Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

terça-feira, 24 de fevereiro de 2015

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: MESOPOTÂMIA (PARTE 11)

IV.10.6 – GOVERNO ASSÍRIO (911-620)

Esse assunto foi amplamente tratado no item “IV.9.4 - A NOVA ASSÍRIA (911–627 AC)” e por isso não vamos discuti-lo agora, novamente. Vamos apenas ratificar que durante este período, a Babilônia continuou existindo e lutando contra vários domínios, mas na maior parte do tempo contra o domínio assírio, com a fundação do Novo Império Assírio, em 911 AC. E lembrar que, em 622 AC, Sin-shar-ishkun assumiu como governante da Assíria e Babilônia e que foi durante o seu governo que o vasto império da Assíria começou a ruir.

IV.10.7 – O NOVO IMPÉRIO BABILÔNICO (ERA CALDEIA)

Como havíamos visto acima, quando tratando da Assíria, em 620 AC, Nabopolassar, das tribos caldeias do extremos sudeste da Mesopotâmia, tomou o controle de boa parte da Babilônia, com o apoio da maioria dos seus habitantes, com exceção da cidade de Nippur e algumas regiões ao norte que mostravam alguma lealdade ao rei assírio. A situação permaneceu indecisa por quatro anos, durante os quais um exército assírio na Babilônia tentava tirá-lo do poder e o rei assírio Sin-shar-ishkun sofria com constante revolta de seu próprio povo em Nínive. O impasse terminou em 616 AC com a aliança de Nabopolassar com os medos, persas, arameus, citas e cimérios, todos atingidos de alguma forma pelo poderio dos assírios. Após quatro anos de luta feroz, Nínive foi saqueada em 612 AC e seu rei assírio morto. A luta prosseguiu casa a casa e o último rei assírio Ashur-uballit II recebeu a proposta de prestar vassalagem aos babilônios, de acordo como que vimos na queda do Império Assírio durante a batalha final em Carchemish, em 605 AC, ocasião em que o trono do Império foi transferido para a Babilônia pela primeira vez desde Hammurabi, mais de mil anos antes.
Nabucodonosor II sucessor
de seu pai Nabopolassar
Nabopolassar foi seguido por seu filho Nabucodonosor II (605-562 AC), cujo reinado de 43 anos tornou a Babilônia, uma vez mais, a soberana da maioria do mundo civilizado, tomando conta de uma área considerável do prévio Império Assírio; as partes leste e norte foram tomadas pelos medos e o extremo norte pelos citas.
Logo os citas e os cimérios, antes aliados da Babilônia, sob Nabopolassar, tornaram-se uma ameaça e Nabucodonosor II foi forçado a marchar à Ásia Menor e dispersar suas forças, assim encerrando com a ameaça norte ao império.
Os egípcios tentaram permanecer no Oriente Médio, num esforço para restaurar a Assíria como um aliado seguro contra a Babilônia, medos e persas ou para criar o seu próprio império na região. Nabucodonosor II então lutou contra os egípcios expulsando-os para além do Sinai, sem conseguir toma-lo, como fizeram antes seus predecessores assírios, principalmente devido a uma série de rebeliões entre os judeus, fenícios e arameus do Levante e de Canaã. O rei babilônio esmagou essas rebeliões, depôs Jeoiaquim, rei de Judá, deportando uma parte significativa de sua população para a Babilônia (importante episódio do Antigo Testamento da Bíblia). Os estados fenícios de Tiro e Sidon também foram subjugados, bem como o estado arameu de Aram-Damascus e os árabes dos desertos ao sul das fronteiras com a Mesopotâmia.
Em 567 AC ele fez guerra contra o faraó Amasis e brevemente invadiu o Egito. Após garantir o seu império, o que incluiu seu casamento com uma princesa meda, ele devotou-se à manutenção do império e à execução de numerosos projetos arquitetônicos na Babilônia, entre eles, os fabulosos “Jardins Suspensos da Babilônia”.
Jardins Suspensos da Babilônia em concepção artística
(Século XIX?), sem comprovação arqueológica
Sucedeu-o no trono, Amel-Marduk, que reinou por apenas dois anos, tendo sido deposto e assassinado em 560 AC por seu sucessor Neriglissar, por ter-se conduzido impropriamente. Neriglissar, genro de Nabucodonosor II, também teve um reino curto (560-556 AC). Fez campanhas de sucesso contra Aram e Fenícia, mantendo governo babilônio nessas regiões. Morreu cedo e foi sucedido por seu filho Labashi-Marduk, ainda menino, em 556 AC. Este foi deposto e assassinado numa conspiração palaciana, no mesmo ano, armada pela mãe do seu sucessor Nabonidus.
Há muita documentação sobre Nabonidus, o último rei da Babilônia, filho da sacerdotisa assíria Adda-Guppi. Pelo menos por parte de mãe, ele não era nem caldeu, nem babilônio, mas, ironicamente, assírio.
Vários fatores conduziram à queda final da Babilônia. A população da Babilônia tornou-se inquieta e descontente com Nabonidus, por tentar centralizar a religião do Império no templo de Marduk, Babilônia, e enquanto ele tivesse assim alienado os sacerdotes locais, a classe militar também o desprezou por seus gostos antigos. Deixou a defesa do reino para seu filho Belshazzar (às vezes chamado Balthazar) - soldado capaz, mas um fraco diplomata, que alienou a elite política -, ocupando-se com os trabalhos mais adequados de escavar fundações de templos antigos e determinando as datas das suas construções. Passou também muito tempo fora da Babilônia reconstruindo prédios na cidade assíria de Harran, bem como com seus súditos árabes dos desertos do sul da Mesopotâmia. É também possível que a herança assíria de Nabonidus e seu filho pesassem contra eles. Finalmente, o poder militar da Mesopotâmia fora sempre concentrado na Assíria; sem esse poder para manter as forças estrangeiras em xeque, a Babilônia, sempre mais vulnerável à conquista e invasão do que a sua vizinha do norte, acabou ficando exposta.
Ciro II, libertador dos hebreus
Foi durante o sexto ano do reinado de Nabonidus (549 AC) que Ciro, o Grande (Ciro II), o persa Aquemênida, rei de Ansham, no Elam, revoltou-se contra seu suserano, Astyages, “Rei dos Mandas” ou medos, em Ecbatana. O exército de Astyages o traiu e Ciro estabeleceu-se nesta cidade, colocando um fim ao Império dos Medos e tornando a facção persa dominante entre os povos iranianos. Três anos mais tarde, Ciro tornou-se rei de toda a Pérsia e engajou-se numa campanha para abafar uma revolta entre os assírios. Em 539 AC, Ciro invadiu a Babilônia; os babilônios foram derrotados em Opis e, em seguida, em Sippar. Nabonidus fugiu para a Babilônia, de sua colônia na Arábia, onde se encontrava, e foi perseguido por Gobryas, general de Ciro. Dois dias após a captura de Sippar, os soldados de Ciro entraram em Babilônia, sem luta; Nabonidus foi arrastado do lugar onde se escondia e os serviços prosseguiram sem interrupção. Gobryas foi feito governador da província da Babilônia e poucos dias após Belshazzar foi morto em batalha.
Um dos primeiros atos de Ciro foi permitir que os judeus exilados retornassem aos seus lares levando consigo seus vasos sagrados do templo; essa permissão foi configurada numa proclamação pela qual o conquistador buscava justificar sua pretensão ao trono da Babilônia, como o legítimo sucessor dos antigos reis babilônicos e o vingador de Bel-Marduk.
A tribo caldeia havia perdido controle da Babilônia décadas antes do final da era que muitas vezes leva o seu nome e provavelmente se misturou à população geral; durante o Império Persa Aquemênida desapareceu como um povo distinto e o termo “caldeu” parou de referir-se a uma raça de homens, mas passou a referir-se apenas a uma classe social, sem considerações de etnia.

IV.10.8 – A BABILÔNIA PERSA

Portanto, a Babilônia foi absorvida pelo Império Aquemênida em 539 AC.
Dario I da Pérsia
Um ano antes de sua morte, em 529 AC, Ciro elevou seu filho Cambises II a rei da Babilônia, reservando para si próprio o título de “rei das outras províncias” do Império. Em 521 AC, Dario Hystaspis (Dario I) tomou o trono persa e governou-o como representante da religião Zoroastriana[1], que a velha tradição havia quebrado; com isso, a alegação da Babilônia de conferir legitimidade aos governantes da Ásia Ocidental deixou de ser reconhecida.
Imediatamente após Dario ter tomado a Pérsia, a Babilônia recuperou sua independência brevemente, através de um governante nativo, Nidinta-bel, que adotou o nome de Nabucodonosor III e reinou de 522 a 520 AC, quando Dario tomou a cidade de assalto. Poucos anos após, a Babilônia revoltou-se novamente sob o rei armênio Arakha; nesta ocasião, após sua captura pelos persas, as muralhas da cidade foram parcialmente destruídas, mas E-Sagilla, o grande templo de Bel, prosseguiu sob reparos como centro dos sentimentos religiosos babilônios.
Alexandre, o Grande, da Macedônia[2], conquistou a Babilônia em 333 AC, para os gregos e morreu em 323, deixando o caos na partilha do seu império. Babilônia e Assíria tornaram-se parte do Império Grego Selêucida, e a capital da Babilônia transferiu-se para a recém fundada Selêucida, embora a vida urbana aí tenha continuado até a idade Parta (150 AC a 226 DC) e a região um campo de batalha entre gregos e partas. Houve um breve interlúdio com a conquista romana sob Trajano (116 a 118 DC), após o qual os parta reassumiram o controle.
Embora a história continue, sempre interessante, a partir daí, já na era cristã, a região perde o seu interesse como berço da Civilização, nosso objetivo. Para concluir o Império da Babilônia, apenas apresentaremos algo sobre a sua cultura, ao longo de suas várias épocas.

