptolomaicos adotaram o costume egípcio de casar com suas irmãs e por isso muitos dos reis governaram junto com suas esposas, que também pertenciam à casa real. As únicas rainhas ptolomaicas a, oficialmente, reinar por si, foram Berenice III e Berenice IV. Cleópatra VII, oficialmente, reinou com Ptolomeu XIII, XIV e XV, mas, efetivamente, governou o Egito sozinha.
A Alexandria serviu de mostruário de poder e prestígio do governo helenista e tornou-se um assento de aprendizado e cultura, centrado na famosa Biblioteca de Alexandria. O Farol de Alexandria iluminava o caminho para os muitos navios que mantinham comércio através da cidade, pois os Ptolomeus faziam comércio e empresas de geração de receita, como a manufatura do papiro, sua prioridade.
A cultura helenista não suplantou a cultura nativa egípcia, com o apoio dos Ptolomeus às tradições egípcias, num esforço para garantir a lealdade do povo. Construíram novos templos em estilo egípcio, apoiaram os cultos tradicionais e se retratavam como faraós. Algumas tradições se fundiram, como deuses gregos e egípcios, com o exemplo de Serápis, além das formas gregas clássicas de escultura que influenciaram os tradicionais motivos egípcios. Apesar dos seus esforços para acalmar os egípcios, os Ptolomeus foram desafiados por rebeliões nativas, rivalidades familiares e a poderosa plebe de Alexandria que se formou após a morte de Ptolomeu IV. Além disso, como Roma confiava mais pesadamente em importações de grãos do Egito, os romanos dedicaram grande interesse na situação política do país. As contínuas revoltas, ambições políticas e os poderosos oponentes do Oriente Próximo fizeram a situação tão instável que Roma teve que enviar forças para garantir o país como uma província do seu império.
Com a morte de Alexandre na Babilônia, em 323 AC, a crise sucessória eclodiu entre seus generais. Inicialmente, Perdiccas reinou como regente do meio irmão de Alexandre, Arrhidaeus, que tornou-se Filipe III da Macedônia e, então, como regente de ambos, Filipe III e Alexandre IV da Macedônia, filho de Alexandre ainda não nascido ao tempo de sua morte. Perdiccas indicou Ptolomeu, um dos mais próximos companheiros de Alexandre, como sátrapa do Egito, a partir de 323 AC, em nome dos príncipes Felipe III e Alexandre IV. Com a desintegração do império de Alexandre, Ptolomeu estabeleceu-se como governante em seu próprio direito, defendendo o Egito com sucesso contra uma invasão de Perdiccas em 321 AC, assim consolidando sua posição no Egito. Em 305 AC Ptolomeu tomou o título de faraó, fundando a Dinastia Ptolomaica, que reinaria no Egito por cerca de 300 anos, como Ptolomeu I Soter, dominando uma área que se espalhava do sul da Síria a Cirene, na Líbia e ao sul da Núbia.
Ptolomeu I Soter, fundador da dinastia
A primeira parte do reinado de Ptolomeu I foi dominada pelas Guerras do Diadochi, entre os vários estados sucessores do império de Alexandre, quando seu primeiro objetivo foi manter segura sua posição no Egito e o segundo, aumentar os seus domínios. Em poucos anos ele havia ganho o controle da Líbia, Síria (que incluía a Judeia) e Chipre. Quando Antígonus, governador da Síria, tentou reunir o Império de Alexandre, Ptolomeu reuniu uma coligação contra ele. Em 312 AC, unido com Seleucos, o governante da Babilônia, ele derrotou Demetrius, o filho de Antígonus, na batalha de Gaza.
Em 311 AC, uma paz foi firmada entre os combatentes, mas em 309 a guerra irrompeu novamente e Ptolomeu tomou Corinto e outras partes da Grécia, embora tenha perdido Chipre numa batalha naval em 306 AC. Antígonus tentou então invadir o Egito, mas Ptolomeu conseguiu manter suas fronteiras. Quando uma coalizão foi renovada contra Antígonus, em 302 AC, Ptolomeu juntou-se a ela, embora não estivesse presente, com seu exército, quando Antígonus foi derrotado e morto em Ipsus. Ele havia aproveitado a oportunidade para garantir a Síria e a Palestina, quebrando acordo que a cedia a Seleucos, com isso armando o cenário para as futuras Guerras Sírias. A partir daí Ptolomeu tentou manter-se afastado das guerras por território, mas ainda acabou retomando Chipre em 295 AC.
