Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

domingo, 28 de dezembro de 2014

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: MESOPOTÂMIA (PARTE 06)

IV.7.2 – POPULAÇÃO E CULTURA DA SUMÉRIA

Uruk, uma das maiores cidades da Suméria, pode ter tido uma população máxima entre 50 e 80 mil habitantes; consideradas as outras cidades da Suméria e a grande população agrícola, uma estimativa grosseira para a população da Suméria pode ter sido 0,8 a 1,5 milhões de habitantes, quando a população mundial da época foi estimada em 27 milhões.
No início do Período Sumeriano (Uruk), os pictogramas primitivos sugerem que a cerâmica era abundante e as formas dos vasos, vasilhas e pratos, múltiplas; havia tigelas especiais para mel, manteiga, óleo e vinho. Alguns dos vasos possuíam pés afilados e permaneciam em suportes com as pernas cruzadas; outros eram de fundo plano e colocados em molduras de madeira quadradas ou retangulares. As jarras de óleo – e provavelmente também outras – eram seladas com argila, exatamente como no Egito antigo. Vasos e pratos de pedra eram feitos imitando argila e cestos eram tecidos de junco ou feitos de couro.
Camas, bancos e cadeira eram usados, com pernas entalhadas imitando pernas de boi. Havia lareiras e altares com fogo, tudo indicando que já usassem chaminé. Na cabeça usavam enfeites com penas.
Facas, trados, cunhas e um instrumento similar à serra também eram conhecidos, enquanto lanças, arcos, flechas e adagas (mas não espadas) eram empregadas na guerra. Tabletes eram usados para a escrita e cobre, ouro e prata eram trabalhados pelo ferreiro. Adagas com lâminas de metal e cabos de madeira eram usadas e o cobre era martelado em lâminas, ao passo que colares eram feitos de ouro. O tempo era calculado por meses lunares.
Há considerável evidência de que os sumerianos amavam a música, que parece ter sido uma importante parte da vida religiosa e civil na Suméria. As liras eram populares na Suméria e entre os mais conhecidos exemplos estavam as liras de Ur.
Inscrições descrevendo as reformas do rei Urukagina de Lagash (cerca de 2300 AC) dizem que ele aboliu o costume antigo da poliandria (opondo-se à poligamia, o casamento de uma mulher com vários homens) nesse país, prescrevendo que a mulher que tivesse múltiplos maridos fosse apedrejada com as pedras nas quais o crime tivesse sido registrado. Embora as mulheres fossem protegidas pela lei sumeriana mais nova e pudessem alcançar um status mais elevado na Suméria que em outras civilizações contemporâneas, a cultura masculina dominava. O código de Ur-Nammu, a mais antiga codificação já descoberta, datando do “Renascimento Sumeriano” Ur-III, revela um vislumbre da estrutura social na lei sumeriana mais tardia. Abaixo do rei, todos os membros da sociedade pertenciam a um de dois substratos: o “lu” ou pessoa livre e o escravo, homem ou mulher. O filho de um “lu” era chamado de “dumu-nita” até que casasse. Uma mulher (munus) passava de filha (dumu-mi) para esposa (dam); tornando-se uma viúva (numasu) poderia casar novamente.
As descobertas arqueológicas mais importantes na Suméria, foram numerosos tabletes escritos em cuneiforme. A escrita sumeriana é o mais antigo exemplo de escrita sobre a Terra. Embora figuras (hieróglifos) tivesse sido usadas no início, símbolos passaram a representar sílabas. Bambus afilados em forma triangular ou cunha eram usados para escrever em argila úmida. Centenas de milhares de textos na língua sumeriana sobreviveram, como cartas pessoais ou de negócios, receitas, listas de vocabulários, leis, hinos, orações, histórias, diários e até mesmo bibliotecas repletas de tabletes de argila. Inscrições monumentais e textos sobre diferentes objetos como estátuas ou tijolos são também muito comuns. Muitos textos sobrevivem em múltiplas cópias porque foram repetidamente transcritos por escribas em treinamento. O sumeriano continuou sendo a língua da religião e da lei na Mesopotâmia muito tempo depois que os falantes semitas se tornaram dominantes.
A língua sumeriana é geralmente vista como uma língua isolada em linguística porque ela não pertence a uma família de linguagem; o akkadiano, pelo contrário, pertence ao ramo semita das línguas afro-asiáticas. Há muitas tentativas que falharam para conectar o sumeriano a outros grupos de linguagem. Entender textos sumérios pode ser difícil hoje, mesmo para peritos, principalmente para os textos mais antigos que, em muitos casos, não dão a estrutura gramatical completa da língua.
Durante o terceiro milênio AC, desenvolveu-se uma simbiose cultural íntima entre os usuários das linguagens suméria e akkadiana, que incluiu um difundido bilinguismo. A influência do sumério sobre o acádio (e vice-versa) foi evidente em todas as áreas, do empréstimo léxico em escala maciça, à convergência sintática, morfológica e fonológica, preparando os estudiosos a referir-se ao sumeriano e akkadiano, do terceiro milênio, como uma área linguística. O akkadiano gradualmente substituiu o sumeriano, como língua falada da Mesopotâmia, em torno do terceiro e segundo milênio AC (a data exata é matéria de debate), embora esta continuasse como língua sagrada, cerimonial, literária e científica, na Mesopotâmia, até o século I DC