IV.10.9 – A CULTURA BABILÔNICA

Da Idade do Bronze até o início da Idade do Ferro, a cultura mesopotâmica, em geral, é resumida como “Assírio-Babilônica, pela relação cultural próxima entre os dois centros políticos. O termo “Babilônia”, especialmente nos escritos dos anos 1900 DC, fora anteriormente utilizado para incluir a história antiga do sul da Mesopotâmia e não apenas referida à cidade-estado da Babilônia. Esse uso geográfico do nome “Babilônia” tem sido substituído pelo termo “Suméria”, mais preciso, em publicações recentes.
Na Babilônia, a abundância de argila e a carência de pedra fez com que os templos babilônios fossem estruturas maciças de tijolos grosseiros suportados por contrafortes equipados com drenos para a água da chuva; em Ur encontrou-se um desses drenos feito de chumbo. O uso de tijolos conduziu ao desenvolvimento precoce de colunas e pilastras, bem como de afrescos e telhas esmaltadas. As paredes eram brilhantemente coloridas e muitas vezes com zinco, ouro ou azulejos. Cones de terracota pintados, para tochas, eram também incrustadas no reboco. Na Babilônia, ao invés de baixo-relevo, fazia-se muito uso das figuras tridimensionais – os primeiros exemplos são as Estátuas de Gudea, realísticas, embora um tanto toscas. A escassez da pedra tornava precioso cada seixo, conduzindo a uma alta perfeição na arte do corte de gemas.
Tabletes de antes do Antigo Período Babilônio documentam a aplicação da matemática na variação da duração da luz solar ao longo do ano. Séculos de observação babilônia dos fenômenos celestes estão registrados nas séries de tabletes cuneiformes conhecidos como “Enuma Anu Enlil”. O mais antigo texto astronômico significativo lista a primeira e a última ascensão visíveis de Vênus para um período de 21 anos, sendo a mais antiga evidência de que os fenômenos de um planeta eram reconhecidos como periódicos. O mais antigo astrolábio[3] retangular é da Babilônia, cerca de 1100 AC. O MUL.APIN, título convencional dado a um compêndio que trata de diversos aspectos da astronomia e astrologia babilônica, contém catálogos de estrelas e constelações bem como esquemas para a previsão do surgimento e ocaso dos planetas, extensão da luz solar e outros dados.
Na área da medicina, os babilônios criaram a ciência médica da sintomatologia, com sua dupla característica de diagnose, que explica o passado e o presente, e o prognóstico, sugerindo o futuro. Os mais velhos textos babilônios de medicina datam da Primeira Dinastia Babilônia, segundo milênio AC. O mais extenso deles é o “Manual do Diagnóstico”, escrito pelo principal estudioso do assunto, Esagil-kin-apli, de Borsippa, durante o governo do rei Adad-apla-iddina (1069-1046 AC). Este texto inclui, além de outras coisas, uma lista de sintomas médicos e muitas vezes observações empíricas detalhadas com regras lógicas usadas para combinar sintomas observados em um paciente, com sua diagnose e prognóstico.
Na área da literatura, havia muitas bibliotecas e templos na maioria das cidades da Babilônia. Uma quantidade considerável da literatura babilônica foi traduzida dos originais sumérios. Vocabulários, gramáticas e traduções interlineares foram compiladas para uso dos estudantes, bem como comentários dos textos mais antigos e explicações sobre palavras e frases obscuras. Há muitos trabalhos literários babilônicos cujos títulos chegaram até nós. Um dos mais famosos destes foi o Épico de Gilgamesh, já mencionado anteriormente.
O breve ressurgimento de uma identidade babilônica, durante os séculos VII e VI AC, foi acompanhado por importantes desenvolvimentos culturais. Foi dessa época a invenção do zodíaco e a possibilidade de previsão das eclipses do sol e da lua pelos babilônios. A astronomia babilônica foi a base de tudo o que foi feito sobre astronomia grega, indo, sassânida, bizantina e síria, na antiguidade, bem como na islâmica medieval, asiática central e europeia ocidental. O desenvolvimento de métodos babilônicos de previsão do movimento dos planetas é considerado o maior episódio da história da astronomia. O único astrônomo babilônio a apoiar o modelo heliocêntrico de movimento dos planetas foi Seleucus de Selêucia (190 AC), conhecido pelos escritos de Plutarco, que afirma ter ele provado o sistema, embora não se saiba os argumentos que ele utilizou.
Os textos matemáticos da Babilônia são abundantes e bem editados. Cronologicamente, caem em dois grupos bem identificados: Primeira Dinastia Babilônica (1830-1531 AC) e Selêucida, dos últimos três ou quatro séculos AC. Com relação ao conteúdo não há praticamente diferença entre eles, tendo ficado praticamente estagnado por quase dois milênios. O sistema matemático da Babilônia era sexagesimal (de base 60), de onde derivou o uso atual de 60 segundos num minuto, 60 minutos em uma hora, 360 (60 x 6) graus num círculo etc... Entre os feitos matemáticos dos babilônios encontram-se a raiz quadrada de dois, correta até sete decimais, e o teorema de Pitágoras, bem antes de Pitágoras, como ficou evidenciado da tradução de um tablete datando de 1900 AC. Outros conhecimentos matemáticos, como cálculos de áreas e volumes, bem como do valor de π, foram apresentados quando falamos da Mesopotâmia, como um todo, e não vamos repetir aqui para não cansar o leitor.
As origens da filosofia babilônica podem ser rastreadas até a literatura erudita da Mesopotâmia, que envolvia certas filosofias de vida, particularmente ética, na forma de dialética, diálogos, poesia épica, folclore, hinos, prosa e provérbios. O raciocínio e a racionalidade da Babilônia se desenvolveram além da observação empírica. É possível que a filosofia babilônica tenha influenciado a filosofia grega, particularmente a helenística (período entre a morte de Alexandre, o Grande, em 323 AC, até a emergência do Império Romano, definido pela Batalha de Actium, em 31 AC). Sabe-se, por exemplo, que o filósofo Thales, de Mileto, estudou filosofia na Mesopotâmia.

Com isso, consideramos cumprido o nosso primeiro objetivo parcial desta enorme postagem, qual seja, a apresentação da primeira grande civilização da Terra, a Civilização da Região da Mesopotâmia. Na próxima edição, iniciaremos com o Egito.

[1] O Zoroastrianismo, também chamado Zaratustraismo, Mazdaismo ou Magianismo, é uma antiga religião monoteísta e uma filosofia religiosa, surgida na região oriental do antigo Império Persa, quando o filósofo religioso Zoroastro simplificou o panteão dos primitivos deuses iranianos em duas forças opostas: Spenta Mainyu (mentalidade progressiva) e Angra Mainyu (mentalidade destrutiva), sob o deus único Ahura Mazda (sabedoria que ilumina). Foi uma vez a religião do estado dos impérios Aquemênida, Parta e Sasano. As ideias de Zoroastro conduziram a uma religião formal cerca do século VI AC e influenciou religiões posteriors, incluindo o Judaísmo, Cristianismo e Islamismo.
[2] A Macedônia é uma região geográfica e histórica da Grécia, ao sul dos Balcãs. É a maior e segunda mais populosa região grega, dominada pelas montanhas no interior e pelas cidades portuárias da Tessalônica e Kavala na sua linha costeira, ao sul.
[3] O astrolábio é um instrumento elaborado, historicamente usado por astrônomos, navegadores e astrólogos e seus usos incluem a localização e a previsão das posições do Sol, Lua, planetas e estrelas, a determinação da hora local dada a latitude local e vice-versa, levantamentos, triangulação e a elaboração de horóscopos.

O trabalho prossegue com a CIVILIZAÇÃO EGÍPCIA (PARTE 1)

domingo, 15 de fevereiro de 2015

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: MESOPOTÂMIA (PARTE 10)