Divisão do Império de Alexandre, podendo-se ver o Egito
e seus domínios (em azul) sob Ptolomeu I Soter
Sentindo que seu reinado se achava seguro, Ptolomeu repartiu o mando com seu filho Ptolomeu II em 285 AC. Pode então devotar a sua aposentadoria à redação de uma história das campanhas de Alexandre, que infelizmente foi perdida, mas serviu de base para um trabalho posterior de Arrian, historiador grego do século II AC. Ptolomeu I morreu em 283 AC com a idade de 84 anos, deixando para seu filho um reino estável e bem governado.
Ptolomeu II Philadelphus sucedeu a seu pai em 283 AC, como rei do Egito e foi um rei pacífico e culto. Não necessitou mover muitas guerras porque seu pai lhe deixou um país próspero e forte. Três anos de campanha no início do seu reinado (Primeira Guerra Síria) lhe deixaram senhor do Mediterrâneo oriental, controlando as ilhas do mar Egeu e os distritos costeiros da Cilícia, Pamphylia e Caria. Contudo, alguns desses territórios foram perdidos ao final do seu reinado como resultado da Segunda Guerra Síria.
A primeira esposa de Ptolomeu, Arsinoe I, filha de Lysimachus, foi a mãe de seus filhos legítimos. Após sua separação, ele seguiu o costume egípcio e casou com sua irmã, Arsinoe II, iniciando uma prática que, embora agradando à população egípcia, trouxe sérias consequências aos reinados futuros. O esplendor material e literário da corte alexandrina atingiu seu ápice com Ptolomeu II. Callimachus, mantenedor da Biblioteca da Alexandria, Teócritus e muitos outros poetas, glorificaram a família ptolomaica. O próprio Ptolomeu ansiava por aumentar a biblioteca e apoiara pesquisa científica. Ele investiu pesadamente para tornar a Alexandria a capital econômica, artística e intelectual do mundo helenístico. É às academias e bibliotecas da Alexandria que devemos a preservação de tanta herança literária grega.
Moeda de ouro de Ptolomeu III
Ptolomeu III Euergetes sucedeu a seu pai em 246 AC. Abandonou a política de seu predecessor de afastar-se das guerras contra os demais reinos macedônicos e mergulhou na Terceira Guerra Síria com os selêucidas da Síria, quando sua irmã, rainha Berenice, e seu filho foram assassinados numa disputa dinástica. Ptolomeu marchou triunfante no coração do reino selêucida, até a Babilônia, enquanto suas frotas no mar Egeu faziam novas conquistas ao norte até a Trácia.
Essa vitória marcou o ápice do poder ptolomaico e após ele, Ptolomeu não persistiu ativamente nas guerras embora sempre tenha apoiado os inimigos da Macedônia na política grega. Sua política doméstica diferiu da do seu pai, apoiando a religião egípcia nativa: deixou traços maiores nos monumentos egípcios, marcando a gradual "egipciação dos ptolomeus".
Em 221 AC Ptolomeu III morreu e foi substituído por seu filho Ptolomeu IV Philopator, um rei fraco e corrupto que iniciou o declínio da dinastia ptolomaica. Assassinou sua mãe e esteve sempre sob a influência dos favoritos reais, masculinos e femininos, que controlavam o governo. Contudo, seus ministros ainda puderam fazer sérios preparativos contra os ataques de Antiocus III, o Grande, na Síria; e a grande vitória egípcia de Raphia, em 217 AC, garantiu o reino. Um sinal da fraqueza doméstica do seu reinado foram as rebeliões pelos egípcios nativos que retomaram quase a metade do país por mais de 20 anos. Philopator foi devotado às religiões orgíacas e à literatura. Desposou sua irmã Arsinoe, mas foi conduzido por sua concubina, Agathoclea.
Ptolomeu V Epifânio, filho de Philopator e Arsinoe, era uma criança quando galgou o trono e o reino foi conduzido por uma série de regentes. Antiocus III e Felipe V da Macedônia fizeram um pacto para tomar as possessões ptolomaicas. Felipe tomou várias ilhas e locais na Cária e Trácia, enquanto a batalha de Panium, em 198 AC transferiu a Síria ao controle selêucida. Após esta derrota, o Egito formou uma aliança com Roma, o poder crescente no Mediterrâneo. Atingindo a idade adulta, Epifânio tornou-se um tirano, antes de sua morte prematura em 180 AC. Foi sucedido por seu filho criança Ptolomeu VI Philometor.
Em 170 AC, Antiocus IV Epifânio invadiu o Egito depondo Philometor e instalando seu irmão mais jovem (mais tarde Ptolomeu VIII Euergetes II) como rei fantoche. Quando Antiocus retirou-se, os irmãos concordaram em reinar em conjunto com sua irmã Cleópatra II. Contudo, logo caíram e a briga entre eles permitiu a interferência de Roma e o aumento gradual de sua influência no Egito. Mais tarde Philometor recuperou o trono. Em 145 AC ele foi morto na Batalha de Antióquia.