IV.7.3 - RELIGIÃO DA SUMÉRIA

Na madrugada da história registrada, Nippur, na Mesopotâmia Central, substituiu Eridu, ao sul, como a principal cidade-templo, cujos sacerdotes também conferiram o status de hegemonia política nas outras cidades-estados. Nipur manteve seu status por todo o primeiro período sumeriano, até que Sargão de Akkad a transferiu para a Babilônia.
Os sumérios acreditavam num politeísmo antropomórfico (muitos deuses em forma humana). Não havia um conjunto comum de deuses, cada cidade tendo seus próprios padroeiros, templos e reis-sacerdotes, sem que fossem exclusivos, isto é, podendo ser reconhecidos por outras cidades. Os sumérios estão entre os primeiros povos a registrar suas crenças por escrito e foram inspiração importante na mitologia, religião e astrologia da Mesopotâmia mais tardia. Entre os deuses adorados pelo sumérios, podemos citar: An, o deus em tempo integral, equivalente a Céu, e sua consorte Ki (que significa Terra); Enki, no templo de Eridu, deus da beneficência, governador das águas profundas sob a terra, curandeiro e amigo da humanidade, responsável pela cessão das artes e ciências aos humanos, as indústrias e a própria civilização, além de ter criado o primeiro livro de leis; Enlil, deus da terra-fantasma, em Nippur, teria dado à humanidade os encantos e feitiços aos quais os espíritos do bem ou mal devem obedecer; Inanna, a deificação de Vênus, a estrela da manhã (no oriente) e do entardecer (no ocidente), no templo de Uruk, compartilhado com An; o deus-sol Utu, em Larsa, no sul e Sippar, no norte; Sin, o deus da lua, em Ur. Essas deidades formavam o panteão central, cercados de centenas de deuses menores. Os deuses sumérios podiam ter associações com diferentes cidades e sua importância religiosa muitas vezes crescia ou diminuía com o poder político dessas cidades. Dizia-se que os deuses haviam criado os humanos, de argila, para servi-los. Os templos organizavam os projetos de força de trabalho para projetos de agricultura irrigada, para os quais os cidadãos tinham um dever, embora pudessem evita-lo em troca de um pagamento em prata.
Os sumérios acreditavam que o Universo consistia de um disco plano encoberto por uma cúpula. O pós vida sumeriano envolvia uma descida em um sombrio mundo inferior para passar a eternidade numa existência infeliz como um Gidim (fantasma).
O Universo era dividido em quatro quartos: (1) ao norte estavam os Subartu, moradores das colinas que, periodicamente, saíam em busca de escravos, madeira e materiais naturais; (2) a oeste ficavam os Martu, habitantes das tendas, povo semita que viviam como pastores nômades apascentando rebanhos de ovelhas e cabras; (3) ao sul ficava a terra dos Dilmun, um estado de comércio associado com a terra dos mortos e o local da criação; (4) a leste ficavam os Elamitas, um povo rival com o qual os sumérios estavam frequentemente em guerra.
Seu mundo conhecido estendia-se do Mar Superior ou linha da costa do Mediterrâneo, ao Mar Inferior, o Golfo Pérsico e a terra de Meluhha (provavelmente o Vale do Indo) e Magan (Oman), famoso por seus minérios de cobre.
Cada ziggurat (templo sumério) tinha um nome individual e consistia de um átrio com um tanque central para purificação. O próprio templo possuía uma nave central com corredores de ambos os lados. Flanqueando os corredores, havia quartos para os sacerdotes. Em uma extremidade ficava o pódio e uma mesa de tijolos de argila para sacrifícios vegetais e animais. Silos e armazéns ficavam, em geral, situados perto dos templos. Após um tempo os sumérios começaram a colocar os templos no topo de construções quadradas de múltiplos andares, como uma série de terraços, originando o estilo Ziggurat.
Acreditava-se que quando as pessoas morriam, eram confinadas no sombrio mundo de Ereshkigal, cujo reino era guardado por portões com vários monstros criados para impedir a entrada ou saída das pessoas. Os mortos eram enterrados fora das muralhas da cidade em cemitérios onde um montículo cobria o corpo, com oferendas aos monstros e uma pequena quantidade de comida. Sacrifícios humanos foram encontrados nas covas no cemitério real de Ur, onde a rainha Puabi estava acompanhada na morte por suas servas. Diz-se também que os sumérios inventaram o primeiro instrumento semelhante ao oboé e os usavam nos funerais reais.

IV.7.4 – AGRICULTURA

Os sumérios adotaram o modo de vida agrícola ente 5000 e 4500 AC. A região mostrou uma grande quantidade de técnicas agrícolas que incluíam a irrigação organizada, intenso cultivo da terra em larga escala, monocultura envolvendo o uso de arado e o uso de uma força de trabalho agrícola especializada sob controle burocrático. 
No início do Período Uruk Sumeriano, os pictogramas primitivos sugerem que ovelhas, cabras, bois e porcos eram domesticados. Usavam bois como animais de carga primários e burros ou cavalos como animais de transporte; roupas “de lã”, bem como tapetes eram feitos de lã ou crina dos animais.
Nas laterais das casas havia jardins fechados com árvores e plantas diversas; trigo e outros cereais eram semeados nos campos e o shaduf (ferramenta para irrigação, constituída por vaso e haste longa) já era empregado para fins de irrigação. Além disso, plantas eram também cultivadas em vasos.
Os sumérios praticavam técnicas de irrigação similares às dos egípcios, cujos desenvolvimentos eram associados à urbanização, já que cerca de 90% da população vivia em área urbana.
Cultivavam cevada, grão de bico, lentilhas, trigo, ameixas, cebolas, alho, alface, alho-porró e mostarda. Pescavam diversos tipos de peixes e caçavam aves e gazelas. A agricultura suméria dependia fortemente da irrigação, que era realizada com o uso do shaduf, canais, valas, diques, vertedores e reservatórios. As frequentes cheias violentas do Tigre e as menos frequentes do Eufrates exigiam permanente manutenção e observação dos canais e do sistema em geral. Para isso, o governo podia exigir pessoas para trabalhar como “voluntários” sem pagamento, embora os ricos pudessem ser isentos. Como descoberto pelo “Almanaque Sumeriano do Fazendeiro[1]”, após a época das cheias, equinócio de primavera e o festival de Ano Novo, com o uso dos canais os fazendeiros deveriam inundar seus campos e então drená-las. A seguir, eles deixavam os bois pisarem o solo e matar as ervas daninhas, arrancando-as então com picaretas. Depois de secas, elas eram aradas, limpas, revolvidas três vezes e então pulverizadas com enxadas antes de semear. Infelizmente, a alta taxa de evaporação resultava em um gradual aumento na salinidade dos campos e, pelo período Ur III, os fazendeiros já haviam mudado sua principal cultura do trigo para a cevada, mais tolerante ao sal. As colheitas eram realizadas na primavera, com equipes de três pessoas: o segador, o amarrador e o guardador dos feixes.

IV.7.5 - ARQUITETURA

As planícies dos rios Tigre e Eufrates se ressentiam de minerais e árvores. As estruturas dos sumérios eram feitas de tijolos de barro sem cimento ou argamassa, que acabavam se deteriorando, sendo por isso, periodicamente destruídos, nivelados e reconstruídos no mesmo local. Essa constante reconstrução gradualmente elevava o nível das cidades que ficavam então acima da planície circundante. As colinas circundantes, conhecidas como tells, são encontradas por todo o antigo Oriente Médio.
Como a pedra era escassa, o tijolo de barro era o material ordinário de construção e com ele cidades, fortes, templos e casas eram construídos. As cidades contavam com torres sobre plataformas artificiais; as casas também tinham aparência de torres e eram providas de uma porta que girava sobre uma dobradiça e podia ser aberta com uma espécie de chave. O portão da cidade era em escala maior e dupla. As pedras de fundação – muitas vezes tijolos – de uma casa eram consagradas por certos objetos que eram depositados sobre elas.
Os mais impressionantes e famosos edifícios sumérios eram os figuras, grandes plataformas em camadas que suportavam templos. Os selos cilíndricos sumérios também representam casas construídas com juncos, como as construídas pelos árabes dos pântanos do sul do Iraque até 400 DC. Os sumérios também desenvolveram o arco, que lhes permitiu desenvolver um forte tipo de cúpula, construindo e ligando vários arcos. Os templos e palácios sumérios usaram materiais e técnicas mais avançadas, como contrafortes, nichos, meias-colunas e cones de barro.