IV.10 – BABILÔNIA


Considerando tudo o que já vimos até agora sobre a região da Mesopotâmia, é importante lembrar agora que a Babilônia foi, antes de tudo, a mais famosa cidade da antiga Mesopotâmia, fundada algum tempo antes do reinado de Sargão, o Grande (2334-2279 AC), fundador do império Acadiano, que lá reivindicava ter construído templos (talvez tenha mesmo sido o fundador da cidade). Nessa época, parece ter sido uma cidade sem importância a não ser por um porto importante no rio Eufrates, no ponto em que mais se aproxima do rio Tigre (Ver figura abaixo). Suas ruínas permanecem hoje no moderno Iraque, cerca de 94 km a sudoeste de Bagdá e seu nome parece significar, no Acadiano da época, “Portão dos Deuses”.
Cidade da Babilônia, rapidamente fortificada século XIX AC
Seu nome já é citado no Antigo Testamento da Bíblia, capítulo 11 do Livro da Gênesis, onde é relatado o episódio da “Torre de Babel”. Além disso, a cidade tornou-se conhecidíssima por suas impressionantes muralhas e edificações, sua reputação como um pedestal de aprendizado e cultura, a constituição de um código de leis, que antecede a Lei Mosaica, e pelos Jardins Suspensos da Babilônia, terraços de fauna e flora com um sofisticado sistema hidráulico de irrigação, construídos pelo homem, citados por Heródoto como uma das “Sete Maravilhas do Mundo”. Entretanto, qualquer que tenha sido o papel representado pela cidade no mundo antigo, ele se perdeu para os estudiosos dos dias atuais, porque o nível das águas da região cresceu de forma permanente ao longo dos séculos e as ruínas da Antiga Babilônia se tornaram inacessíveis. As que foram escavadas e são visíveis hoje, datam apenas de bem mais do que mil anos após a sua fundação, que alguns dizem ter sido estabelecida pelos amoritas após o colapso da Terceira Dinastia de Ur. Essas e outras informações pertencentes à Antiga Babilônia nos chegam através de artefatos levados da cidade após a invasão Persa ou criados em outros locais. Mas este não é o foco principal do nosso trabalho O foco do nosso trabalho é a apresentação do Estado da Babilônia e do Império Babilônico, suas origens, desenvolvimento e declínio.
A Babilônia de que queremos falar foi um antigo estado semita de língua Acadiana e uma região cultural localizada ao centro e sul da Mesopotâmia, que emergiu como estado independente em 1894 AC, tendo a cidade da Babilônia como a sua capital. Esteve frequentemente em rivalidade com o estado vizinho Acadiano da Assíria, ao norte da Mesopotâmia, tornando-se a maior potência da região após Hammurabi (1792-1750 AC, pela Cronologia Média, ou 1696-1654 AC, pela Cronologia Curta[1]) ter criado um império – de curta duração - a partir de vários dos territórios antes pertencentes ao Império Acadiano. O estado cresceu e o sul da Mesopotâmia veio a ser conhecido como Babilônia. Após a morte de Hammurabi o império dissolveu-se rapidamente e a Babilônia teve longos períodos sob a dominação assíria, kassita e elamita. Após ser destruída e então reconstruída pelos assírios, a Babilônia tornou-se novamente o assento do Império Novo Babilônio, de 608 a 539 AC, fundado pelos caldeus, do canto sudeste da Mesopotâmia, e cujo último rei foi um assírio, do norte da Mesopotâmia. Após sua queda, a Babilônia ficou sob os governos dos Impérios Aquemênida, Selêucida, Parta, Romano e Sassânida. Vamos ver com mais detalhes todos esses períodos, Mas é preciso que os leitores entendam, que não vamos repetir aqui, em detalhe, o que já foi dito quando tratamos dos prévios impérios dominantes na Mesopotâmia (Sumérios, Acadianos e Assírios), a menos que seja essencialmente necessário para o bom entendimento do assunto como um todo; de outra forma estaríamos sendo repetitivos e, como tal, cansativos. Apenas não podemos esquecer que estamos falando de impérios que existiram numa mesma região – Mesopotâmia – às vezes simultaneamente, às vezes em épocas diferentes, e muitas vezes rivalizando entre si.

IV.10.1 – PRIMEIRA DINASTIA BABILÔNICA (1894–1595 AC)

Logo após o colapso da dinastia suméria Ur-III, nas mãos dos elamitas em 2002 AC, os amoritas, um povo estrangeiro semita do noroeste, de língua canaanita, migraram para o sul da Mesopotâmia e gradualmente ganharam controle sobre a maior parte desse território, formando uma série de pequenos reinos, aos quais os estados Sumero-Acadianos do sul não puderam resistir; enquanto isso, os assírios ratificavam sua independência no norte. Finalmente, o sul da Mesopotâmia acabou caindo para os amoritas – Período Amorita – e suas cidades-estados mais importantes eram Isin e Larsa, ao sul, e Assíria, ao norte. Uma dessas dinastias amoritas, através do chefe Sumuabum, que nunca se preocupou em ser rei da Babilônia, fundou um pequeno reino que incluía uma cidade ainda menor, Babilônia, em 1894 AC, que acabaria dominando os demais e formando o curto Primeiro Império Babilônico, também chamado Antigo Período Babilônico. Sumuabum foi seguido por outros chefes que governaram do mesmo modo, até a chegada de Sin-muballit, primeiro amorita a ser visto, oficialmente, como rei da Babilônia, que permaneceu, por um século, uma pequena nação, ofuscada por reinos vizinhos mais velhos, maiores e mais poderosos, como Isin, Larsa, Assíria e Elam.
Hammurabi (1792-1750 AC)
Tradicionalmente, o principal centro religioso de toda a Mesopotâmia foi Nippur, até que Hammurabi (1792-1750 AC), sexto governante amorita, realizou importantes construções na Babilônia, transformando-a de cidade pequena em uma grande cidade digna de um reino e novo centro religioso.
Hammurabi foi um governante muito eficiente, estabelecendo uma burocracia com taxação e governo centralizado. Libertou a Babilônia do domínio elamita, expulsando-os totalmente do sul da Mesopotâmia e, gradualmente, expandindo o seu domínio com a conquista de cidades e estados como Isin, Larsa, Eshunna, Kish, Lagash, Nippur, Borsippa, Ur, Uruk, Umma Adab e Eridu. Suas conquistas deram estabilidade à região, após tempos turbulentos, e uniu a confusão de estados do sul e centro da Mesopotâmia em uma só nação e somente ao seu tempo o sul da Mesopotâmia foi conhecido historicamente como Babilônia (ver figura abaixo). Seus exércitos eram disciplinados e Hammurabi lançou-os em direção ao leste, invadindo o que em mil anos se tornaria depois a Pérsia, conquistando elamitas, gutianos e kassitas. Para o oeste conquistou os estados semitas do Levante, incluindo o poderoso reino de Mari.
Babilônia ao tempo de Hammurabi, maior potência da região.
Hammurabi então enfrentou uma prolongada guerra contra o Antigo Império Assírio, pelo controle da Mesopotâmia e do Oriente Próximo e após uma luta sem solução, que se arrastou por décadas, contra o rei assírio Ishme-Dagan, forçou o seu sucessor, Mut-Ashkur, a pagar tributo à Babilônia, em 1751 AC, com controle sobre Hattian e Hurrian, colônias centenárias da Assíria, na Ásia Menor.
Um dos mais importantes trabalhos desta “Primeira Dinastia da Babilônia”, como foi chamada pelos historiadores nativos, foi a compilação de um código de leis que repetiu e melhorou as leis escritas anteriores da Suméria, Acádia e Assíria, realizada por determinação de Hammurabi após a expulsão dos elamitas e o estabelecimento do seu reino, que ficou eterna e mundialmente conhecido como “Código de Hammurabi”. Em 1901, uma cópia de tal código foi descoberta em uma estela, em Susa, para onde havia sido levada mais tarde como despojo; esta cópia está agora no Louvre.
Estela Código de Leis
Com a transferência do centro religioso de Nippur para a Babilônia, seu deus supremo, Enlil, perdeu o lugar no Panteão do sul da Mesopotâmia, para Marduk, deus do sul da região, com Ashur permanecendo a deidade dominante na Assíria, ao norte da Mesopotâmia.
Os babilônios, como seus predecessores estados Sumero-Acadianos, se dedicaram ao comércio regular com as cidades estados amoritas e canaanitas ao oeste, com seus funcionários ou tropas passando, de vez em quando, para o Levante e para Canaã e os mercadores amoritas operando livremente por toda a Mesopotâmia. As conexões de oeste, da monarquia babilônica, permaneceram fortes por muito tempo.

IV.10.2 – DECLÍNIO DA BABILÔNIA

O sul da Mesopotâmia não possuía fronteiras naturais defensáveis, ficando assim vulnerável aos ataques estrangeiros. Com a morte de Hammurabi, seu império começou a desintegrar-se rapidamente e já com seu sucessor, Samsu-iluna (1749-1712 AC), o extremo sul da Mesopotâmia foi perdido para um rei nativo Acadiano chamado Ilum-ma-ili, que formou a “Dinastia das Terras do Mar”[2], permanecendo independente da Babilônia pelos 272 anos seguintes.
Os babilônios e seus governantes amoritas foram então expulsos da Assíria, ao norte, por um governante assírio-Acadiano de nome Puzur-Sin em 1740 AC. Após uma década de guerra civil na Assíria, o rei nativo Adasi tomou o poder em 1730 AC, apropriando-se de um território anteriormente babilônio na Mesopotâmia Central.
O governo amorita sobreviveu num império muito reduzido, com vãs tentativas de recuperação das terras que possuía ao tempo de Hammurabi, acabando por contentar-se com pacíficos projetos de construção na própria Babilônia. Samsu-Ditana foi o último governante amorita da Babilônia, inicialmente sofrendo pressão dos Kassitas das montanhas do noroeste do Irã e então tendo a própria Babilônia atacada pelo Império Hitita baseado na Ásia Menor, em 1595 AC, sendo sacado do poder pelo rei hitita Mursili I, após o “Saque da Babilônia”, no mesmo ano. Os hititas não permaneceram por muito tempo, mas a destruição por eles causada finalmente permitiu aos kassitas ganharem o controle.

IV.10.3 – DINASTIA KASSITA (1595-1155 AC)