Philometor foi sucedido por seu filho infante Ptolomeu VII Neos Philopator que foi foi logo assassinado por seu tio Euergetes que retomou o trono como Ptolomeu VIII tornando-se um tirano cruel. Com sua morte em 116 AC, deixou o trono para sua esposa Cleópatra III e seu filho Ptolomeu IX Philometor Soter II. O jovem rei foi deposto por sua mãe em 107 AC, que reinou com o filho mais jovem de Euergetes, Ptolomeu X Alexandre I. Em 88 AC Ptolomeu IX retornou ao trono e o reteve até a sua morte em 80 AC. Foi sucedido por Ptolomeu XI Alexandre II, filho de Ptolomeu X. Este foi linchado pela população alexandrina após ter assassinado sua madrasta, que era também sua prima, tia e esposa. Tais sórdidas disputas dinásticas deixaram o Egito tão enfraquecido que o país tornou-se, na prática, um protetorado de Roma que havia então absorvido a maioria do mundo grego.
Ptolomeu XI foi sucedido por um filho de Ptolomeu IX, Ptolomeu XII Neos Dionysos, apelidado Auletes, o flautista. Roma era então o árbitro dos negócios egípcios e anexara a Líbia e Chipre. Em 58 AC Auletes foi deposto pela população alexandrina, mas os romanos o recolocaram no poder três anos mais tarde. Ele morreu em 51 AC deixando o trono para o seu filho de dez anos, Ptolomeu XIII Theos Philopator, que reinou em conjunto com sua irmã e esposa Cleópatra VII, a mais famosa das Cleópatras.
Cleópatra VII, amante de imperadores.
Quando Cleópatra subiu ao trono egípcio tinha apenas 18 anos de idade. Reinou como Rainha “Philopator” e Faraó entre 51 e 30 AC e morreu com a idade de 39 anos. Nesse ponto torna-se necessária a inclusão de algo sobre o Império Romano para que o leitor bem possa entender o panorama geral que levou ao final do Egito como um grande império da antiguidade.
O declínio do poder dos Ptolomeus coincidiu com a ascensão do Império Romano. Com pouca escolha e vendo suas cidades caírem umas após as outras para os impérios macedônio e selêucida, os Ptolomeus decidiram aliar-se aos romanos, num pacto que durou por mais de 150 anos. Durante o governo dos últimos Ptolomeus, Roma ganhou cada vez mais poder sobre o Egito, sendo declarado guardião da Dinastia Ptolomaica. O pai de Cleópatra, Ptolomeu XII pagava tributo aos romanos para mantê-los afastados do seu reino. Com a sua morte, a queda da dinastia chegou ainda mais próxima.
Enquanto crianças, Cleópatra e seus irmãos testemunharam a derrota de seu guardião, Pompeu, por Júlio Cesar, através de guerra civil (este assunto foi visto com detalhe em nossa postagem “Breve História do Império Romano”), enquanto disputavam o controle do trono egípcio.
Em meio a esse tumulto, Júlio Cesar partiu para a Alexandria em 48 AC onde, durante sua estadia no Palácio, ele recebeu, segunda conta a história, Cleópatra, como um presente, enrolada em um tapete no auge dos seus 22 anos. Com isso, talvez, ela tenha convencido Cesar a apoiá-la na alienação de Ptolomeu XIII, pois com a chegada dos reforços romanos e algumas pequenas batalhas em Alexandria, Ptolomeu XIII foi derrotado na Batalha do Nilo, possivelmente afogado no rio, embora as circunstâncias de sua morte não sejam claras.
No verão de 47 AC, tendo casado com seu irmão mais novo, Ptlomeu XIV, Cleópatra tornou-se amante de Cesar e deu-lhe um filho, Cesarion. Em 45 AC Cleópatra e Cesarion viajaram a Roma onde ficaram em um palácio construído por Cesar em sua honra.
Em 44 AC Cesar foi assassinado em Roma por um complô de senadores e com sua morte o Império passou a ser comandado pelo Segundo Triunvirato: Marco Antônio, Otaviano e Lépido. Cleópatra observava e vendo a prevalência de Marco Antônio sobre os demais, a ele ofereceu o seu apoio, tornando-se também sua amante. A aliança de Marco Antônio (que ficara com o império oriental) e Cleópatra enfureceu Roma, que a considerava uma prostituta. Cessões de territórios romanos realizadas por Marco Antônio a Cleópatra e seus filhos, além de outros eventos menores, provocaram a declaração de guerra de Otaviano contra a “Rainha Estrangeira” e, no mar Adriático, encontram-se em Actium, onde as forças de Vespasiano derrotaram a marinha de Cleópatra e Marco Antônio.