IV.7.6 - MATEMÁTICA

Os sumérios desenvolveram um complexo sistema de medição cerca de 4000 AC, que avançou, resultando na criação da aritmética, geometria e álgebra. De 2600 AC em diante, os sumérios escreveram tábuas de multiplicação em tabletes de argila e trabalharam com exercícios geométricos e problemas de divisão. O período entre 2700 e 2300 AC viu o surgimento do ábaco[2] e uma tábua de colunas sucessivas que delimitavam as ordens sucessivas de magnitude do seu sistema numeral sexagesimal. Os sumérios foram os primeiros a usar um sistema numérico com valor posicional. Há também evidência histórica de que os sumérios possam ter usado um tipo de régua de cálculo em cálculos astronômicos. Eles foram também os primeiros a determinar a área de um triângulo e o volume de um cubo.

IV.7.7 – ECONOMIA, COMÉRCIO E GUERRA

Descobertas de obsidiana[3] de locais muito afastados na Anatólia, lápis-lazúli[4] do Badakshan, no nordeste do Afeganistão, pérolas do Dilmun (atual Bahrain) e muitos selos inscritos com escrita do Vale do Indo, sugerem uma malha muito ampla de comércio antigo, centrado em torno do Golfo Pérsico.
O “Épico de Gilgamesh” faz referência ao comércio, com terras distantes, de bens como madeira, escassa na Mesopotâmia. Em particular, cedro do Líbano era muito apreciado. A descoberta de resina na tumba da rainha Puabi, em Ur, indica que ela era negociada de tão longe quanto Moçambique.
Os sumérios usavam escravos, embora não fossem uma parte importante da economia. Escravas mulheres trabalhavam como tecelãs, passadeiras, moleiras e carregadoras.
Oleiros sumérios decoravam potes com tinta de óleo de cedro. Os oleiros usavam uma furadeira de arco para produzir o fogo necessário ao cozimento da cerâmica. Pedreiros e joalheiros conheciam e faziam uso do alabastro (calcita), marfim, ferro, ouro, prata, cornalina (variedade vermelha da calcedônia) e lápis-lazúli.
As guerras quase constantes entre as cidades-estados da Suméria, por quase dois mil anos, elevou o desenvolvimento da tecnologia e técnicas militares do império a altos níveis. A primeira guerra registrada com algum detalhe, entre Lagash e Umma, cerca de 2525 AC, foi através da já mencionada “Estela dos Abutres”. Ela mostra o rei de Lagash conduzindo um exército sumério consistindo principalmente de infantaria, que carrega lanças, veste elmos de cobre e escudos de couro ou vime. Os lanceiros aparecem segundo uma formação em falange, que requer treinamento e disciplina, indicando que os sumérios podem ter feito uso de soldados profissionais. Os militares sumérios usavam também carros com arreios para burros, que funcionavam menos efetivamente em combate do que os usados depois e alguns estudiosos sugerem que tenham servido, principalmente, como transporte, embora a tropa carregasse machados de batalha e lanças. O carro sumeriano compreendia um dispositivo de duas ou quatro rodas manejado por uma tripulação de dois e com arreios para quatro burros. O carro era composto por um cesto tramado e as rodas tinham um sólido esquema de três peças.
As cidades sumérias eram circundadas por muralhas defensivas. Os sumérios se empenhavam em combates de cerco entre suas cidades, mas as muralhas de tijolos de lama eram capazes de deter alguns inimigos.

[1] Este teria sido o primeiro almanaque do fazendeiro de que se tem registro, datando de 1700 a 1500 AC e descoberto em 1949, por uma expedição americana ao Iraque, financiada pelo Instituto Oriental da Universidade de Chicago e pelo Museu Universitário da Universidade da Pensilvânia.
[2] O ábaco é uma ferramenta de cálculo usada antes da adoção do moderno sistema numeral escrito, ainda amplamente em uso por mercadores, comerciantes, e balconistas na Ásia, África e outros lugares. Hoje os ábacos são feitos numa estrutura de bamboo com contas que deslizam em fios, mas originalmente eram feitos de feijões ou pedras que se moviam em sulcos em areia ou em tabletes de madeira, pedra ou metal.
[3] Vidro vulcânico que ocorre naturalmente como resultado de rocha ígnea extrusiva (lava de vulcões), em geral escura, pobre de água e de aspecto vítreo.
[4] Também chamado de lazurita, é um mineral de cor azul ultramar, composto de silicato de alumínio e sódio e sulfato de sódio(três do primeiro para um do segundo), usada como pedra ornamental.

PROSSEGUE NA PARTE 7

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: MESOPOTÂMIA (PARTE 05)