A Dinastia Kassita foi fundada por Gandash, de Mari. Os governantes kassitas, como os amoritas que os precederam, não eram nativos da Mesopotâmia, mas originários das Montanhas Zagros. Os kassitas renomearam a Babilônia, “Kar-Duniash” e seu governo durou 576 anos, a mais longa dinastia da história da Babilônia. Contudo, a Babilônia continuou sendo a capital do reino e uma das cidades “santas” da Ásia ocidental, onde os sacerdotes da religião mesopotâmica eram todo-poderosos, e o único lugar onde o direito de herança do curto Antigo Império Babilônico poderia ser conferido. A Babilônia experimentou curtos períodos de poder, mas, em geral, provou ser relativamente fraca sob o longo domínio dos kassitas, tendo muitos períodos sob dominação e interferência dos assírios e elamitas.
Agum I tomou o trono para os kassitas em 1595 AC e governou um estado que se estendia do Irã ao médio Eufrates, mantendo relações pacíficas com a Assíria mas vencendo guerra contra o Império Hitita da Ásia Menor, reconquistando deles a sagrada estátua de Marduk, 24 anos em seu poder e igualando-o à deidade kassita Shugamuna.
Os governantes kassitas sucederam-se sem acontecimentos mais significativos, sempre reatando laços de amizade com a Assíria e o Egito e tentando tomar a “Dinastia das Terras do Mar”, sem sucesso, até que Agum II conquistou o extremo sul da Mesopotâmia para a Babilônia, destruindo a sua capital.
Novamente um período de paz relativa com os governos preservando a paz com os assírios, egípcios e hititas, mas sempre tentando agora a conquista do Elam, obtida com Kurigalzu III, que saqueou a capital Susa e lá colocou um governante fantoche no trono elamita. Tal política prosseguiu com seu sucessor Kadashman-Enlil (1374-1360 AC) e os demais até que o usurpador Nazi-Bugash depôs Kara-hardash, enraivecendo Ashur-uballit I, rei da Assíria que invadiu e saqueou a Babilônia, matou o usurpador, anexou o território babilônico ao Médio Império Assírio e instalou Kurigalzu II (1345-1324 AC) como seu governante vassalo.
Este rei e vários de seus sucessores, aliados com outros povos, tentaram, sem sucesso, restabelecer o poder da Babilônia, perdendo ainda mais territórios para a expansão assíria. Até que o reino de Kashtiliash IV encerrou catastroficamente quando o rei assírio Tukulti-Ninurta I invadiu, saqueou e queimou a Babilônia, estabelecendo-se como rei e tornando-se, ironicamente, o primeiro mesopotâmio nativo a governar o estado, como mencionado anteriormente.
A Babilônia não se recuperou até o final do reinado de Adad-shuma-usur (1216-1189 AC), já que ele permaneceu como vassalo da Assíria até 1193 AC e conseguiu evitar que o rei assírio Enlil-kudurri-usur retomasse a Babilônia, a não ser por uma pequena área da região norte.
Seguiu-se um breve período de paz e a guerra ressurgiu com Marduk-apla-iddina (1171-1159 AC), quando Ashur-Dan da Assíria conquistou regiões adicionais ao norte da Babilônia e o governante elamita Shutruk-Nahhunte conquistou a maior parte da Babilônia leste. Enlil-nadin-ahhe (1157-1155 AC) foi finalmente deposto e a dinastia Kassita terminou quando Ashur-Dan conquistou ainda mais do norte e centro da Babilônia e o rei elamita Shutruk-Nahhunte penetrou no coração da Babilônia, saqueando a cidade e assassinando o rei.
A despeito da perda de território, fraqueza militar e evidente redução na cultura, a Dinastia Kassita foi a mais longa da Babilônia, durando até 1157 AC, quando a Babilônia foi conquistada pelo elamita Shutruk-Nahhunte e reconquistada poucos anos após pelo nativo Acadiano-babilônio Nabucodonosor I.

IV.10.4 – SEGUNDA DINASTIA DE ISIN (1155-1026 AC)

Os elamitas não permaneceram no controle da Babilônia por longo tempo e Marduk-kabit-ahheshu (1155-1139 AC) estabeleceu a Segunda Dinastia de Isin, primeira dinastia de língua Acádiaiana ao sul da Mesopotâmia a governar a Babilônia, que deveria permanecer no poder por 125 anos. O novo rei depôs os elamitas e evitou qualquer possível retorno kassita. Mais tarde ele entrou em guerra contra a Assíria, com alguns sucessos iniciais, brevemente capturando a cidade de Ekallatum antes de ser derrotado pelo rei assírio Ashur-Dan I.
Alguns reis dessa dinastia se sucederam com dois objetivos: sempre repelir as novas tentativas dos elamitas e tentar tomar a Assíria, sem sucesso.
Nabucodonosor I
Nabucodonosor I (1124-1103 AC) foi o mais famoso governante desta dinastia. Lutou contra, derrotou e expulsou os elamitas, do território da Babilônia, invadiu o Elam saqueando sua capital Susa e recuperou a estátua sagrada de Marduk que havia sido retirada da Babilônia. Logo em seguida, o rei do Elam foi assassinado e seu reino desintegrado por guerras civis. Falhou em estender o território da Babilônia, sendo derrotado várias vezes por Ashur-resh-eshi, rei dos assírios, pelo controle dos territórios anteriormente controlados pelos hititas na Aramea. Nos últimos dias do seu reinado, devotou-se a pacíficos projetos de construção e a garantir as fronteiras da Babilônia.
Dois de seus filhos o sucederam e outros após eles, que não tiveram qualquer sucesso e apenas viram o território da Babilônia encolher cada vez mais por guerras sucessivas contra a Assíria e repetidas invasões por outros povos, até que grandes áreas da Babilônia foram apropriadas e ocupadas por arameus (grande parte do interior e leste e central Babilônia), caldeus (sudeste da Babilônia) e suteus (desertos do oeste).

IV.10.5 – PERÍODO DE CAOS (1026-911 AC)

A dinastia nativa, então governada por Nabu-shum-libur, foi deposta por saqueadores arameus em 1026 AC e o coração da Babilônia, incluindo a capital, caiu em estado anárquico e por 20 anos nenhum rei governou a Babilônia, criando-se no sul da Mesopotâmia, um estado separado da Babilônia governado por Simbar-shipak, líder de uma clã kassita. Tal estado de anarquia permitiu que o governante assírio, Ashur-nirari, invadisse e capturasse a cidade babilônia de Atlila e algumas regiões ao norte, em 1018 AC. Essa dinastia foi então substituída por outra dinastia kassita (Dinastia VI, 1003-984 AC) que parece ter recuperado o controle sobre a Babilônia. Os elamitas depuseram essa breve recuperação com o rei Mar-biti-apla-usur, fundando a Dinastia VII (984-977 AC). Contudo, também essa dinastia caiu e os arameus mais uma vez ganharam a Babilônia.
O governo nativo foi restaurado com Nabu-mukin-apli, em 977 AC, introduzindo a Dinastia VIII. A Dinastia IX começou em 941 AC com Ninurta-kudurri-usur II. A Babilônia permaneceu fraca durante esse período, com áreas inteiras agora sob firme controle caldeu, arameu e suteu com seus governantes muitas vezes se curvando à pressão da Assíria e Elam, que haviam se apropriado de território babilônio.

[1] A Cronologia Curta é uma das cronologias da Idade do Bronze e do início da Idade do Ferro para o Oriente Próximo, que fixa o reino de Hammurabi em 1728-1686 AC e o saque da Babilônia em 1531 AC. As datas absolutas do Segundo Milênio AC, resultantes dessa decisão, têm muito pouco apoio entre os estudiosos, particularmente após recente pesquisa. A Cronologia Média, que fixa o reino de Hammurabi entre 1792 e 1752 AC, é ainda muito encontrada na literatura e trabalhos mais recentes têm desaprovado a Cronologia Curta. Para a maior parte do período em questão, as datas da Cronologia Média podem ser obtidas adicionando-se 64 anos às datas correspondentes à Cronologia Curta. Após a “Idade das Trevas” da Antiguidade, entre a queda da Babilônia e a ascensão da dinastia Kassita na Babilônia, as datas absolutas tornam-se menos incertas. Da Terceira Dinastia Babilônica para frente, a dicotomia de 64 anos entre a média e a curta cronologia não se aplica mais.
[2] As fontes consultadas, em língua inglêsa, falam de “Sealand Dinasty”, e daí a nossa tradução, possivelmente pelo fato de que esse rei e seu povo habitaram, inicialmente, a província com esse nome, situada numa região pantanosa e desolada ao sul da Mesopotâmia, que rapidamente se expandiu em direção ao sul, com o assoreamento das fozes dos rios Tigre e Eufrates.

Na próxima postagem, última parte da Mesopotâmia: Parte 11

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: MESOPOTÂMIA (PARTE 09)



IV.9.3 – O MÉDIO IMPÉRIO ASSÍRIO (1392-1056 AC)