Otaviano esperou um ano para declarar o Egito província romana, quando chegou à Alexandria e facilmente derrotou Marco Antônio, fora da cidade, que cometeu suicídio caindo sobre sua própria espada. Otaviano entrou em Alexandria no ano 30 AC e não demonstrou qualquer interesse em relação, reconciliação ou negociação com Cleópatra. Vendo próximo o seu fim, Cleópatra suicidou-se, segundo a crença atual, pela mordida de uma serpente venenosa. Com a morte de Cleópatra, a dinastia dos Ptolomeus chegou ao fim e a Alexandria permaneceu como capital do Egito, que tornou-se uma província romana.

III.11 – PERÍODO ROMANO

O Egito, portanto, tornou-se uma província do Império Romano no ano 30 AC, após a derrota de Marco Antônio e a rainha ptolomaica Cleópatra VII, para Otaviano (mais tarde o Imperador Augusto). Como vimos, os romanos dependiam muito dos embarques de grãos do Egito, e o exército romano, sob o controle de um prefeito indicado pelo imperador, dominava rebeliões, fazia cumprir a coleta de pesados impostos e impedia ataques por bandidos, que haviam se tornado problemas notórios durante o período. Alexandria tornou-se um centro cada vez mais importante na rota do comércio com o oriente, quando os supérfluos exóticos estavam em alta demanda em Roma.
Embora os romanos tivessem uma hostilidade maior do que os gregos com relação aos egípcios, algumas tradições, como a mumificação e a adoração dos deuses tradicionais, prosseguiram. A arte da mumificação floresceu e alguns imperadores romanos foram representados como faraós, embora não com a mesma intensidade dos Ptolomeus. A administração local tornou-se romana no estilo e fechada aos egípcios nativos.
A partir do meio do primeiro século DC, a cristandade fincou raízes no Egito, como um outro culto aceito, como uma religião sem compromisso que buscava conversões das religiões egípcia e greco-romana, ameaçando as tradições religiosas populares. Isso conduziu à perseguição de convertidos ao cristianismo, culminando nos grandes expurgos de Diocleciano, iniciados em 303 DC, mas que acabou saindo vencedor em 391 DC, com Teodosius. A Alexandria tornou-se palco de grandes revoltas ante pagãs, com a destruição de imagens religiosas públicas e privadas. Como consequência, a cultura religiosa nativa do Egito entrou em declínio. E embora a população nativa continuasse a falar sua língua, a habilidade em ler a escrita hieroglífica lentamente desapareceu na medida em que o papel dos sacerdotes e sacerdotisas dos templos egípcios diminuía.
E aqui, como no caso da Mesopotâmia, cessa o nosso interesse pelo Egito como uma das mais antigas civilizações do mundo.

Continuação na próxima postagem: PARTE 06

sábado, 11 de abril de 2015

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: EGITO (PARTE 04)

III.7 – NOVO REINO (1550 – 1069 AC)


Novo Reino em sua máxima extensão século XV AC 
O Novo Reino do Egito, ao qual também se refere como o Império Egípcio, é o período da história do Egito Antigo entre os séculos XVI (entre 1570 e 1544 AC) e XI AC, que cobriu da 18ª à 20ª Dinastias do Egito. Foi o período mais próspero do Egito e marcou o pico do seu poder e sua máxima extensão territorial. Os faraós do Novo Reino estabeleceram um período de prosperidade sem precedentes, pela segurança de suas fronteiras e pelo estreitamento dos laços diplomáticos com seus vizinhos, incluindo o Império Mitani, Assíria e Canaã. Os faraós do Novo Reino Promoveram a construção em larga escala, em honra ao deus Amun[1] cujo culto crescente era baseado em Karnak[2]. Eles também construíram monumentos para glorificar seus próprios sucessos, reais e imaginários.A última parte deste período, durante a 19ª e 20ª Dinastias (1292-1069 AC), é também conhecida como período Ramessita, devido aos onze faraós que tomaram o nome de Ramsés.
Máscara mortuária de Tutankamon, o jovem
rei que restaurou a antiga religião

A 18ª Dinastia teve alguns dos mais famosos faraós do Egito, incluindo Ahmose I, Hatshepsut, Tutmose III, Amenotep III, Akenaten e Tutankamon. A rainha Hatshepsut, que reinou por quase vinte e dois anos, promoveu a paz e concentrou-se em expandir o comércio externo do Egito, perdido com a ocupação dos hicsos, enviando uma expedição comercial até a distante terra do Punt. Tutmose III (1479-1425 AC) - como seu avô Tutmose I - expandiu o exército egípcio e controlou-o com grande sucesso para consolidar o império de seus predecessores. Foi durante o seu reinado que o termo Faraó, originalmente se referindo ao palácio do rei, tornou-se uma espécie de título para o rei. Quando Tutmose III morreu, em 1425 AC, o Egito tinha um império que se estendia da Niya, no noroeste da Síria, até a quarta cachoeira do Nilo, na Núbia, concretando alianças e abrindo acesso a importações críticas, como bronze e madeira.