IV.7 – SUMÉRIA

Suméria, significando “terra dos reis civilizados” ou “terra nativa”, foi, provavelmente, a mais antiga civilização e uma região histórica do sul da Mesopotâmia, durante a Idade do Cobre e início da Idade do Bronze, propriamente dita. O termo “sumeriano” é o nome dado aos antigos habitantes não semitas da Mesopotâmia, pelos semitas akkadianos. Os sumérios se referiam a si próprios como “pessoas de cabeça negra”. A palavra akkadiana “shumer” pode representar o nome geográfico em dialeto, mas o desenvolvimento fonológico que conduziu ao termo akkadiano “sumeru”, é incerto. Os termos hebreu “shinar”, egípcio “sngr” e hitita “sanhar”, todos se referindo ao sul da Mesopotâmia, poderiam ser variantes de “shumer”.
A área que formou a Suméria iniciava no Golfo Pérsico e alcançava o gargalo ao norte da Mesopotâmia, onde os rios Tigre e Eufrates meandram o mais próximo possível um do outro. Ao leste, assomam as montanhas Zagros, onde cidades-estados espalhadas prosperavam com o comércio e o aprendizado da Suméria; ao oeste estava a vasta extensão do deserto árabe. (Figura 1)
Figura 1: Localização da Suméria
Os rios mudaram seus cursos consideravelmente nos últimos 4.000 anos, afastando-se bastante de algumas das cidades e causando o esgotamento da complexa rede de canais, mas à época, os dois rios tinham desembocaduras separadas no Golfo reduzido (Figura 2). Algumas das cidades mais antigas, tais como Sippar, Borsippa e Kish, no norte, e Ur, Uruk e Eridu, no sul, formavam os pontos finais daquilo que se tornou a tão complexa malha de cidades e canais. Girsu e Nippur eram centros religiosos altamente importantes, mas outras cidades como Larsa, Eshnunna, Babilônia e Isin, realmente não surgiram como tal, até o final da civilização, cerca de 2000 AC. 
Embora as mais antigas formas de escrita não retroajam além de 3500 AC, historiadores modernos têm sugerido que a Suméria se estabeleceu permanentemente, entre 5500 e 4000 AC, através de um povo não semítico, que pode ou não ter falado a língua suméria, dadas as evidências de nomes de cidades, rios, ocupações básicas etc...
Figura 2: Foz dos rios Tigre e Eufrates no Golfo Pérsico
Esses povos pré-históricos são hoje chamados proto-eufrateanos ou ubaidianos (de Ubaid, site arqueológico de antigo povoamento), que se pensa terem evoluído da cultura Samarra, mais ao norte da Mesopotâmia. Os ubaidianos foram a primeira força civilizadora na Suméria, drenando pântanos para agricultura, desenvolvendo o comércio e estabelecendo indústrias de tecelagem, couro, metais, alvenaria e cerâmica. Alguns estudiosos contestam a ideia de uma língua proto-eufrateana ou básica; eles sugerem que a língua sumeriana foi originalmente a dos povos caçadores e pescadores que viviam nos pântanos e na região litoral da Arábia Oriental, parte da cultura árabe central. Registros históricos confiáveis começam muito mais tarde; não há registros antes do rei de Kish, Enmebaragesi (século XXVI AC). Estudiosos acreditam que os sumerianos se estabeleceram ao longo da Arábia oriental, hoje região do Golfo Pérsico, antes de ser inundado ao final da Idade do Gelo; a literatura sumeriana fala sobre a sua terra natal ser Dilmun, na costa oriental da Arábia.
A agricultura irrigada, junto com o reabastecimento da fertilidade do solo e o excesso de alimento armazenado em celeiros templos criados por essa economia, permitiu à população dessa região ascender a níveis nunca antes vistos, muito diferentes dos encontrados em culturas anteriores de plantio e descanso da terra. Por outro lado, essa densidade de população muito maior criou e exigiu uma força de trabalho e uma divisão de trabalho extensiva, com muitas artes e ofícios especializados. Ao mesmo tempo, o uso excessivo dos solos irrigados conduziu à sua progressiva salinização e redução na sua população, com o tempo, conduzindo à sua eclipse pelos akkadianos da Mesopotâmia Central.
A Suméria foi também o local do desenvolvimento da escrita, que evoluiu de um estágio de pré-escrita, pelo meio do quarto milênio AC, à própria escrita no terceiro milênio AC.

IV.7.1 – HISTÓRIA DA SUMÉRIA

A civilização e as cidades-estados da Suméria tomaram forma durante os períodos pré-históricos Ubaid e Uruk, quarto milênio AC, continuando durante os períodos Jemdat Nasr e Antigo Dinástico. A historia escrita da Suméria retroage ao século XXVII AC e ainda antes, mas o registro histórico permanece obscuro até o período Antigo Dinástico III, cerca do século XXIII AC, quando um novo sistema de escrita silábica decifrada foi desenvolvido, permitindo aos arqueólogos ler registros e inscrições contemporâneos. A Suméria clássica termina com a ascensão do Império Akkadiano, cerca de 2270 AC no século XXIII AC, embora a língua sumeriana continuasse a ser uma língua sagrada. Após o período Gutiano (povos bárbaros das montanhas Zagros), o governo nativo sumeriano reemergiu por um século, na Terceira Dinastia de Ur (Renascença Sumeriana), do século XXI ao XX AC, mas a linguagem akkadiana também permaneceu em uso. Essa breve renascença encerrou com as invasões semitas dos Amoritas[1], cuja dinastia de Isin persistiu até cerca de 1.700 AC, quando a Mesopotâmia foi unida sob o governo da Babilônia. Os sumérios acabaram sendo absorvidos pela população akkadiana (assíria-babilônia). Todas essas datas estão mencionadas na cronologia da Mesopotâmia, apresentada bem acima.
Para facilitar a compreensão dos nossos leitores, apresentamos abaixo uma sucinta cronologia do império sumério, antes de descrever, separadamente, cada um dos períodos:

· Período Ubaid: 5300–4100 AC (Cerâmica do Neolítico ao Calcolítico)
· Período Uruk: 4100–2900 AC (Final do Calcolítico ao Início da Idade do Bronze I)
          · Uruk XIV-V: 4100–3300 BCE
          · Período Uruk IV: 3300–3000 BCE
          · Período Jemdet Nasr (Uruk III): 3000–2900 AC
· Início do Período Dinástico (Início da Idade do Bronze II-IV)
          · Período do início do Dinástico I: 2900–2800 AC
          · Período do início do Dinástico II: 2800–2600 AC (Gilgamesh)
          · Período do início do Dinástico IIIa: 2600–2500 AC
          · Período do início do Dinástico IIIb: 2500–2334 AC
· Período do Império Akkadiano: 2334–2218 AC (Sargão)
· Período Gutiano: 2218–2112 AC (Início da Idade do Bronze IV)
· Período Ur III: 2112–2004 AC

1) Período Ubaid

O período Ubaid é marcado por um distintivo estilo de cerâmica pintada de alta qualidade, que se espalhou por toda a Mesopotâmia e o Golfo Pérsico. Durante esse tempo, o primeiro povoamento no sul da Mesopotâmia foi estabelecido em Eridu, costa do Golfo Pérsico, a primeira cidade do mundo, cerca de 5300 AC, por agricultores que trouxeram consigo a cultura Hadji Muhammed, pioneira da agricultura irrigada. Parece que essa cultura foi derivada da cultura Samarran, do norte da Mesopotâmia. Não se sabe se estes foram os sumérios reais identificados com a cultura Uruk posterior. Eridu permaneceu um importante centro religioso, quando foi gradualmente ultrapassado, em tamanho, pela vizinha cidade de Uruk. A história da passagem do “me”[2] à Inanna, deusa de Uruk, por Enki, deus da sabedoria e deus maior de Eridu, pode refletir essa alteração na hegemonia. Essa cultura antiga foi um amálgama de três distintas influências culturais: agricultores incultos vivendo em casas de junco com barro ou tijolos de argila e praticando a agricultura irrigada; pescadores e caçadores vivendo em casas de junco trançado em ilhas flutuantes de pântanos; e pastores nômades de ovelhas e cabras, vivendo em tendas negras.