Os estudiosos datam o início do Médio Império Assírio, ou da queda de Eriba-Adad I, do Antigo Reino Assírio, ou da ascensão de Ashur-uballit I ao trono da Assíria.
Conforme vimos, a influência Mitanni sobre a Assíria estava em decadência, nesta época. Eriba-Adad I envolveu-se numa batalha dinástica entre Tushratta e seu irmão Artatama II e depois seu filho, Shuttarna II, que se proclamava rei de Hurri, enquanto buscando apoio dos assírios. Uma facção pró assíria surgiu na corte real de Mitanni e com isso Eriba-Adad I quebrou a influência Mitanni sobre a Assíria que, por sua vez, passou a exercer influência sobre as relações Mitanni.
Ashur-Uballit I (1365-1330 AC) sucedeu no trono da Assíria e provou ser um governante feroz, ambicioso e poderoso. A pressão assíria pelo sudeste e a hitita, do noroeste, permitiu a Ashur-Uballit I quebrar o poder Mitanni, quando encontrou e derrotou em batalha, decisivamente, Shuttarna II, o rei Mitanni, tornando novamente a Assíria uma potência imperial, não apenas às suas custas, mas também à dos Kassitas Babilônios, Hurrianos e Hittitas. O casamento do rei Kassita da Babilônia, com a filha de Ashur-uballit I foi desastroso para a Babilônia, pois a facção kassita na corte assassinou o rei assírio babilônio, colocando um pretendente no trono. Ashur-Uballit I prontamente invadiu a Babilônia, para vingar seu genro, depondo o rei e instalando no trono Kurigalzu II, da linhagem real. A seguir, Ashur-Uballit I atacou e derrotou Mattiwaza, o rei Mitanni, a despeito do apoio de Suppiluliumas, rei hittita, já temeroso do crescente poder assírio.
A este, seguiram-se vários reis que só fizeram consolidar e ampliar o poder e o território assírio, transformando a Assíria num poderoso império que ameaçava os interesses dos dois outros grandes impérios, Egípcios e Hittitas, na região, provocando a paz entre essas duas nações.
Tukulti-Ninurta I (1244-1207 AC) teve uma grande vitória contra os hititas e seu rei Tudhaliya IV, na Batalha de Nihriya, fazendo milhares de prisioneiros; após isso conquistou a Babilônia tomando seu rei, Kashtiliash IV, como cativo, e reinando lá mesmo por sete anos, com o antigo título de “Rei da Suméria e Acádia”, antes usado por Sargão de Acádia. Com isso, tornou-se o primeiro nativo da Mesopotâmia falando Acadiano a governar o estado da Babilônia, já que seus fundadores haviam sido Amoritas, sucedidos por Kassitas também estrangeiros. No processo da conquista, ele derrotou também os Elamitas, que cobiçavam a Babilônia. Quando as relações com o clero começaram a se deteriorar em Ashur, Tukulti-Ninurta I construiu uma nova cidade capital, Kar-Tukulti-Ninurta Segundo vários estudiosos, Tukulti-Ninurta I e seus feitos seriam identificados com o personagem bíblico Nimrod, do Velho Testamento.
Esse rei foi assassinado por seus filhos rebeldes que deixaram o governo do império nas mãos dos governadores regionais e com isso a Assíria passou por mais um período de instabilidade, rachada por disputas internas, embora não fosse ameaçada por potências estrangeiras durante vários reis que se seguiram.
Tiglath-Pileser I (115-1077 AC) compete, entre os historiadores, com Shamshi-Adad I e Ashur-uballit I como o fundador do primeiro Império Assírio; de qualquer forma ele tornou-se um dos maiores conquistadores assírios durante o seu reinado de 38 anos.
Os reis que o sucederam, incluindo Ashur-bel-kala (1073-1056 AC), mantiveram o vasto império unido, sempre mantendo embates contra a Babilônia, mas em geral mantendo-a como cidade vassala. Posteriormente, em seu reinado, o Médio Império Assírio explodiu em guerra civil, permitindo que hordas de arameus[1] tirassem vantagem da situação, pressionando contra territórios controlados pela Assíria a oeste. Ao final do seu reinado, muitas das áreas da Síria e Fenícia – Canaã, até o mar Mediterrâneo, antes sob seu firme controle, estavam fora do Império Assírio.
O período de 1200 a 900 AC foi a idade das trevas para todo o Oriente Médio, Norte da África, Cáucaso, Mediterrâneo e Balcãs, por força de muitas revoltas e movimentos de massa de povos. Por cerca de 150 anos o império da Assíria resistiu a esses eventos tumultuosos, mas com a morte de Ashur-bel-kala, em 1056 AC, entrou em relativo declínio por cerca de 100 anos. O império encolheu significativamente de forma que em torno de 1020 AC parece ter controlado apenas áreas próximas da própria Assíria, essenciais para manter as rotas de comércio abertas na Síria oriental, sudeste da Ásia Menor, Mesopotâmia Central e noroeste do Irã.
Povos semitas, como Arameus, Caldeus[2] e Suteus[3], mudaram-se para áreas a oeste e sul da Assíria, invadindo muito da Babilônia ao sul; povos iranianos de língua indo-europeia, como os medos[4], persas e partas, mudaram-se para as terras a leste da Assíria, deslocando os nativos gutianos e pressionando Elam e Mannea[5] (ambas civilizações não indo-europeias do Irã); ao norte os frígios[6] perturbaram os hititas; um novo estado hurriano, Urartu, surgiu no Cáucaso; cimérios[7], georgianos e citas[8] surgiram em torno do Mar Negro; o Egito estava dividido e desordenado; e os israelitas batalhando contra povos semitas e não semitas canaanitas pelo controle do sul de Canaã.
A despeito da aparente fraqueza da Assíria em comparação ao seu poder anterior, ela permaneceu como uma nação sólida e bem defendida, com os melhores guerreiros do mundo, uma monarquia estável, exército poderoso e fronteiras seguras, mantendo uma posição mais forte, nesta época, que seus potenciais rivais Egito, Babilônia, Elam, Frígia, Urartu e Pérsia. Os reis assírios deste período adotaram a política de manter e defender uma nação compacta e segura, bem como colônias satélites em torno, intercaladas com ataques e invasões punitivos esporádicos em territórios vizinhos, conforme necessários.
Durante esse período, os reis se sucederam até que Ashur-Dan II (935 – 912 AC) deflagrou uma marcante virada econômica e organizacional nos destinos da Assíria, para novamente forjar o império. Realizou ataques punitivos vitoriosos além das fronteiras da Assíria para livrar dos arameus e outros povos tribais as regiões vizinhas, em todas as direções. Concentrou-se na reconstrução da Assíria dentro de suas fronteiras naturais, construiu escritórios governamentais em todas as províncias e criou um auxílio econômico importante fornecendo arados para toda a terra que produziram uma produção recorde de grãos.

IV.9.4 - A NOVA ASSÍRIA (911–627 AC)

Quando a antiga Idade das Trevas finalmente encerrou, o mundo havia mudado dramaticamente. Reinos antigos como Assíria, Babilônia, Elam e Egito, ainda resistiam, assim como os hititas sob a forma de estados menores Novo-Hititas. Vários novos estados tinham surgido durante os tempos tumultuados entre 1200 e 936 AC, tais como: Pérsia, Media, Partia, Mannea, Israel, Urartu, Frígia Lídia, os estados arameu e fenício, do Levante, e outros. Além disso, outras nações e povos, como a Caldeia, Judá, Ciméria, Etiópia, Armênia e os árabes, deveriam emergir nos séculos seguintes. Contudo, foi antigo estado da Assíria que enfrentou e derrotou estes novos povos, junto com velhos inimigos, durante os três séculos seguintes.
O início do reerguimento e da reconquista do império assírio iniciou com as campanhas de Adad-nirari (911-892 AC) e prosseguiu com vários reis que não conheceram insucessos: Tukulti-Ninurta II (891–884 AC); Ashurnasirpal II (883–859 AC), governante cruel e feroz que avançou, sem oposição, por Aram e Canaã e Ásia Menor, até o Mediterrâneo; Shalmaneser III (858–823 AC), atacou e reduziu à vassalagem a Babilônia, derrotando Aramea[9], Israel, Urartu, Fenícia, estados Novo-Hititas e os árabes da Península Arábica; Shamshi-Adad V (822-811 AC); Adad-nirari III (810-782 AC), que sendo ainda menino viu o império ser governado por sua mãe, a famosa rainha Semíramis (Shammuramat), até o ano 806 AC, quando ocupou o trono, invadindo o Levante e subjugando todos os seus povos; Shalmaneser IV (782-773 AC); Ashur-dan III (772-755 AC); Ashur-nirari V (754-745 AC); Tiglath-Pileser (745-727 AC) renovou a expansão assíria, subjugando Urartu, Pérsia, Media, Babilônia, Arábia, Fenícia, Israel, Judá, Samaria, Caldeia, Chipre, Moab, Edom e os Novo-Hititas, declarando-se rei na Babilônia, numa época em que o Império Assírio se espalhava das montanhas do Cáucaso à Arábia e do Mar Cáspio a Chipre, com a primeira força profissional de luta da história; Shalmaneser V (726-723 AC), mencionado na Bíblia como tendo conquistado os Samaritanos e sido responsável pela deportação das Dez Tribos Perdidas de Israel para a Assíria; Sargão II (722-705 AC) além de manter o império, conquistou várias regiões e submeteu vários reinos ao pagamento de tribute, incluindo Babilônia, Aram, Fenícia, Israel, Arábia, Chipre e a Frígia, do famoso rei Midas; Sennacherib (701-681 AC) derrotou os gregos, e egípcios governados pelos núbios então no Oriente Médio, onde o faraó núbio Taharga fomentava revolta contra os assírios; seu palácio e jardim em Nínive foram propostos como modelo dos “Jardins Suspensos da Babilônia”, uma das “Sete Maravilhas do Mundo Antigo”; Esarhaddon (680-669 AC) expandiu ainda mais a Assíria até as montanhas do Cáucaso, ao norte e, cansado da interferência egípcia no Império Assírio, decidiu conquistar o Egito, atravessando o deserto do Sinai, tomando de surpresa o país e destruindo o estrangeiro Império Kushita no processo; reconstruiu completamente a Babilônia e trouxe paz à Mesopotâmia como um todo, mantendo babilônios, egípcios, elamitas, cimérios, persas, medas, caldeus, israelitas e fenícios, mantendo seguro o império da Assíria; Assurbanipal (669-627 AC) ampliou a dominação assíria, das montanhas do Cáucaso, no norte, à Núbia, Egito e Arábia no sul; e do Chipre e Antióquia no oeste, à Pérsia, no leste, era inusitadamente culto para o seu tempo, falando Acadiano, aramaico e sumério, com grande conhecimento de astronomia e matemática, bem como da arte militar, civil e política; construiu a famosa Biblioteca de Assurbanipal, primeira a classificar as obras por ordem de gênero.
Império da Assíria no seu auge, sob Assurbanipal

Após esmagar a revolta babilônia, Assurbanipal surgiu como chefe supremo: para o leste, o Elam devastado se prostrava à Assíria, a Mannea, persas iranianos e medos eram vassalos; ao sul, a Babilônia era ocupada, os caldeus, árabes, Sutu e os nabateanos[10], subjugados, o império núbio destruído e o Egito pagava tributo; ao norte, os citas e cimérios haviam sido vencidos e expulsos do território assírio, Urartu, Frígia, e os novo-hititas pagavam vassalagem e a Lídia rogava por proteção assíria; ao oeste, Aramea, os fenícios, Israel, Judá, Samaria e Chipre estavam subjugados e os habitantes helenizados de Caria[11], Cilícia[12], Capadócia[13] e Comagene[14] pagavam tributo à Assíria. No pico do seu império, a Assíria de Assurbanipal abarcava as modernas nações do Iraque, Síria, Egito, Líbano, Israel, Jordânia, Kuwait, Bahrain, Palestina e Chipre, junto com grandes parcelas do Irã, Arábia Saudita, Turquia, Sudão, Líbia, Armênia, Geórgia e Azerbaijão, mais forte do que jamais fora.
Contudo, as longas batalhas contra Babilônia, Elam e seus aliados, além da permanente campanha de mais de três séculos para controlar e expandir seu vasto império em todas as direções, exauriu a Assíria. Ela havia sido drenada de riquezas e capacidade de trabalho humano, as províncias devastadas nada podiam produzir para suprir as necessidades do erário público imperial, era difícil encontrar tropas suficientes para guarnecer o imenso império e, após a morte de Assurbanipal, uma severa agitação civil eclodiu na Assíria e o império começou a desintegrar-se.