A despeito de suas realizações, Amenotep II (também conhecido como Amenófe II), herdeiro do sobrinho (e enteado) de Hatshepsut, Tutmose III, tentou apagar o seu legado durante e próximo ao final do reinado do seu pai, tornando suas muitas das realizações dela. Ele também tentou mudar muitas tradições estabelecidas durante séculos, numa fútil tentativa de evitar que outras mulheres se tornassem faraós e frear sua influência no reino.
Estátua da Rainha Hatshepsut
Cerca de 1350, a estabilidade do Reino Novo pareceu mais ameaçada quando Amenotep IV, um dos mais conhecidos faraós da 18ª Dinastia, subiu ao trono e instituiu uma série de reformas radicais e caóticas. Mudando seu nome para Akenaten (em honra de Aten, um aspecto do deus Ra), ele promoveu a obscura deidade Aten a suprema e praticamente exclusiva deidade, suprimindo a adoração das demais, no primeiro exemplo de monoteísmo da história. Atacou o poder do templo que era dominado pelos sacerdotes de Amun, em Tebas, e mudou a capital para Aketaten, tornando-se surdo aos eventos do Oriente Próximo, onde hititas, mitanis e assírios competiam pelo controle. Após a sua morte, o culto a Aten foi rapidamente abandonado, os sacerdotes de Amun recuperaram seu poder e o poder retornou a Tebas. Sob sua influência, os faraós subsequentes, Tutankamon, Ay e Horemhem, trabalharam para apagar toda a menção à heresia de Akenaten, agora conhecida como Período Amarna. Possivelmente, foi esse fervor religioso de Akenaten pelo deus único Ten, que posteriormente o tornou proscrito da história egípcia. Sob seu reinado a arte egípcia floresceu atingindo um nível inédito de realismo.
Possível localização da Terra de Punt
com rotas terrestres e marítimas
Cerca de 1279 AC, Ramsés II, também conhecido como Ramsés, o Grande, já da 19ª Dinastia, subiu ao trono e construiu mais templos, erigiu mais estátuas e obeliscos e procriou mais crianças que qualquer outro faraó na história. Procurou recuperar territórios no Levante que tinham sido ocupados pela 18ª Dinastia. Um forte líder militar, Ramsés II conduziu seu exército contra os hititas na Batalha de Kadesh e, após lutar um combate sem decisão, finalmente concordou com o primeiro tratado de paz registrado, em 1258 AC. Sem poder vencer os hititas e temeroso da expansão do Médio Império Assírio, o Egito retirou-se muito do Oriente Próximo. Com isso os hititas foram deixados competir, sem sucesso, com os poderosos assírios e os recém chegados frígios.
Seus sucessores imediatos continuaram as campanhas militares, embora uma corte crescentemente conturbada – que em algum ponto colocou no trono um usurpador, Amenmesse –, tornou difícil a um faraó a tarefa de reter o controle sem incidente.
Tutmose III, o faraó militar,
"o Napoleão do Egito"
O último grande faraó do Novo Reino é aceito pela maioria como Ramsés III, um faraó da 20ª Dinastia, que reinou por várias décadas após Ramsés II. No oitavo ano do seu reino, os Povos do Mar (Filisteus entre outros) invadiram o Egito por terra e por mar sendo batidos por Ramsés III em duas grandes batalhas de mar e terra. Ramsés pretendeu tê-los incorporado como súditos estabelecendo-os ao sul de Canaã, embora haja evidência de que eles forçaram seu caminho para Canaã. Sua presença lá pode ter contribuído para a formação de novos estados nessa região, como a Filisteia[3] (Palestina), após o colapso do Império Egípcio.
O alto custo dessas ações de guerra lentamente drenou a riqueza do Egito e contribuiu para o seu gradual declínio na Ásia. A grandeza de suas dificuldades foi tão grande que a primeira greve de trabalho registrada na história ocorreu durante o 19º ano do reinado de Ramsés III, quando não foi possível fornecer as rações para os artesãos e construtores dos túmulos reais na vila de Deir el Medina. Características climáticas incomuns impediram a adequada insolação, prejudicando o crescimento global das árvores por quase duas décadas completas, até 1140 AC, provavelmente pela erupção do vulcão Hekla, na Islândia, cuja data correta permanece em disputa.