2) Período Uruk

A transição arqueológica entre os períodos Ubaid e Uruk é marcada por uma gradual alteração da cerâmica pintada produzida domesticamente em uma roda lenta, para uma grande variedade de massa cerâmica sem pintura produzida por especialistas em rodas rápidas.
Ao tempo do período Uruk (4100-2900 AC) o volume de bens comerciais transportados ao longo dos canais e rios do sul da Mesopotâmia, facilitou o surgimento de cidades enormes, estratificadas e centradas em templos (com populações acima de 10.000 pessoas), onde administrações centralizadas empregavam trabalhadores especializados. É quase certo que foi durante o período Uruk que as cidades da Suméria começaram a fazer uso do trabalho escravo capturado das montanhas e há ampla evidência desses escravos em textos anteriores. Artefatos e mesmo colônias da civilização Uruk foram encontrados em uma ampla que vai das Montanhas Taurus, na Turquia, ao Mar Mediterrâneo no oeste e até o Irã Central.
A civilização do período Uruk, exportada pelos comerciantes e colonizadores sumérios, teve efeito sobre todos os povos da redondeza, que gradualmente derivaram as suas próprias economias e culturas competitivas. As cidades da Suméria não podiam manter colônias a longa distância por força militar.
As cidades sumérias do período Uruk eram, provavelmente, teocráticas e muito possivelmente chefiadas por um rei-sacerdote (ensi) assistido por um conselho de anciãos, incluindo homens e mulheres. É muito possível que o panteão do final do sumério fosse modelado sobre essa estrutura política. Havia pequena evidência de violência institucionalizada ou soldados profissionais durante este período e as cidades não eram, em geral, muradas. Durante este período, Uruk tornou-se a mais urbanizada cidade do mundo, ultrapassando, pela primeira vez, os 50.000 habitantes.
A antiga lista dos reis sumérios inclui as primeiras dinastias de várias cidades proeminentes deste período. O primeiro conjunto de nomes na lista é de reis ditos terem reinado antes que uma enchente importante ocorresse. Esses nomes primitivos podem ser ficção e incluem algumas figuras legendárias e mitológicas, tais como Alulim e Dumizid.
O fim do período Uruk coincidiu com a Oscilação Piora (um abrupto período seco e frio na história do clima, de 3200 a 2900 AC) que marcou o fim de um longo período climático mais úmido e quente, 9.000 a 5.000 anos atrás, chamado Holoceno climático ótimo.

3) Antigo Período Dinástico

O período Dinástico inicia cerca de 2900 AC e inclui figuras lendárias como Enmerkar e Gilgamesh, que supõe-se tenham reinado imediatamente antes do início do registro histórico cerca de 2.700 AC, quando a escrita silábica decifrada iniciava o seu desenvolvimento a partir dos antigos pictogramas. O centro de cultura sumeriano permaneceu ao sul da Mesopotâmia ainda que governantes logo tenham começado a se expandir para áreas vizinhas e grupos semitas vizinhos tenham adotado muito da sua cultura por vontade própria.
O mais antigo rei dinástico da lista de reis sumerianos, cujo nome é conhecido de qualquer outra fonte lendária é Etana, 13º rei da primeira Dinastia de Kish (século XXVI AC), cujo nome também é mencionado no “Épico de Gilgamesh” – o que conduz à sugestão de que o próprio Gilgamesh tenha sido um histórico rei de Uruk, que teria vivido entre 2800 e 2500 AC, sendo o seu principal personagem. Como o “Épico de Gilgamesh” mostra, este período foi associado a uma violência crescente. Cidades foram muradas e a violência cresceu de forma que cidades desprotegidas no sul da Mesopotâmia despareceram. A construção das muralhas de Uruk, por exemplo, é creditada a Gilgamesh.
A dinastia de Lagash (2500 a 2270 AC), embora omitida da lista dos reis, é bem atestada por vários documentos importantes e muitos achados arqueológicos. Ainda que com pouca duração, um dos primeiros impérios conhecidos da história, foi o de Eannatum de Lagash, que anexou praticamente toda a Suméria, incluindo Kish, Uruk, Ur e Larsa, além de reduzir a tributo, a cidade-estado de Umma, sua arquirrival. Além disso, esse reino estendeu-se a partes de Elam e ao longo do Golfo Pérsico. Parece ter usado o terror como assunto de política – sua Estela dos Abutres mostra o violento tratamento dado aos inimigos. Mais tarde, Lugal-Zage-Si, o sacerdote-rei de Umma, sobrepujou a primazia da dinastia Lagash na área, conquistando Uruk que transformou em sua capital e realizando um império que se estendia do Golfo Pérsico ao Mediterrâneo. Ele foi o último rei sumeriano étnico antes da chegada do rei semita Sargão de Akkad.

4) Império Akkadiano (2334 – 2147 AC)

A linguagem semita akkadiana é atestada, inicialmente, pelos nomes próprios dos reis de Kish (cerca de 2800 AC), preservados nas listas dos reis posteriores. Há textos escritos inteiramente em akkadiano antigo, datando de 2500 AC. O uso do akkadiano antigo teve o seu pico durante o governo de Sargão, o Grande (2334–2279 AC), mas, desde então, a maioria dos tabletes administrativos continuou a ser escrita em sumério, a linguagem usada pelos escribas. Gelb e Westenholz diferenciam três estágios do antigo akkadiano: o da era pré-Sargônica, o do Império Akkadiano e o da Renascença Nova Sumeriana que o seguiu. O akkadiano e o sumeriano coexistiram como línguas vernáculas por mil anos, mas em torno de 1800 AC, o sumeriano tornava-se uma língua literária familiar principalmente para estudiosos e escribas. Thorkild Jacobsen ponderou ter havido uma pequena interrupção na continuidade histórica entre os períodos pré e pós Sargão e que muita ênfase foi colocada na percepção de um conflito “semita contra sumério”. Contudo, é certo que o akkadiano foi brevemente imposto em partes vizinhas do Elam, previamente conquistadas por Sargão.

5) Período Gutiano (2147–2114 AC) – 2ª Dinastia Lagash (2157–2110 AC)

Após a queda do Império Akkadiano para os gutianos, outro governador nativo da Suméria, Gudea de Lagash, ascendeu à superioridade local e prosseguiu nas práticas de pretensão divina dos reis sargônidas. Como na dinastia Lagash anterior, Gudea e seus descendentes também promoveram o desenvolvimento artístico, legando um grande número de artefatos arqueológicos.