IV.9.5 - A QUEDA DA ASSÍRIA (626–605 AC)



A decadência da Assíria iniciou-se após a morte de Assurbanipal, com várias guerras civis envolvendo três reis rivais e o afastamento do Egito da 26ª Dinastia, instalada pelos assírios como vassalos.

Ashur-etil-ilani subiu ao trono em 626 AC e foi imediatamente envolvido por guerras civis internas, sendo deposto em 623 AC após quatro anos de luta com Sin-shumur-lishir, um general assírio, que também ocupou e reivindicou o trono da Babilônia naquele ano. Este, por sua vez, foi deposto como governante da Assíria e Babilônia após um ano de guerra contra Sin-shar-ishkun (622-612 AC) que também enfrentou violenta rebelião na Assíria, revolução total na Babilônia e a cessação do pagamento de tributos de muitas colônias assírias a oeste, leste e norte, principalmente medos, persas, citas, cimérios, caldeus e arameus que, além disso, passaram a atacar colônias assírias, o Levante, Israel, Judá e mesmo as costas do Egito.
Os povos do Irã (medos, persas e partas) também tiraram vantagem dos levantes na Assíria para unir-se numa força poderosa, dominada por medos, que destruiu vários reinos vassalos da Assíria. Aramea, Fenícia e sul de Canaã readquiriram sua independência, assim como as colônias assírias da Ásia Menor e do leste do Mediterrâneo. Da mesma forma armênios, sármatas e georgianos começaram também a se estabelecer em algumas partes do Cáucaso.
Cerca de 620 AC, Nabopolassar, um desconhecido das tribos caldeias que se haviam estabelecido no extremo sudeste da Mesopotâmia cerca de 900 AC, reivindicou a cidade de Babilônia e faixas do império. Sin-shar-ishkun reuniu um grande exército para expulsar Nabopolassar da Babilônia; contudo, outra grande revolta explodiu na própria Assíria, forçando o retorno da maior parte do seu exército que prontamente se uniu aos rebeldes em Níneve e foram quatro anos de luta em duas frentes. Nabopolassar conseguiu então uma boa aliança com o rei medo Cyaxares, o Grande, que aproveitando os levantes na Assíria havia libertado os povos iranianos, unindo os medos iranianos, persas e partas, com os citas e cimérios; juntos atacaram a Assíria em 616 AC e após quatro anos de lutas Níneve foi finalmente saqueada em 616 AC e Sin-shar-ishkun foi morto defendendo a sua capital.
Ashur-uballit II tomou o trono e persistiu na resistência de Níneve, recusando uma oferta de vassalagem a Nabopolassar, Cyaxares e seus aliados e conseguindo uma fuga para a cidade Assíria de Harran, ao norte que tomou como a nova capital do reino. Conseguiu mantê-la por cinco anos após o que também Harran caiu em 608 AC. O Egito que funcionava como colônia assíria veio em seu auxílio com medo de cair também, sem a proteção da Assíria. Ashur-uballit II e Necho, do Egito, fizeram uma tentativa frustrada de recapturar Harran em 608 AC e durante os três anos seguintes tentaram em vão expulsar os invasores. Em 605, na batalha de Carchemish, os babilônios e medos derrotaram os assírios e egípcios, trazendo um fim à Assíria como entidade política independente – embora ainda tentassem algumas rebeliões importantes contra o Império Aquemênida em 546 e 520 AC -, permanecendo como uma região geopolítica e província colonizada até o século VII DC. O destino de Ashur-uballit II é desconhecido, podendo ter sucumbido na batalha de Carshemish ou simplesmente desaparecido na obscuridade.

IV.9.6 – RELIGIÃO ASSÍRIA

Os assírios, como os demais povos mesopotâmicos, seguiram a religião sumério-Acádiaiana da Mesopotâmia, com o deus Ashur como líder do panteão. Essa religião sobreviveu na Assíria, de 3500 AC até o seu gradual declínio em face do Cristianismo entre os séculos I e X DC. Havia vários outros deuses no panteão, os principais sendo: Anu, Baal, Ea, Enlil, Ishtar, Shamash, Tammuz, Adad/Hadad, Sin, Dagan, Ninurta, Nisroch, Ninlil e El.
A religião nativa ainda foi fortemente seguida até o século IV DC e sobreviveu oculta pelo menos até o século X DC, embora os assírios tenham iniciado a adotar a cristandade do rito oriental (bem como, por um tempo, o maniqueísmo e o gnosticismo que, como a literatura siríaca, teve o seu berço na Assíria entre os séculos I e III DC. Hoje os assírios são exclusivamente cristãos com a maioria seguindo a Igreja Assíria do Oriente, Igreja Católica Caldeia, Antiga Igreja do Oriente e a Igreja Ortodoxa Siríaca.

IV.9.7 – LÍNGUA NA ASSÍRIA

Conforme já tivemos oportunidade de comentar, na Mesopotâmia como um todo, durante o terceiro milênio AC, difundiu-se entre sumérios e Acadianos um bilinguismo, com permanente influência de um sobre o outro. Vimos também que o Acadiano substituiu, gradualmente, o sumério, embora este permanecesse como língua sagrada, cerimonial, literária e científica até o primeiro século DC.
Em tempos muito antigos, os assírios falavam um dialeto da língua Acadiana, um ramo oriental das línguas semitas, chamada de “Velho Assírio”, em que surgiram as primeiras inscrições. No período Novo Assírio, o aramaico tornou-se crescentemente comum, até mais do que o Acadiano, devido às deportações em massa, para a Assíria, de povos de língua aramaica conquistados pelos assírios, que com eles frequentemente cruzavam. Os antigos assírios também usavam a língua suméria em sua literatura e liturgia, embora de forma mais limitada nos períodos Médio e Novo Assírios, quando o Acadiano tornou-se a língua principal.
A destruição das capitais assírias de Níneve e Assur pelos babilônios, medos e seus aliados, garantiu que quase toda a elite bilíngue desaparecesse. Pelo século VII AC muito da população assíria que usava o Acadiano influenciou o aramaico oriental e não o próprio Acadiano. As últimas inscrições Acadianas na Mesopotâmia datam do século I DC. Contudo, dialetos orientais aramaicos, bem como nomes próprios e sobrenomes Acadianos e aramaicos mesopotâmios sobrevivem até hoje entre os assírios nas regiões do norte do Iraque, sudeste da Turquia, noroeste do Irã e nordeste da Síria, que constituíam a antiga Assíria.

IV.9.8 – ARTES E CIÊNCIAS

Lamassu: colossal estátua de leão alado
A arte assíria preservada até hoje data, predominantemente do período Novo Assírio. Arte descrevendo cenas de guerras e, ocasionalmente, a empalação de uma vila inteira com detalhes sangrentos, pretendiam mostrar o poder do imperador, servindo como propaganda. Tais relevos em pedra decoravam as paredes dos palácios reais onde estrangeiros eram recebidos pelo rei. Outros relevos mostravam o rei com diferentes deidades conduzindo cerimônias religiosas. Muitos desses relevos foram descobertos em palácios reais em Nimrud e Khorsabad. Uma rara descoberta de chapas de metal pertencendo a portas de madeira foi feita em Balawat. A escultura assíria atingiu um alto nível de refinamento no período Novo Assírio cujo proeminente exemplo é o touro ou leão com asas de águia e cabeça humana, conhecido como lamassu (feminino) ou shedu (masculino), deidade protetiva que guardava as entradas do paço real com o objetivo de afastar o mal. Eram propositalmente feitos com cinco patas de forma a mostrar sempre quatro, quer fosse visto de frente ou de perfil.
Embora trabalhos de pedras e metais preciosos não tenham sobrevivido ao tempo, algumas finas peças de joalheria foram encontradas em tumbas reais em Nimrud. Discussões acadêmicas prosseguem sobre a natureza das “Lentes de Nimrud” (mantidas no Museu Britânico), uma peça de quartzo desenterrada por Austen Henry Layard em 1850, no complexo palaciano de Nimrud, norte do Iraque. Uma pequena minoria crê ser ela uma evidência de antigos telescópios assírios, que poderia explicar a grande precisão da astronomia assíria. Outros sugerem o seu uso como lente de aumento para joalheiros ou mobília decorativa.
Os assírios foram também inovadores na tecnologia militar, pelo uso de cavalaria pesada, sapadores, máquinas para cerco etc... 