Faraó Akenaten (Amenotep IV), fundador da
primeira religião monoteísta 
A morte de Ramsés III foi seguida por anos de disputa entre seus herdeiros, três filhos do qual ascenderam ao trono sucessivamente como Ramsés IV, Ramsés VI e Ramsés VIII. O Egito foi, cada vez mais, perturbado por secas (abaixo do nível normal das cheias do Nilo), fome, agitação civil e corrupção no governo. Além disso, a riqueza do Egito, entretanto, fê-lo um alvo tentador à invasão, particularmente pelos berberes líbios do oeste e os Povos dos Mares, uma poderosa confederação de piratas gregos, luvianos (povo da Anatólia relacionado aos hititas) e fenícios/canaanitas. Inicialmente o exército pode repelir tais invasões, mas o Egito acabou perdendo o controle dos seus territórios ao sul de Canaã, principalmente para os assírios. O poder do último faraó da dinastia, Ramsés XI tornou-se tão fraco, que os altos sacerdotes de Amun, em Tebas, tornaram-se os governantes de fato do Alto Egito; e Smendes, controlando o Baixo Egito, ainda antes da morte de Ramsés XI, acabou fundando a 21ª Dinastia em Tanis, região nordeste do Delta do Nilo, conduzindo o Egito ao Terceiro Período Intermediário.

III.8 – TERCEIRO PERÍODO INTERMEDIÁRIO (1069 – 664 AC)

O Terceiro Período Intermediário do Antigo Egito inicia com a morte do faraó Ramsés XI, em 1070 AC e termina com o início do Último Período, com a fundação da 26ª Dinastia, por Psamtik, em 664 AC. Foi um período de declínio e instabilidade política, marcado pela divisão do Estado e pelo governo de estrangeiros, embora muitos aspectos da vida dos egípcios comuns tenham mudado relativamente pouco.
Com a morte de Ramsés XI, em 1078 AC, Smendes assumiu o poder sobre a região norte do Egito, reinando da cidade de Tanis e constituindo a 21ª Dinastia. O sul e o médio vale estavam efetivamente controlados pelos sacerdotes de Amun, em Tebas, que reconheciam Smendes apenas no nome. Durante este período, tribos berberes, do que mais tarde se chamaria Líbia, se haviam estabelecido no delta ocidental e os chefetes desses colonizadores começaram a aumentar a sua autonomia. Príncipes líbios tomaram controle do delta sob Shoshenq I, em 945 AC, fundando a dinastia Berbere Líbia ou Bubastita – 22ª Dinastia -, que governou por cerca de 200 anos. Soshenq I também ganhou controle do sul do Egito, colocando membros da sua família em posições sacerdotais e reunificando o país. Com isso, o Egito teve estabilidade por mais de 100 anos quando, após o reinado de Osorkon II, o país rachou em dois estados, com Shoshenq III, da 22ª Dinastia, controlando o Baixo Egito por 818 AC, enquanto Takelot II e seu filho Osorkon (o futuro Osorkon III) governavam o Médio e Alto Egito. Em Tebas, uma guerra civil engolfou a cidade entre as forças de Pedubast I, que se havia proclamado Faraó e a linha existente de Takelot II/Osorkon. Essas duas facções disputaram o poder e o conflito só foi resolvido no 39º ano de Shoshenq III quando Osorkon derrotou completamente os seus inimigos, prosseguindo para fundar a Dinastia Egípcia Líbia Superior de Osorkon III – Takelot III – Rudamun; mas esse reino rapidamente fragmentou-se após a morte de Rudamun, com o surgimento de cidades estados locais sob reis como Peftjaubast de Herakleopolis, Nimblot de Hermopolis e Init em Tebas.
O reino núbio ao sul tirou vantagem dessa divisão e instabilidade política. O rei núbio Kashta, da dinastia Kushita (24ª Dinastia), já havia estendido a influência de seu reino sobre Tebas, quando obrigou Shepenupet, sacerdotisa de Amun e irmã de Takelot III, a adotar sua filha Amenirdis como sua sucessora. Então, 20 anos depois, em 732 AC, seu sucessor, Piye, marchou para o norte tomando Tebas e o Delta do Nilo, derrotando a força combinada de vários governantes egípcios nativos: Peftjaubast, Osorkon IV de Tanis, Iuput II de Leontopolis e Tefnakht de Sais. Com isso, Piye armou o cenário para a subsequente Vigésima Quinta Dinastia de faraós, que reuniu as “Duas Terras”, tornando o império do Vale do Nilo tão grande como havia sido no Reino Novo.