6) Renascimento Sumeriano (2111–2004 AC)

A 3ª Dinastia de Ur, sob Ur-Nammu e Shlgi, cujo poder estendeu-se até o norte da Mesopotâmia, foi a última grande “Renascença Sumeriana”, embora a região já se estivesse tornando mais semita do que suméria, com a ascensão ao poder dos semitas falando akkadiano e o influxo de ondas dos semitas Martu (Amoritas) que encontraram vários poderes locais competindo, incluindo Isin, Larsa e Babilônia. A última acabou por dominar o sul da Mesopotâmia como o Império Babilônico, da mesma forma como o Império Assírio fez no norte. A língua sumeriana continuou como língua sacerdotal ensinada nas escolas na Babilônia e Assíria.

7) Declínio

Esse período coincide com um importante deslocamento da população do sul para o norte da Mesopotâmia. Ecologicamente, a produtividade agrícola das terras sumérias se comprometia como resultado do aumento da salinidade, há tempos reconhecida como um importante problema. Solos irrigados pobremente drenados, em clima árido com altos índices de evaporação, conduz ao armazenamento de sais dissolvidos no solo, acabando por reduzir severamente a produção agrícola. Durante as fases Akkadiana e Ur III, houve uma mudança do cultivo do trigo para a cevada, mais tolerante ao sal, mas foi insuficiente para evitar o declínio de 3/5 da população, de 2100 a 1700 AC. Tal fato enfraqueceu o balanço de poder dentro da região, diminuindo as áreas em que se falava o sumério e reforçando as áreas onde o akkadiano era preponderante. Doravante, o sumério permaneceria somente uma língua literária e litúrgica.
Após uma invasão e saque elamita, durante o domínio de Ibbi-Sin (cerca de 1940 AC), a Suméria caiu sob o domínio Amorita (considerado como a introdução à Média Idade do Bronze). Os estados independentes amoritas dos séculos XX a XVIII são sumarizados como “Dinastia de Isin” na lista dos reis da Suméria, terminando com a ascensão da Babilônia sob Hammurabi, cerca de 1750 AC. 

[1] Os amoritas foram um antigo povo de língua semita da antiga Síria, que também ocupou uma grande parte do sul da Mesopotâmia, do século XXI ao final do século XVII AC, onde estabeleceu várias cidades-estados proeminentes, notadamente Babilônia, promovida de uma pequena cidade administrativa a um estado independente e cidade principal. O termo amurru, em textos sumérios e akkadianos, refere-se a eles e à sua principal deidade.
[2] Na mitologia suméria, um “me” é um dos decretos dos fundamentos dos deuses, para aquelas intituições sociais, práticas religiosas, tecnologias, procedimentos, costumes e condições humanas que fazem a civilização possível, tal como os sumérios entendiam. Eles são fundamentais ao entendimento sumério das relações entre a humanidade e os deuses.

Continua na Parte 6

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: MESOPOTÂMIA (PARTE 04)

IV.5 – CULTURA E ARTE



A mesopotâmia antiga tinha cerimônias todos os meses, em que os temas dos rituais e festivais eram determinados por, ao menos, seis importantes fatores:



1. A fase lunar (o quarto crescente significava abundância e crescimento, ao passo que o quarto minguante era associado com o declínio e festivais do inferno);
2. A fase do ciclo agrícola anual;
3. Equinócios[1] e solstícios[2];
4. A mitologia local e seus patronos;
5. Os sucessos do monarca reinante;
6. Comemoração de eventos históricos específicos (fundações, vitórias militares, feriados do templo etc...

Algumas das músicas eram escritas para os deuses, mas muitas eram feitas para descrever eventos importantes e embora fossem feitas para a diversão dos reis, eram também gozadas pelo povo, que gostava de cantar e dançar em suas casas ou nos mercados, transmitindo-as para seus filhos, por muitas gerações, como tradição oral até que a escrita se universalizasse. Funcionaram, assim, como meio de transmissão de importantes informações sobre eventos históricos, através de séculos.
Oud: frente e verso
O oud (precursor do alaúde europeu e da viola) foi um pequeno instrumento de cordas usado pelos mesopotâmios e seu registro pictórico mais antigo data do período Uruk na Mesopotâmia do sul, há mais de 5.000 anos atrás. Encontra-se num selo cilíndrico mantido no Museu Britânico e a imagem mostra uma mulher abaixada, num barco, tocando o instrumento. Ele é mencionado centenas de vezes na história mesopotâmica e depois no antigo Egito, da 18ª dinastia em diante, em variedades de pescoço curto e longo.
A caça era popular entre os reis assírios. Box e luta-livre eram frequentes na arte e uma forma de polo era provavelmente popular, com os homens sentando nos ombros de outros homens ao invés de usarem cavalos. Praticavam também majore, um esporte similar ao rúgbi, mas jogado com uma bola feita de madeira. Jogavam também um jogo de tabuleiro similar ao gamão, agora conhecido como “Jogo Real de Ur”.
A Mesopotâmia, como indicado por sucessivos códigos de leis, (Urukagina, Lipit Ishtar e Hamurabi) através de sua história, tornou-se cada vez mais uma sociedade patriarcal, com os homens muito mais poderosos do que as mulheres. Estudiosos têm sugerido que a sociedade mesopotâmica primitiva era governada por um “conselho de anciãos”, em que homens e mulheres eram igualmente representados, com o progressivo status crescente dos homens em detrimento das mulheres. A frequência à escola era mais um privilégio dos filhos dos reis, ricos e profissionais, tais como escribas, físicos e administradores dos templos. A maioria dos meninos aprendia o ofício de seus pais ou eram iniciados fora em outro ofício. As meninas tinha que ficar em casa com suas mães para aprender a manutenção da casa e cozinha, bem como cuidar das crianças menores. Algumas crianças ajudariam na moagem dos grãos ou limpeza de pássaros. Inusitado, para a época da história, as mulheres na Mesopotâmia tinham direitos: podiam possuir propriedades e, se tivessem uma boa razão, conseguir o divórcio.
Centenas de túmulos têm sido escavados em partes da Mesopotâmia, revelando informação sobre os seus hábitos de sepultamento. Na cidade de Ur, a maioria das pessoas era enterrada em túmulos da família, sob suas casas, sempre com algumas posses e algumas foram encontradas embrulhadas em esteiras e tapetes. Crianças eram colocadas em grandes jarros que era postos nas capelas das famílias. Outros restos mortais foram encontrados em cemitérios comuns da cidade, 17 deles contendo objetos muito preciosos; supõe-se que fossem túmulos reais. Ricos de vários períodos procuraram enterro em Bahrein, identificada com a Dilmun sumeriana.
A arte da Mesopotâmia rivalizou com a do antigo Egito, como a maior, mais sofisticada e elaborada da Eurásia, do quarto milênio AC até a conquista da região, no século VI AC, pelo Império Persa Aquemênida. A ênfase principal localizou-se sobre várias esculturas em pedra e argila, felizmente muito duráveis; pouca pintura sobreviveu, sugerindo que a pintura era usada, principalmente, para esquemas decorativos geométricos e baseados em plantas, embora muitas esculturas fossem também pintadas.
O Vaso Warka