[1] Os arameus (de Aramea) foram um povo semita do noroeste, de língua aramaica, que se originou na moderna Síria (bíblica Aram) durante o final da Idade do Bronze e a Idade do Ferro. Grandes grupos migraram para a Mesopotâmia onde se misturaram aos nativos assírios e babilônios. Os arameus nunca tiveram uma nação unificada, mas estiveram sempre divididos em pequenos reinos independentes por regiões do Oriente Médio, particularmente a moderna Síria e Jordânia, sendo posteriormente totalmente absorvidos pelo Novo Império Assírio, pelo século IX AC.
[2] A Caldeia foi uma pequena nação semita que emergiu ao final do século X AC, sobrevivendo até meados do século VI AC, localizada ao sul da Mesopotâmia e brevemente governou a Babilônia. Caldeus provém do latim Chaldeus. No Antigo Testamento há várias citações sobre esse povo que, sob o comando de Nabucodonosor II teria destruído Jerusalém e levado o povo judeu para o cativeiro babilônico que durou 70 anos.
[3] Os suteus foram um povo semita que viveu entre o Levante e Canaã, cerca de 1350 AC, sendo mais tarde encontrados também na Babilônia. Tradicionalmente operavam como mercenários e aparecem em documentos do Médio Império Assírio. Com outros povos semitas (caldeus e arameus) infestaram áreas da Babilônia cerca de 1100 AC e foram finalmente conquistados pela Assíria com o resto da Babilônia
[4] O Império Medo foi uma entidade política que existiu na região geográfica da Média, no noroeste do atual Irã, conhecida por ter sido a base política e cultural dos medos, bem como de outros povos iranianos antigos.
[5] Os manneanos (cujo país chama-se Mannea) foram um povo antigo que viveu em território do atual noroeste do Irã, ao sul do lago Urmia, do século X ao século VII AC. Naquele tempo eram vizinhos dos impérios da Assíria e Urartu, bem como de outros pequenos estados-tampões entre os dois, como Musasir e Zikirta.
[6] Frígia era o nome da região centro-oeste na antiga Ásia Menor (Anatólia), moderna Turquia, centrada no rio Sakarya (antigo rio Sangário ou Sangarios), onde floresceu o Reino da Frígia, famoso por seus reis lendários que povoaram a era heroica da mitologia grega. O poder frígio teve o seu apogeu no século VIII, reinado do histórico rei Midas.
[7] Os cimérios foram um antigo povo indo-europeu que viveu ao norte do Cáucaso e do Mar de Azov por volta de 1300 AC até que foram expulsos para o sul, pelos citas, chegando à Anatólia por volta do século VIII AC.
[8] Os citas foram tribos equestres iranianas que por toda a Antiguidade Clássica dominaram as estepes centrais da Eurásia, conhecidas como Cítia, a partir do século VII AC. Os citas clássicos conhecidos dos antigos historiadores gregos localizavam-se ao norte do Mar Negro e do Cáucaso.
[9] A Aramea é uma região mencionada na Bíblia, localizada na Síria Central, e se estendia das montanhas do Líbano para o leste, através do Eufrates, incluindo o vale do rio Khabur no noroeste da Mesopotâmia, na fronteira com a Assíria, e que incluía a área onde hoje se encontra a cidade de Aleppo.
[10] Os Nabateanos (de Nabatea) eram um antigo povo árabe que habitava o norte da Arábia e o sul do Levante.
[11] A Caria era uma região do oeste da Anatólia, ao longo da costa. Seus habitantes, os carianos, haviam chegado à Caria antes dos gregos.
[12] Na antiguidade, a Cilicia era a região costeira sul da Anatólia, ao sul do seu planalto central. Existiu como entidade política desde o tempo dos hititas até o Império Bizantino.
[13] A Capadócia é uma região histórica da Anatólia central.
[14] O reino de Comagene era um antigo reino armênio do período helenístico (entre a morte de Alexandre, o Grande, em 323 AC e a emergência do Império Romano com a batalha de Actium em 31 AC e a subsequente conquista do Egito de Ptolomeu em 30 AC), do qual pouco se sabe antes do início do segundo século AC.

Continua na PARTE 10

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: MESOPOTÂMIA (PARTE 08)

IV.9 - IMPÉRIO ASSÍRIO

Assíria, em verde, cerca 1450
AC, com a capital Assur
A Assíria foi um importante reino semita da Mesopotâmia e por muito tempo um império do antigo Oriente Médio, que existiu como estado independente por um período de aproximadamente 19 séculos, de 2500 AC a 605 AC. A partir daí, por mais 13 séculos, até meados do século VII DC, sobreviveu governado por potências estrangeiras, embora alguns pequenos estados novo-assírios tenham surgido por todo este período. Centrado no curso superior do rio Tigre, norte da Mesopotâmia, os assírios governaram poderosos impérios, o último dos quais tornou-se o maior e mais poderoso império que o mundo já tinha visto. No seu pico, o império assírio se estendeu de Chipre, no Mediterrâneo, à Pérsia (atual Irã) e das montanhas do Cáucaso (atuais Armênia, Geórgia, Azerbaijão) à Península Árabe e Egito.
A Assíria pegou o nome da sua capital original, a antiga cidade de Assur (Ashur) que data de 2600 AC, originariamente uma das várias cidades estados Acadianas na Mesopotâmia, que pode ser vista em qualquer da duas figuras. Até o final do século XXIV AC, os reis assírios eram somente líderes regionais e subordinados a Sargão de Acádia, que uniu todos os povos da mesopotâmia que falavam Acadiano semita e sumério na Mesopotâmia, sob o Império Acadiano. Com a queda deste império e do curto renascimento sumério, a Assíria recuperou sua plena independência.
O Império Assírio, em verde no seu auge, incluindo o Egito


A história da Assíria é, grosseiramente, dividida em três períodos, conhecidos como Antigo Assírio, Médio Assírio e Novo Assírio, que correspondem, mais ou menos, à Média Idade do Bronze, Final Idade do Bronze e Início da Idade do Ferro, respectivamente. No Antigo Assírio, a Assíria estabeleceu colônias na Ásia Menor (ou Anatólia) e no Levante e, sob o rei Ilushuma, pugnou por seus direitos sobre o sul da Mesopotâmia. A partir do século XIX AC, a Assíria entrou em conflito com o recém-criado estado da Babilônia (nosso próximo estudo), que finalmente ofuscou os estados sumero-Acadianos mais velhos, como Ur, Isin, Larsa e Kish. No Médio Assírio, a Assíria passou por grandes oscilações. Teve um período de império com Shamshi-Adad e Ishme-Dagan nos séculos XVIII e XIX AC. Após, esteve sob o domínio da Babilônia e de Mitanni-Hurrian[1] por curtos períodos, nos séculos XVIII e XV AC, respectivamente. Um outro período de grande poder ocorreu com a ascensão do Império Assírio Médio (de 1365 a 1056 AC) que incluiu reinados de reis importantes; durante este período a Assíria destruiu o Mitanni e eclipsou os impérios Hitita e Egípcio no Oriente Médio. A partir de 911 AC, com as campanhas de Adad-nirari, tornou-se novamente uma grande potência pelos três séculos seguintes, derrotando a 25ª Dinastia do Egito e conquistando o Egito, Babilônia, Elam e Urartu/Armênia, Pérsia[2] e vários outros estados, como veremos em detalhe. Após a sua queda entre 612 e 605 AC, a Assíria permaneceu como província e entidade geopolítica sob vários impérios importantes, após o que foi finalmente dissolvida e os remanescentes da população assíria tornaram-se uma minoria em sua terra natal.

IV.9.1 - A ASSÍRIA PRÉ-HISTÓRICA

Em tempos pré-históricos, a região que tornou-se conhecida como Assíria (ou Subartu) foi o lar de uma cultura Neandertal[3], como descoberto na Caverna Shanidar. Os primeiros sítios do Neolítico, na Assíria, pertenciam à cultura Jarmo (sítio arqueológico no norte do Iraque, aos pés das Montanhas Zagros), cerca de 7100 AC, e Tell Hassuna (“tell” da província de Níneve, Iraque), o centro da cultura Hassuna, cerca de 6000 AC.
As cidades de Assur e Nínive, com outras, existiram desde, pelo menos, a metade do terceiro milênio AC, embora nesta época sendo centros administrativos do governo sumério e não estados independentes. De acordo com escritores cristão-judaicos, a cidade de Assur foi fundada por Ashur, filho de Shem, deificado pelas gerações posteriores como o deus padroeiro da cidade. A tradição assíria cita um antigo rei assírio Ushipa como tendo dedicado o primeiro templo ao deus Ashur, na cidade, no século XXI AC. É muito provável que a cidade tenha sido nomeada em honra do seu deus assírio padroeiro com o mesmo nome. Fontes diversas, baseadas em relatos posteriores, apresentam datas não muito divergentes para a fundação da Assíria, conduzindo a um valor médio em torno de 2174 AC.

IV.9.2 – A ANTIGA ASSÍRIA (2600 – 2335 AC)

Os estudiosos consideram que a cidade de Ashur, com outras cidades assírias, foram estabelecidas pelo ano 2600 AC, nessa época como centros administrativos sumérios. Da história mais antiga do reino da Assíria, pouco é positivamente conhecido. Na “Lista dos Reis Assírios”, o primeiro rei registrado foi Tudiya e suas atividades foram confirmadas por um tablete (questionável após as últimas descobertas) em que ele concluiu um tratado para a operação de uma colônia de comércio em território eblaita (de Ebla, um dos mais antigos reinos da Síria). Tudiya foi sucedido na lista por Adamu e então por treze governantes adicionais, sobre cujos nomes nada se conhece de concreto, a não ser o fato de que um tablete muito posterior, listando a linhagem ancestral de Hammurabi, o rei Amorita da Babilônia, teria incluído ao mesmos nomes embora em forma bastante corrompida. Os primeiros reis, como Tudiya, registrados como reis que viviam em tendas, podem ter sido governantes pastoris seminômades Acadianos independentes. Estes reis, em algum ponto tornaram-se totalmente urbanos e fundaram a cidade-estado de Ashur.
Durante o Império Acadiano (2334-2154 AC), os assírios, como todos os semitas Acadianos e sumérios, ficaram sujeitos à dinastia da cidade-estado de Acádia. A Assíria, ao norte da sede do império, tinha também sido conhecida como Subartu, pelos sumérios, e o nome Azuhinum, nos registros Acadianos, também parece referir-se à Assíria. Os governantes assírios eram subordinados a Sargão e a cidade de Ashur tornou-se um centro administrativo regional do Império.
Por essa época, a Assíria já comerciava fortemente na Ásia Menor, através dos seus karums (postos de comércio na Anatólia), conforme documentado em tabletes cuneiformes da época, assim difundindo o uso da escrita cuneiforme mesopotâmica pela Ásia Menor e o Levante.
Ao final do reino de Sargão, o Grande, os assírios tentaram uma rebelião mal sucedida e foram fortemente reprimidos. Conforme vimos, o Império Acadiano encerrou pelo declínio econômico seguido de ataques do povo bárbaro gutiano, em 2154 AC.
Entre 2154 e 2112 AC os governantes assírios ficaram de novo totalmente independentes, pois os gutianos apenas administraram o sul da Mesopotâmia.
A maior parte da Assíria tornou-se parte do Novo Império Sumério (ou 3ª Dinastia de Ur), fundado em 2112 AC, que se estendeu até a cidade de Ashur, mas parece não ter alcançado Níneve e a extremidade norte da Assíria. Os governantes de Ashur parecem ter permanecido sob dominação suméria até cerca de 2050 AC.