Piye estabeleceu a 25ª Dinastia e nomeou os governantes derrotados como seus governadores provinciais. Foi sucedido por seu irmão Shabaka e então por seus dois filhos Shebitku e Taharga. O império do Vale do Nilo reunido, da 25ª Dinastia foi tão grande quanto tinha sido desde o Reino Novo. Os faraós construíram e restauraram templos e monumentos por todo o vale, incluindo Memphis, Karnak, Kawa etc., numa espécie de renascimento do antigo Egito, trazendo de volta à sua glória, a religião, as artes e a arquitetura dos reinos Velho, Médio e Novo. Tal dinastia terminou com seus soberanos se retirando para seu lar espiritual em Napata, onde todos os faraós da 25ª Dinastia estão enterrados sob as primeiras pirâmides construídas desde o Reino Médio no Vale do Nilo. A dinastia de Napata acabou por conduzir ao Reino de Kush, que floresceu lá e em Meroe, pelo menos até o século II DC.
Napata e Meroe, então na
Núbia, hoje Sudão
Piye fez várias tentativas, sem sucesso, para estender a influência egípcia no Oriente Próximo, então controlado pela Assíria. Em 720 AC ele enviou um exército para apoiar uma rebelião contra a Assíria, que acontecia na Filisteia. Contudo, Piye foi derrotado por Sargão II e as rebeliões terminaram. Em 711 AC Piye novamente apoiou uma revolta contra os assírios, pelos israelitas, e foi novamente derrotado.
O prestígio internacional do Egito havia declinado consideravelmente por essa época, com seus aliados internacionais firmemente sob a esfera de influência da Assíria e pelo ano 700 AC restava saber quando seria a guerra entre os dois estados. Os assírios começaram a sua invasão do Egito sob o rei Esarhadon, sucessor de Senaqueribe, assassinado por seus próprios filhos, por ter destruído a revoltosa cidade da Babilônia. Em 674 AC, Taharga derrotou Esarhadon e o exército assírio, totalmente, em solo egípcio. Em 671 AC, Esarhadon expulsou os kushitas do norte do Egito de volta para a Núbia. Contudo, os governantes egípcios nativos instalados por Esarhadon não conseguiram reter o pleno controle de todo o país por muito tempo. Dois anos mais tarde Taharga voltou da Núbia e conseguiu o controle do sul do Egito, até Memphis. Esarhadon preparava-se para retornar ao Egito quando adoeceu e morreu em Nínive. Seu sucessor, Assurbanipal, enviou um general com um pequeno mas bem treinado exército que derrotou Taharga em Memphis e o expulsou novamente do Egito. Dois anos mais tarde Taharga morreu na Núbia. Seu sucessor, Tanutamun, também fez uma tentativa fracassada para recuperar o Egito para a Núbia. Derrotou Necho, o governante fantoche instalado por Assurbanípal, tomando Tebas. Os assírios enviaram então um grande exército para o sul que pôs Tanutamun em debandada de volta para a Núbia. A despeito do tamanho e poder do Egito, a Assíria possuía um suprimento maior de madeira, que lhe proporcionava o carvão necessário para a fundição do ferro de armamentos. Essa disparidade tornou-se crítica durante a invasão assíria do Egito em 670 AC. Em 664 AC os assírios lançaram o golpe mortal, saqueando Tebas e Memphis. O exército assírio saqueou Tebas de forma que ela nunca se recuperou e um governante nativo, Psamtik I, foi posto no trono como um vassalo de Assurbanipal e os núbios nunca mais foram ameaça.

III.9 – ÚLTIMO PERÍODO (664 – 332 AC)

O Último Período do Antigo Egito refere-se à última safra de soberanos nativos egípcios após o Terceiro Período Intermediário, da 26ª Dinastia das conquistas persas até a conquista por Alexandre, o Grande, e o estabelecimento do Reino Ptolomaico, de 664 a 332 AC. Embora estrangeiros tenham governado o país neste período, a cultura foi mais prevalente que nunca. Líbios e persas alternaram o poder com egípcios nativos, mas a convenção tradicional continuou nas artes. O Período é muitas vezes visto como o último intervalo de uma vez grande cultura, durante o qual o poder do Egito permanentemente decresceu.
O Alto Egito permaneceu, por algum tempo, sob a administração de Tanutamun enquanto o Baixo Egito foi governado, a partir de 664 AC, pela 26ª Dinastia, reis clientes estabelecidos pelos Assírios que, entretanto, trabalharam para conseguir a independência política do Egito durante a época conturbada do Império Assírio. Em 656 AC, Psamtik I ocupou Tebas e tornou-se faraó, o rei do Alto e Baixo Egito, trazendo crescente estabilidade ao país, num reino de 54 anos, da cidade de Sais, no Delta do Nilo. Psamtik e seus sucessores foram cuidadosos em manter relações pacíficas com a Assíria e a influência grega expandiu-se muito desde que a cidade de Naukratis, no delta do Nilo, tornou-se lar dos gregos. Quatro sucessivos reis saitas continuaram governando o Egito em outro período de prosperidade de 610 a 525 AC.