A Leoa Guennol
O Período Protoliterato viu a produção de obras sofisticadas, como os selos cilíndricos e o “Vaso Warka”, um vaso de alabastro esculpido, encontrado no complexo do templo da deusa Inanna, nas ruínas de Uruk, datado de cerca de 3.200–3.000 anos AC. A “Leoa Guennol” é uma pequena figura de calcário de Elam, parte homem, parte leão, de cerca de 3.000-2.800 AC. Pouco além, há uma grande quantidade de figuras de sacerdotes e adoradores com grandes olhos, a maior parte em alabastro e até 30 cm de altura, usadas como imagens de culto da deidade, mas pouco desses sobreviveram. Esculturas do período sumério e akkadiano, geralmente, tinham grandes olhos fixos e longas barbas nos homens. Muitas obras de arte também foram encontradas no cemitério real de Ur (cerca de 2.650 AC), incluindo duas figuras de um “Carneiro na Moita”, o “Touro de Cobre” e uma cabeça de touro em uma das “Liras de Ur”.

"Carneiro na Moita"
A partir dos muitos períodos subsequentes antes da ascendência do Império Mesopotâmio Novo Assírio a arte sobreviveu sob diferentes formas: selos cilíndricos, esculturas relativamente pequenas e relevos de vários tamanhos, incluindo placas de cerâmica barata do lar, alguns religiosos e outros não. O Relevo Burney é uma placa de terracota inusualmente elaborada e relativamente grande (50 x 38 cm), de uma deusa de asas com pés de ave de rapina e criados corujas e leões, do século XVIII ou XIX AC. Marcos de pedra, altares de oferendas ou comemorativos de vitórias, mostrando festas, foram também encontrados em templos, os quais, diferentemente de outros oficiais, não trazem inscrições que possam explicar do que se trata; o Marco dos Abutres é um exemplo antigo com inscrição, e o Obelisco Negro de Shalmaneser III, assírio, um grande e sólido mais novo.
O estudo da arquitetura da antiga Mesopotâmia é baseado na evidência arqueológica disponível, representação ilustrada de edifícios e textos sobre prática de construção. A literatura normalmente se concentra em templos, palácios, muralhas, portões e outros prédios monumentais, mas ocasionalmente pode-se também encontrar obras em arquitetura residencial. Observações arqueológicas superficiais também permitiram o estudo da forma urbana em cidades da Mesopotâmia inicial.
O Relevo Burney

O "Marco dos Abutres"
O Material dominante é o tijolo, cujo material encontrava-se localmente livre, ao passo que a pedra de construção tinha que ser trazida de longas distâncias, para a maioria das cidades. Os Zigurats, estruturas maciças em forma de pirâmides em degraus, com níveis progressivamente reduzidos, constituíam a forma predominante, e as cidades possuíam imensos portões, dos quais o mais famoso é o Portão Ishtar, da Nova Babilônia, decorado com bestas em tijolo colorido, atualmente no Museu Pergamon, em Berlim.
Zigurat da bíblica Ur de Abrahão
As mais notáveis ruínas arquitetônicas da Mesopotâmia antiga são os templos em Uruk, do quarto milênio AC, templos e palácios do período Dinástico Antigo, no vale do Rio Diyala, como o Khafajah e o Tell Asmar, as ruínas da Terceira Dinastia de Ur, em Nippur (Santuário de Enlil) e Ur (Santuário de Nanna, deus da Lua), as ruínas da Média Idade do Bronze nos sítios da Síria e Turquia (Ebla, Mari, Alalakh, Aleppo e Kultepe, os palácios do final da Era do Bronze, em Bogazkoy, Ugarit, Ashur e Nuzi, palácios e templos da idade do ferro em sítios assírios, babilônios, urartianos e novo hititas. As casas mais conhecidas vêm das ruínas da antiga Babilônia, em Nippur e Ur. Entre as fontes textuais sobre construção de edifícios e rituais associados, são notáveis os cilindros de Gudea, do final do terceiro milênio e as reais inscrições assírias e babilônias da Idade do Ferro.