IV.9.3 – O ANTIGO REINO ASSÍRIO (2050-1392 AC)

As primeiras inscrições por reis assírios “urbanizados” apareceram no meio do século XXI AC, após terem sacudido a dominação suméria. A terra da Assíria, como um todo, consistia em um número de cidades-estados e pequenos reinos semitas Acadianos, alguns dos quais, inicialmente independentes da Assíria. A fundação do primeiro templo importante na cidade de Ashur é, tradicionalmente, atribuído ao rei Ushpia, que reinou cerca de 2050 AC, possivelmente um contemporâneo de Ishbi-Erra, de Isin e de Naplanum, de Larsa. Foi sucedido por reis de que pouco se conhece, a não ser de menções muito posteriores a Kikkiya, que conduziu fortificações nas muralhas da cidade e realizou trabalhos nos templos de Ashur.
Os principais rivais, vizinhos ou parceiros de comércio aos primeiros reis assírios durante os séculos XXII a XX AC, foram os hattianos e hurrianos, ao norte da Ásia Menor, os gutianos e Turukku, ao leste, nas montanhas Zagros, os elamitas, a sudeste (moderno centro sul do Irã), os amoritas ao oeste (atual Síria) e suas cidades-estados assemelhadas do sul da Mesopotâmia, como Isin, Kish, Ur e Larsa.
Como muitas cidades-estados da história da Mesopotâmia, Ashur foi, numa grande proporção, mais uma oligarquia do que uma monarquia. A autoridade era da Cidade e o sistema tinha três principais centros de poder: um conselho de anciãos, um soberano hereditário e um epônimo. O soberano presidia sobre o Conselho e concretizava suas decisões. Não era chamado pelo termo Acadiano comum para rei, reservado a Assur, deidade patrona da cidade, de quem o soberano era alto sacerdote. O governante era somente designado como o “procurador de Assur”, onde o termo para procurador é uma palavra emprestada do sumério ensi(k). O terceiro centro de poder era o epônimo que cedia seu nome ao ano, da mesma forma que os posteriores arcontes e cônsules da antiguidade clássica. Era anualmente sorteado e responsável pela administração econômica da cidade, o que incluía o poder para prender pessoas e confiscar propriedades.
Cerca de 2025 AC, Puzur-Ashur (talvez um contemporâneo de Shu-ilishu de Larsa e Samium de Isin) parece ter deposto Kikkiya e fundado uma nova dinastia que sobreviveria por 216 anos. Seus descendentes deixaram inscrições que o mencionavam em relação à construção de templos, tais como os de Ashur, Adad e Ishtar na Assíria. A duração do seu reino é desconhecida.
Outros reis sucederam-se nessa dinastia que foi encerrada com o rei Erishum II (1818-1809), que governou por somente nove anos e foi deposto por Shamshi-Adad I, o amorita usurpador que já havia sido derrotado numa tentativa anterior e que reivindicava a legitimidade ao trono como descendente do rei assírio Ushpia, de meados do século XXI AC.
Embora visto como amorita pela tradição assíria posterior, a descendência de Shamshi-Adad I, que reinou de 1809 a 1776 AC, foi sugerida pela Lista de Reis Assírios como sendo de Ushpia, rei nativo de língua Acadiana. Colocou seu filho Ishme-Dagan no trono da cidade assíria próxima, Ekallatum, e manteve as colônias assírias na Anatólia. Conquistou o reino de Mari (na Síria Moderna) no Eufrates, colocando no trono outro de seus filhos, Yasmah-Adad. Com isso, a Assíria de Shamshi-Adad I abarcava todo o norte da Mesopotâmia, incluindo territórios da Mesopotâmia central, Ásia Menor e norte da Síria, havendo menções de que ele teria conduzido ataques às costas canaanitas do Mediterrâneo, onde teria erigido marcos para comemorar suas vitórias. Residia na nova cidade capital de Shubat-Enlil, fundada no vale de Khabur, norte da Mesopotâmia.
Seu filho Ishme Dagan herdou o trono da Assíria, mas Yasmah-Adad foi derrubado de Mari por um novo rei de nome Zimrilim, que se aliou com o rei amorita Hammurabi, da Babilônia, que tornou este recém criado estado numa potência importante. Foi do reino de Hammurabi que o sul da Mesopotâmia tornou-se conhecido como Babilônia, potência crescente com que então passou a defrontar a Assíria. Ishme-Dagan respondeu através de uma aliança com os inimigos da Babilônia e a luta pelo poder se prolongou por décadas. Como seu pai, um grande guerreiro, repelia os ataques da Babilônia ao mesmo tempo em que movia campanhas vitoriosas contra vários inimigos importantes.
Após conquistas importantes, Hammurabi finalmente sujeitou à Babilônia, cerca de 1750 AC, Mut-Ashkur, filho de Ishme-Dagan. Com Hammurabi, os vários postos de comércio na Anatólia encerraram suas atividades porque os bens da Assíria eram então comerciados com a Babilônia. A monarquia assíria sobreviveu, contudo os três reis amoritas que sucederam a Ishme-Dagan, Mut-Ashkur (1750-1740 AC), Rimush (1739-1733) e Asinum (1732 AC), tornaram-se vassalos e dependentes da Babilônia, sob Hammurabi e, por curto tempo, também seu sucessor Samsu-iluna.
Este Império Babilônico de curta vida, rapidamente desfibrou-se com a morte de Hammurabi, perdendo o controle sobre a Assíria durante o seu sucessor Samsu-iluna (1750-1712 AC). Um período de guerra civil seguiu-se após a deposição do rei amorita da Assíria, Asinum, cerca de 1732 AC, por um poderoso vice regente nativo Acadiano de nome Puzur-Sin, que via Asinum como um estrangeiro e antigo lacaio da Babilônia. Foi uma época conturbado em que vários reis se sucederam por curto período, até que Adasi (1726-1701 AC) tomou o poder, encerrando a guerra civil e estabilizando a situação na Assíria, tirando da esfera de influência dos assírios, babilônios e amoritas. Adasi foi sucedido por Bel-bani (1700-1691 AC) que infligiu derrotas adicionais aos babilônios e amoritas, reforçando e estabilizando ainda mais o reino.
Sabe-se pouco dos vários reis que o sucederam, mas a Assíria parece ter tido uma nação relativamente forte e estável, sem ser perturbada por seus vizinhos de várias etnias por mais de 200 anos, mesmo quando a Babilônia foi saqueada pelos Hititas e caiu para os Kassitas[4] em 1595 AC, mantendo um tratado mutualmente benéfico com o estado vizinho.
Nem o recém fundado Império Mitanni, na Ásia Menor, perturbou os reis do Império Assírio que mantiveram uma época de progresso e calma até o ano 1450 AC, quando iniciou o seu declínio.
Ashur-nadin-ahhe I (1450-1431 AC) foi cortejado pelos egípcios, rivais dos Mitanni da Ásia Menor, que na tentativa de ganhar uma base de apoio no Oriente Médio, lhe enviaram, na pessoa de seu rei Amenhotep II, tributo de ouro para selar aliança contra o Império Hurri-Mitanni, governado por Saushtatar. É possível que essa aliança tenha provocado a invasão da Assíria e o saque da cidade de Ashur, após o que a Assíria tornou-se um esporádico estado vassalo, com Ashur-nadin-ahhe I sendo forçado a pagar tributo a Saushtatar. Foi deposto por seu próprio irmão, Enlil-nasir II (1430-1425 AC), provavelmente com a ajuda dos Mitanni, que continuou a pagar tributo , assim como seu sucessor Ashur-nirari II (1424-1418 AC). A monarquia assíria sobreviveu já que a influência Mitanni parece ter sido esporádica, nem sempre desejosa de interferir nas relações internas e internacionais assírias.
O mesmo aconteceu com os reis assírios que o sucederam, até a ascensão ao trono, de Eriba-Adad I (1392-1366 AC) que, finalmente quebrou os laços com o Império Mitanni. Há muitos textos cuneiformes deste período, com observações precisas de eclipses lunares e solares, que foram usadas como “âncoras” nas várias tentativas de definir a cronologia da Babilônia e Assíria para o segundo milênio AC.


[1] O Mitanni foi um estado de língua hurriana, ao norte da Síria e sudeste da Anatólia, que atingiu o seu clímax cerca de 1400 AC, fundado por uma casta governante Indo-Ariana, com população predominantemente hurriana.
[2] Os persas são um povo iraniano que teria chegado ao Irã entre 2000 e 1500 AC e se estabelecido em Pars, província na região sudoeste, de onde se originaram as palavras portuguesas Pérsia e persa.
[3] O Neandertal é uma espécie humana extinta, do gênero Homo, muito próxima dos modernos humanos (diferindo no DNA por apenas 0,12%) e assim nomeada de Neandertal (Vale do Neander), local da Alemanha onde foi descoberta pela primeira vez.
[4] Os Kassitas, povo antigo do Oriente Médio, controlaram a Babilônia, após o saque da cidade pelos Hititas e a queda do Antigo Império Babilônico, em 1595 AC, até 1155 AC. Seu reinado de 500 anos criou uma base fundamental para o desenvolvimento da subsequente cultura babilônica.

Prossegue na PARTE 09, com o Médio Império Assírio