Em 609 AC Necho II foi à guerra contra a Babilônia, os caldeus, os medos e os citas, numa tentativa infrutífera de salvar a Assíria que, após uma brutal guerra civil, estava sendo assolada por esta coalizão de potências. Os egípcios haviam protelado muito a intervenção e Nínive já havia caído e o rei Sin-shar-ishkun morto quando Necho II enviou seus exércitos para o norte. Contudo, Necho varreu o exército israelita sob o rei Josias, mas logo perdeu batalha importante, junto com os assírios, em Harran, contra os babilônios, medos e citas.
Foi durante esta época que muitos judeus chegaram ao Egito, fugindo da destruição do Primeiro Templo em Jerusalém, pelos babilônios (586 AC). Necho II e Ashur-uballit II da Assíria foram finalmente derrotados na Arameia (Síria moderna), em 605 AC. Os egípcios permaneceram na área por algumas décadas, lutando com os reis babilônios Nabopolassar e Nabucodonosor II pelo controle de porções do antigo Império Assírio no Levante. Contudo, eram eventualmente empurrados de volta para o Egito, sendo que Nabucodonosor II chegou a invadir o Egito em 567 AC.
Infelizmente para esta Dinastia, um novo poder estava crescendo na Pérsia. O faraó Psamtik III havia sucedido a seu pai, Ahmose II, apenas seis meses antes, quando teve que enfrentar o Império Persa em Pelusium, numa batalha magnificamente recontada pelo historiador grego Heródoto. Os persas já haviam tomado a Babilônia e o Egito não seria páreo. Psamtik III foi derrotado e escapou para Memphis onde foi preso e depois executado, em Susa, na Pérsia (moderno Irã), a capital do rei persa Cambises, que então assumiu o título de faraó, fundando a 27ª Dinastia e deixando o Egito sob o controle de uma satrapia. Algumas revoltas exitosas contra os persas marcaram o quinto século AC, mas o Egito nunca derrotou os persas permanentemente.
Após a sua anexação à Pérsia, o Egito foi unido a Chipre e Fenícia (moderno Líbano) na sexta satrapia do Império Persa Aquemênida. O primeiro período do governo persa sobre o Egito (27ª Dinastia), terminou em 404 AC. A 28ª Dinastia foi constituída por um só rei, Amyrtaeus, príncipe de Sais, que se rebelou contra os persas. Não deixou monumentos com o seu nome e sua dinastia durou seis anos, de 404 a 398 AC. A 29ª Dinastia governou de Mendes, pelo período de 398 a 380 AC.
A 30ª Dinastia tomou sua forma de 26ª Dinastia e governou como a última casa real nativa do Egito dinástico, que terminou com o reinado de Nectanebo II, reinando de 380 AC até a sua derrota final em 343 AC para os persas, por uma breve restauração, algumas vezes chamada de Trigésima Primeira Dinastia; mas em seguida, em 332 AC, o mandatário persa Mazaces entregou o Egito a Alexandre, o Grande, sem luta.


[1] Amun (ou Amon) era uma deidade local de Tebas, reconhecido desde o Reino Antigo, junto com sua esposa Amaunet. Com a Décima Primeira Dinastia ele foi galgado à posição de deidade patrona de Tebas, em substituição a Monthu. Após a rebelião de Tebas contra os hicsos e o governo de Ahmose I, Amun adquiriu importância nacional expressa em sua fusão com o o deus Sol, Ra, como Amun-Ra.
[2] O complexo de templos de Karnak ou apenas Karnak, compreende um conjunto de ruínas de templos, capelas e outras construções, iniciadas durante o reinado de Senusret I, no Reino Médio e prosseguido no período Ptolemaico, embora a maior parte das construções existentes seja do Reino Novo. A área em torno de Karnak era o principal centro de adoração da Décima Oitava Dinastia da Tríade Tebana, com Amun como o seu deus principal, sendo parte da monumental cidade de Tebas.
[3] A Filisteia era uma pentápolis (conjunto de cinco cidades) na região sudoeste do Levante (mesma latitude do mar Morto, no Mar Mediterrâneo), compreendendo as cidades de Asquelom, Asdode, Ecrom, Gate, e Gaza, estabelecida por tribos migrantes (possivelmente os “Povos do Mar”, chamados filisteus, cerca de 1175 AC, com a derrota desses povos pelo faraó Ramsés III. A Filisteia esteve em permanente conflito e interação com os vizinhos egípcios, israelitas e canaanitas, gradualmente absorvendo sua cultura. Os filisteus foram finalmente conquistados e subjugados pelos israelitas e a Filisteia deixou de existir após a conquista assíria do Levante em 722 AC. Admite-se que a Filisteia (com os filisteus) foi a precursora dos termos helênico e romano Palestina (Phalaestine), e palestinos.

Continuação na próxima postagem: PARTE 05