IV.6 - CIÊNCIA E TECNOLOGIA

A matemática e a ciência mesopotâmica eram baseadas num sistema numeral sexagesimal (de base 60). Esta é a fonte da hora de 60 minutos, do minuto de 60 segundos e do círculo de 360 graus, também com seus submúltiplos minutos e segundos. É também dos babilônios o calendário baseado numa semana de sete dias de 24 horas, grandezas muito utilizadas na cartografia antiga. Os babilônios também tinham teoremas sobre como medir áreas e volumes de figuras e sólidos. Mediam a circunferência de um círculo como três vezes o seu diâmetro e a sua área como (1/12) do quadrado da circunferência. Essas formas, se trabalhadas, nos levarão, respectivamente, às nossas fórmulas conhecidas de (2*π*R) e (π*R2), desde que fixemos o valor de π como 3 no lugar do hoje conhecido valor de 3,14159 ... Aliás, uma recente descoberta revelou uma placa que usava para π o valor de 3,125, mais próximo do seu real valor do que 3. Os babilônios foram também conhecidos pela “milha babilônica”, uma medida de distância valendo 7 milhas modernas (cerca de 11,27 km).
Desde o tempo dos sumérios sacerdotes dos templos haviam tentado associar eventos correntes com certas posições dos planetas e estrelas. Tais tentativas prosseguiram ao tempo dos assírios quando listas de Limmus[3] foram feitas, com uma associação anual de eventos com posições planetárias que, sobreviventes até o dia de hoje, permitem precisas associações relativas e absolutas para o estabelecimento da história da Mesopotâmia. Os astrônomos da Babilônia eram adeptos da matemática e podiam prever eclipses e solstícios, imaginando que tudo possuía algum objetivo na astronomia, a maioria relacionada à religião e presságios. Os mesopotâmios desenvolveram um calendário de 12 meses baseado nos ciclos da lua, dividindo o ano em duas estações: verão e inverno. É dessa época a origem da astronomia e da astrologia.
Durante os séculos VIII e VII AC, astrônomos babilônios desenvolveram uma nova abordagem à astronomia. Começaram estudando a filosofia que tratava com a natureza do início do Universo, começando a empregar uma lógica interna nos seus sistemas planetários de previsão. Foi uma importante contribuição à astronomia e à filosofia da ciência; alguns estudiosos referiram-se a essa nova abordagem, que foi posteriormente adotada e mais desenvolvida pela astronomia grega e helenística, como a primeira revolução científica.
À época dos selêucidas[4] e partas[5], os relatórios astronômicos eram totalmente científicos sendo incerta a época em que seu avançado conhecimento se desenvolveu. A o desenvolvimento babilônico de métodos de previsão dos movimentos dos planetas é considerado um evento fundamental da história da astronomia.
O único astrônomo grego-babilônio que apoiou o modelo heliocêntrico de Aristarchus de Samos, em que a terra girava em torno do seu eixo, além de girar em volta do Sol, foi Seleucus de Selêucia (cerca de 190 AC), pelos escritos de Plutarco, biógrafo, historiador, e ensaísta grego (mais tarde adotou a nacionalidade romana) que viveu entre 46 e 120 DC. A astronomia babilônica serviu como base da astronomia da Grécia, Índia, Bizâncio, Síria, Islã medieval, Ásia central e Europa ocidental.
Os textos babilônicos mais antigos sobre medicina datam do período Antigo Babilônico, na primeira metade do segundo milênio AC, onde aparece o mais extenso deles, o Manual de Diagnóstico, escrito pelo principal estudioso, Esagil-kin-apli de Borsippa, durante o reinado do rei Adad-apla-iddina (1069 a 1046 AC). Junto com a medicina egípcia contemporânea, os babilônios introduziram os conceitos de diagnose, prognóstico, exame físico e receitas. O Manual de Diagnóstico introduziu os métodos de terapia e etiologia, bem como o uso do empirismo, lógica e racionalidade no diagnóstico, prognóstico e terapia. O texto contém uma lista de sintomas médicos e observações empíricas muitas vezes detalhadas, junto com regras lógicas usadas ao combinar sintomas observados no corpo do paciente com seu diagnóstico e prognóstico.
Os sintomas e doenças de um paciente eram tratados por meios terapêuticos como bandagens, cremes e pílulas. Se um paciente não pudesse ser curado fisicamente, os médicos babilônios confiavam no exorcismo para purificar o paciente de quaisquer maldições. O Manual de Diagnóstico era baseado num conjunto lógico de axiomas e hipóteses que incluíam a visão moderna de que, através do exame e da inspeção dos sintomas de um paciente, é possível determinar sua doença, origem, futuro desenvolvimento e as chances de recuperação do paciente. Esagil-kinapli descobriu uma variedade de indisposições e doenças, descrevendo seus sintomas no seu Manual; tais incluíam sintomas para variedades de epilepsia e males relacionados, junto com seus diagnósticos e prognósticos.
O povo mesopotâmio inventou muitas tecnologias, incluindo trabalhos com metal e cobre, confecção de vidro e lamparina, tecelagem, controle de enchentes, armazenamento de água e irrigação. Foi também um dos primeiros povos da Idade do Bronze no mundo. Desenvolveram do cobre, bronze e ouro ao ferro. Os palácios eram decorados com centenas de quilos desses caros metais. Cobre, bronze e ferro foram usados foram também usados para armaduras e armas como espadas, adagas, lanças e maças.
O Parafuso de Arquimedes
De acordo com uma hipótese recente, o “Parafuso de Arquimedes[6]” pode ter sido usado por Sennacherib, Rei da Assíria, para criar os sistemas hidráulicos dos Jardins Suspensos da Babilônia e Nínive, no século VII AC, embora a tendência atual seja admiti-lo como uma invenção grega mais moderna. Posteriormente, durante os períodos Parta ou Sassânida, a “Bateria de Bagdá” que pode ter sido a primeira bateria do mundo, foi criada na Mesopotâmia. 





[1] Na ocorrência dos dois equinócios anuais, a Terra, em sua órbita elíptica em torno do Sol, encontra-se à mesma e menor distância dele; são as épocas do ano em que dia e noite têm, teoricamente, a mesma duração.
[2] O solstício é o evento astronômico que ocorre duas vezes por ano, quando a Terra encontra-se à sua maior ou menor distância do Sol; o solstício de verão ocorre, no hemisfério sul, em 22 ou 23 de dezembro (solstício de inverno no hemisfério norte); o solstício de inverno ocorre, no hemisfério sul em 20 ou 21 de junho (no hemisfério norte, solstício de verão). Os solstício de verão e de inverno correspondem, respectivamente, aos dias mais longo e mais curto do ano.
[3] Limmu era um epônimo assírio. Ao início do reinado de uma rei assírio, o limmu, um servidor real contratado anualmente, presidiria o festival de Ano Novo na capital. Embora escolhido por sorteio, provavelmente haveria um pequeno grupo, tais como os homens das famílias mais proeminentes ou talvez membros co conselho da cidade. Os assírios usavam o nome do limmu daquele ano para designer o ano em documentos oficiais. Listas de limmus foram encontradas para todos os anos entre 892 e 648 AC Durante o Antigo Período Assírio, o próprio rei nunca foi um limmu, mas no Médio e Novo Assírio períodos, o rei poderia tomar esse posto.
[4] O Império Selêucida foi um estado helenístico (grego antigo) governado pela dinastia fundada por Seleucus I Nicator, resultado da fratura do império criado por Alexandre o Grande. Seleucus expandiu seus domínios até incluir a Anatólia Central, Persia, o Levante, Mesopotâmia e Kuwait
[5] Partia (em latim Parthia) é o nome dado historicamente a uma região do nordeste do atual Irã, conhecido por ter sido a base político-cultural da dinastia arsácida, soberanos do Império Parta.
[6] Também chamado de bomba de parafuso, o “Parafuso de Arquimedes” é uma máquina historicamente usada para transferir água de um ponto inferior de água, para valas de irrigação, por exemplo. A máquina é comumente atribuída a Arquimedes, na ocasião de sua visita ao Egito, mas tal tradição pode apenas refletir que ele era desconhecido aos gregos antes dos tempos helenísticos e que foi introduzido na sua época por engenheiros desconhecidos, pois alguns escritores têm sugerido que o dispositivo possa ter sido usado na Assíria 350 anos antes. O aparelho consiste de uma superfície helicoidal em torno de uma haste cilíndrica central, dentro de um tubo oco, girado por um moinho de vento ou trabalho manual. À medida que a haste gira, a extremidade do fundo eleva um volume de água até finalmente derramá-la fora do topo do tubo assim alimentando os sistemas de irrigação.

Segue com o "IMPÉRIO DA SUMÉRIA", na Parte 5